Água: riqueza natural de uma nação - Feichas Martins
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 07 de janeiro de 2000
Água: riqueza natural de uma nação
Feichas Martins
Um amigo que residiu nos Estados Unidos queixou-se do descaso brasileiro em relação aos seus recursos hídricos, lembrando que a água é a maior riqueza natural de uma nação e será, doravante, fato de cobiça da Amazônia e de guerras entre os países necessitados e os detentores de grandes mananciais.
Há 27 anos desabafou morando nos Estados Unidos, eu ouvia perguntas insistentes dos norte-americanos sobre o que o Brasil faria com os seus mananciais de água doce. Hoje, entendo que os países desenvolvidos, com visão de futuro e valorizando o planejamento estratégico, estão muito à frente do Brasil, que ainda engatinha em termos de política ambiental e gerenciamento de recursos hídricos.
Ouvi, em seguida, o engenheiro agrônomo Antonio de Almeida Nobre Júnior, consultor do Incra, defender, durante conferência realizada no Instituto Político-Estratégico Brasileiro, em Brasília, um melhor gerenciamento para o uso dos recursos hídricos brasileiros, alertando que a crise de água será a marca do século XXI, e não apenas uma questão de determinismo físico-climático.
O transporte de água é o mais caro de todos, o que justifica uma gestão de alto nível para emprego desse recurso vital, observou Nobre Júnior, para quem a moderna gestão dos recursos hídricos (águas atmosféricas, superficiais e subterrâneas) impõe a prática de princípios como: adoção da bacia hidrográfica como unidade físico-territorial de planejamento; reconhecimento de água como bem natural limitado e de valor econômico; e gestão descentralizada e participativa.
Nos últimos 50 anos, prosseguiu Nobre Júnior, a utilização da água em nível mundial quadruplicou e as fontes de água doce estão se esgotando. Com as alterações climáticas e o aumento da infiltração de água salgada nas fontes de água subterrânea, o problema da escassez tende a se agravar. Cerca de 22 países têm menos de 1.000 metros cúbicos de água per capita, nível indicador da escassez desse líquido. Outros 18 países têm menos de 2.000.
O Brasil dispõe de 38.185 metros cúbicos/habitante/ano, um dos maiores potenciais de água doce superficial e subterrânea, um capital ecológico inestimável e fator competitivo fundamental do desenvolvimento socioeconômico sustentado, destacando-se a bacia amazônica com um deflúvio anual dos rios da ordem de 73%.
O desequilíbrio brasileiro está na seguinte relação de distribuição da água: 80% das descargas dos nossos rios ocorrem nas regiões habitadas por 5% da população, enquanto os 25% restantes das descargas abastecem 95% da população, o que gera má distribuição de recursos hídricos tanto no espaço quanto no tempo.
Diante desse dado, Nobre Júnior justifica a transposição do Rio São Francisco como instrumento de redução do nível de pobreza da maioria da população do nordeste e de efetivo enfrentamento da seca.
Diante de tais problemas, cabe a indagação: até quando o Brasil continuará sem uma visão de futuro e um planejamento efetivo para esse problema dos recursos hídricos? Até quando continuará lançando 90% dos esgotos domésticos e 70% dos efluentes industriais sem tratamento nos rios, conforme estarrecedora informação prestada pelo engenheiro Nobre Júnior?
- FEICHAS MARTINS é jornalista e cientista político