Animal silvestre não é pet: um alerta necessário
Animais silvestres desempenham papéis ecológicos relevantes em seus habitats
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 18 de outubro de 2024
Animais silvestres desempenham papéis ecológicos relevantes em seus habitats
Ana Maria Ventura, Ana Paula Vidotto Magnoni, Gustavo Góes e Renan Oliveira
A recente publicação da Folha de Londrina (Social - Oswaldo Militão, 16/10/2024) sobre a possibilidade de araras serem criadas como bichos de estimação levanta uma preocupação séria para todos que trabalham com a conservação da biodiversidade. Embora a matéria aborde os aspectos legais da criação de araras em cativeiro, a mensagem transmitida ao público é a de que é aceitável — e até desejável — ter um animal silvestre em casa. Essa visão é equivocada e perigosa para a conservação das espécies.
No Brasil, dados da Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres (Renctas) apontam que 38 milhões de animais são traficados por ano. A criação de animais silvestres como pets tende a estimular o tráfico ilegal. O simples fato de apresentar uma arara em um estúdio de TV, fora de seu habitat natural e de um recinto de cativeiro adequado, passa a ideia de que a domesticação desses animais é comum e aceitável. Isso ignora boas práticas e os desafios éticos e ambientais envolvidos.
Animais silvestres não devem morar em casas humanas, por motivos éticos e comportamentais. Animais domesticados, como cães e gatos, modificaram seu comportamento para a dependência dos humanos. Espécies não domesticadas, como os animais silvestres, não passaram por esse processo e sofrem com a privação de seus comportamentos naturais.
Animais silvestres desempenham papéis ecológicos relevantes em seus habitats. As araras, por exemplo, são fundamentais para a dispersão de sementes, contribuindo para a regeneração de florestas. Retirá-las do seu ambiente priva o ecossistema de suas funções naturais e pode levar a desequilíbrios ecológicos significativos.
Criar animais silvestres em cativeiro não é simples. Esses animais têm necessidades comportamentais, sociais e de dieta complexas, difíceis de serem atendidas fora de seu habitat. A criação inadequada resulta em sofrimento, problemas de saúde e comportamento.
A mensagem que deve ser enfatizada é que a possibilidade legal de manter um animal silvestre em cativeiro deve ser uma exceção, não a regra. Essa prática deve ser restrita a situações nas quais o animal não pode ser reintroduzido na natureza.
Em Londrina, temos o Centro de Apoio à Fauna Silvestre (CAFS) da UniFil, uma política pública de sucesso que oferece atendimento a animais silvestres. No entanto, um grande problema enfrentado por esse e outros espaços é o elevado número de animais atendidos. Essa realidade evidencia a necessidade urgente de políticas mais eficazes para combater a captura e o tráfico e a importância de priorizar a conservação dos animais em seus habitats naturais.
É fundamental que a mídia, como formadora de opinião, adote uma postura responsável ao tratar de temas relacionados à fauna silvestre. Em vez de promover a ideia de animais silvestres como pets, deve-se ressaltar a importância de conservar esses animais em seus habitats e apoiar iniciativas de proteção e reabilitação.
Portanto, reforçamos: o lugar de animal silvestre é na natureza. A proteção e conservação das espécies devem ser prioridade, e não podemos permitir que mensagens inadequadas comprometam os esforços para preservar nossa biodiversidade. É hora de repensar a forma como nos comunicamos sobre a fauna silvestre e assumir um compromisso firme com a proteção do nosso patrimônio natural. Não podemos confundir o desejo de proteção com o egoísmo de submeter animais silvestres a condições de vida feitas para nós, humanos. Vamos valorizar e apreciar os animais em seu ambiente natural.
Ana Maria Ventura, bibliotecária; Ana Paula Vidotto Magnoni, bióloga, professora da UEL e coordenadora do projeto "Que Bicho Mora Aqui?"; Gustavo Góes, gestor ambiental e associado da MAE (Meio Ambiente Equilibrado); Renan Oliveira, biólogo, ornitólogo e associado da MAE.
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