Absurdo (em nome de Jesus)
Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará (João - 8,32)
José Elias Aiex Neto
Há muito tempo vinha recebendo convites para ir a um jantar da Adhonep (Associação dos Homens de Negócio do Evangelho Pleno) e nunca encontrava oportunidade para tal. Há cerca de 2 semanas, atendendo a um gentil chamamento de um conhecido, adquiri um convite para ir a um jantar daquela entidade, em Foz do Iguaçu.
Confesso que sempre imaginei que a Adhonep era uma entidade formada por homens e mulheres com atividade empresarial e que cultuam o Evangelho. Nesses jantares ouviria depoimentos de como essas pessoas conciliam tais atividades com os ensinamentos bíblicos.
No dia em que fui ao jantar, no entanto, o preletor, que veio de São Gonçalo (RJ) para falar aos participantes do ágape, deixou-me atônito. Iniciou sua falação dizendo que foi um homem desonesto, que roubou, que corrompeu políticos, que passou outras pessoas para trás, que mentiu etc. Em função de um problema que teve com a Justiça, foi obrigado a pedir ajuda de Deus, graças à sua esposa que era evangélica.
Por uma circunstância do destino, tal ajuda, que seria para que ele não pagasse uma dívida na Justiça, acabou aparecendo. Em função de ter sido sequestrado, em outra ocasião, recorreu novamente a Deus e conseguiu sair ileso do sequestro.
A partir de então passou a usar o nome de Jesus a todo o momento, como fez naquele jantar.
Dedicou-se a frequentar uma penitenciária e lá conseguiu o prodígio de ajudar a curar um homossexual aidético da AIDS e do homossexualismo, coisa que a ciência mundial não conseguiu até hoje. Ao final de sua palestra, logicamente que havia um livro e um vídeo seus à venda.
Confesso que saí daquele jantar assustado, pois não imaginava que pudesse estar acontecendo coisas como aquela em nosso país. Minha estupefação e até medo é pelo seguinte:
1 - Existem leis que regulam o comportamento dos homens dentro de uma sociedade. Quando o pobre rouba uma galinha ele vai preso. Quando alguém passa outrem para trás ele é processado e tem que reparar o seu erro. O preletor da palestra da ADHONEP confessou a cerca de 100 pessoas que estavam naquele jantar que roubou e corrompeu e não cumpriu um dia sequer de pena.
2 - Todos nós queremos que nossos filhos frequentem uma Universidade e aprendam uma profissão baseada na ciência. Nós, médicos, conhecemos as limitações da ciência, porém continuamos a estudar e pesquisar exaustivamente para tentar descobrir a cura para doenças como o câncer e a AIDS. No entanto, um dissimulado, usando o nome de Jesus, tem a coragem de afirmar que curou AIDS, o que lhe daria o Prêmio Nobel de Medicina, se fosse verdade. Assim, temos que parar de gastar tempo, dinheiro, e energia para enviar nossos filhos para a universidade.
3 - Sou cristão desde criança, quando frequentava a escola dominical da Igreja Presbiteriana Independente de Maringá. Aprendi com Jesus Cristo o mandamento: ‘‘amai ao teu próximo como a ti mesmo’’ (Marcos 12,31), e venho, ao longo de minha vida tentando praticá-los ao máximo. No entanto, não falo o nome de Jesus a todo momento, pois obedeço ao mandamento da Lei de Deus, que diz: ‘‘não tomarás seu santo nome em vão’’.
Nunca roubei, corrompi ou fui corrompido. No entanto, vejo pessoas como aquele preletor usar o nome de Jesus para justificar suas fraquezas.
É preciso que a sociedade reflita sobre essas coisas que estão ocorrendo em nosso país. Será que a inversão de valores chegará a um ponto tal que não ligaremos mais para o Poder Judiciário e nem para a Ciência? Será que estamos vivendo a era dos falsos profetas, como diz a Biblia?
Será que se um pobre tivesse roubado galinha para comer também seria perdoado do crime se dissesse para o delegado que encontrou Jesus, ou será que isso só acontece com os ‘‘homens de negócio do evangelho pleno’’?
- JOSÉ ELIAS AIEX NETO é vice-presidente do Centro de Direitos Humanos, titular do Conselho Municipal de Saúde e presidente do Partido Socialista Brasileiro em Foz do Iguaçu.