Em uma república democrática é fundamental, para sua existência sadia, não só a independência entre os poderes constituídos, como também um equilíbrio de forças entre eles.

No Brasil atual este jogo se desequilibrou a tal ponto de que um risco maior que o da nossa insegurança jurídica, paira no ar um risco de ruptura de nossa segurança institucional e, consequentemente, de nossa democracia.

A indicação recente pelo presidente da República de seu próprio advogado e de seu parceiro político de décadas para ministro do STF, além do comportamento de um outro ministro que se assume como investigador relator e julgador, em que em grande parte ele também é vítima no processo, trouxe à tona o questionamento sobre o modelo de indicação de ministros do STF e seus limites constitucionais.

Com a constituição de 1988, já tendo cerca de 2/3 de seus enunciados iniciais vilipendiados, temos hoje uma constituição sem grandes valores e princípios como alicerces, que flutua no Deus dará de um mar de interpretações.

O ex-ministro Aldo Rebelo afirma que há no Brasil 11 constituições, ou seja, cada ministro do STF tem uma interpretação conforme sua ótica ou conveniência, que somadas a possibilidade de decisões monocráticas, criaram um ambiente onde o caos jurídico e institucional no Brasil está instalado. Nosso modelo de indicação de ministros foi importado com base no modelo americano.

Esqueceu-se, porém, que a relação entre os poderes republicanos no Brasil tem uma lógica de funcionamento e contrapesos de poder absolutamente distintos do modelo americano. Os EUA têm um pacto federativo onde são praticamente 50 países independentes, em quase todas as suas ações, lá o governo federal não possui estatais e ministérios que podem ser criados a seu bel prazer, além de fartas emendas parlamentares, que no Brasil são usadas para "convencer" os senadores a aprovar seus indicados, além do mais lá existem dois partidos atuantes que têm posições ideológicas muito claras, sendo que no Brasil temos uma verdadeira prostituição partidária.

Portanto, a sabatina para indicação de ministros do Supremo lá é bem fundamentada em princípios de notório saber e pressupostos de valores e princípios, contidos em uma constituição de cerca de 250 anos.

Já a sabatina feita pelo Senado brasileiro, onde a grande maioria dos senadores pode ser "cooptada" pelo Poder Executivo, pelas benesses oferecidas em empresas públicas, ministérios e outros nichos de poder, fazem desta sabatina um faz de conta, ou seja o indicado pelo presidente é sempre aprovado, mesmo tendo um perfil adverso ao que seria desejável para esta função.

O historiador Marco Antônio Vila em seu livro "a história das constituições brasileiras", escreve que para além do notório saber, não seria saudável que o STF abrigue juízes com passado político, pois na política os embates são muito comuns, e os rancores acabam permanecendo, e conclui "quem garante que este ministro vai julgar os casos políticos com a isenção necessária?"

Só para se ter uma ideia de que a seriedade e idoneidade na aprovação de ministros do STF é "um faz de conta", desde o início da República, em 1889, dos ministros indicados pelo presidente da República para o STF só 5 foram rejeitados, todos entre 1890 e 1894 no governo de Floriano Peixoto.

Portanto, há cerca de 130 anos, nenhum indicado foi rejeitado pelo Senado. Isso talvez possa nos sugerir algo sobre o porquê temos um STF com tanto ativismo político, quase sempre defendendo as causas de seus patrocinadores.

Daí a atual politização da justiça e judicialização da política. Fruto de um Senado no mínimo omisso. Uma grande caminhada começa pelo primeiro passo.

- pelo fim do regime vitalício.

- pela qualificação por concurso público.

- pela indicação em regime de rotatividade entre os poderes.

Claudio Tedeschi, leitor da FOLHA.

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