Jornalista, prima de Sérgio Dias e Arnaldo Baptista, dos Mutantes. Uma juventude com o primeiro casamento aos 14 anos, uma filha e a separação aos 17. Esta é a história da Monja Coen, que mudou sua vida ao deparar-se com a religião budista. Foram cerca de oito anos em um mosteiro no Japão, onde sofreu com a dificuldade de não saber falar a língua oficial do país.

Coen, uma das maiores referências do Budismo no Brasil, esteve em Londrina para participar da 8 Semana da Paz e falou à FOLHA sobre como é possível cultivar uma cultura de paz em meio ao estresse e os problemas do mundo moderno.

Quando e por que a senhora se tornou monja?
Eu me tornei monja em 1983. Fui repórter, e repórter entrevista gente de todas as áreas, de todos os níveis sociais e dói muito vermos a pobreza de muitos e o excesso de outros. Uma das matérias que eu fiz foi sobre sociedades alternativas e uma delas na Califórnia era um grupo zen budista. Eles já não usavam agrotóxicos, faziam reciclagem. Achei isso interessante. Antes disso, na época da Guerra do Vietnã, aparecia na capa das revistas aqueles monges que se queimavam em praça pública, como um protesto pela guerra. E isso havia me impressionado muito. Como alguém pode ficar parado pegando fogo? Nós vemos pessoas que fazem isso e saem correndo. Eles não, ficavam sentados em meditação e queimando vivos. Isso me impressionou pela capacidade de controle.

A senhora sente falta de alguma coisa da vida que tinha antes de se tornar monja?
De vez em quando eu olho para umas fotografias antigas e digo ''que saudades dela'' porque esta que eu era com 30 anos não é mais esta que sou agora. Todos os sonhos, esperanças, as perspectivas do mundo mudam com a idade. Saudades de alguma coisa específica que eu fazia não tenho muito não. A minha vida é muito preenchida pelas minhas atividades de agora, eu tenho muitos alunos, eu tenho que treinar muitas pessoas. É instigante, é difícil.

O que é ser zen? É ficar calmo o tempo todo, não se alterar?
Não. E se é raiva que vem, você vivencia, experimenta, mas não a joga de qualquer maneira no mundo. A diferença é que nos tornamos um pouquinho filtro das nossas emoções. É perceber que somos humanos, que temos inúmeras emoções e elas fazem parte da nossa vida mas não somos controladas por elas.

Que conselho a senhora daria para quem está em uma situação extrema de estresse, como em um congestionamento de trânsito?
Primeiro: tem coisas muito interessantes para fazer, como a respiração consciente. Perceba como está sua respiração, sua musculatura, seu batimento cardíaco. Faça respiração mais profunda e mais lenta. Segundo: nós temos uma lógica de entender que, se estamos em cidades grandes, é natural que isso ocorra. Terceiro: como é que eu aprecio esse caminho, esse momento da minha vida? Porque eu estou viva nesse instante, eu não estou viva quando eu chego no meu destino. Ir daqui até lá já é minha experiência de vida.

Como cultivar a paz nos dias de hoje?
Eu acho que é uma época maravilhosa para cultivar a paz, porque ela nos provoca isso. Há tanta violência, tanta agressão, as pessoas estão tão rudes umas com as outras que são maravilhosos treinadores da nossa paz. Estão nos mostrando nosso ponto fraco e esse é o ponto que temos que trabalhar: por que esse gesto, esse olhar me incomoda tanto, se tudo é passageiro? E quando percebemos, saímos da garra do outro para ficar responsável por nós mesmos e isso é o caminho da paz. Porque se alguém vem e me irrita e eu fico irritado, o outro é que está em controlando.

Como ensinar isso para crianças?
Através de jogos: ganhamos juntos ou perdemos todos. Não tem isso, eu ganho, você perde. Tem novos jogos agora que são interessantes pois ensinam parcerias. Outra coisa é o exemplo dos pais. Preste atenção: o que você fala é alguma coisa que você pode falar na frente das crianças? Nunca fale um assunto que você não possa falar na frente das crianças. E fale de maneira que você acha educativa e boa, porque você se auto educa. Nós ensinamos coisas para a criança no jardim da infância, como dividir o brinquedo, chamar o colega para brincar, mas não fazemos isso. Então eles têm dois exemplos e ficam divididos, entre o que nós falamos e o que fazemos.