Coaching é uma das palavras que mais está em moda no mercado profissional do Brasil e do Mundo. A palavra coaching é de origem inglesa, ela define uma atividade de desenvolvimento pessoal na qual o coach (instrutor) possibilita ao seu aluno/comprador (coachee) a evolucionar em algumas áreas da sua vida utilizando-se de diversos conhecimentos, técnicas e ferramentas provenientes dos mais diversos segmentos do saber: psicologia, neurociência, gestão de pessoas, administração, planejamento estratégico, linguagem, programação mental entre outras ramificações.

Hands of an unrecognizable woman in white cardigan praying
Hands of an unrecognizable woman in white cardigan praying | Foto: istock

Essa metodologia busca potencializar o aluno (cliente) – por meio de uma reprogramação mental e comportamental - para que ele consiga por si só evoluir em sua vida pessoal e conquistar grandes resultados seja qual for o contexto: pessoal, afetivo-relacional, social, profissional, financeiro e até mesmo, no nosso caso, o espiritual. Sendo assim, a prática do coaching é o meio pelo qual uma pessoa visualiza os seus pontos individuais (fracos e fortes), aumenta sua autoconfiança, quebra tabus limitantes e por si só atinge as suas metas de forma clara, objetiva e assertiva.

Aparentemente, olhando a sua definição, o coaching parece ser algo bom, ainda mais se aplicado à esfera cristã, que leva o homem ao sucesso e a felicidade por suas próprias capacidades. Sendo assim, qual o sentido de sustentarmos uma tese negativa – sua incompatibilidade - para a fé cristã e um contrassenso a teologia? Em sua Exortação Apostólica, Gaudete et Exsultate (n. 47-48), o papa Francisco alerta do mal histórico que o gnosticismo provocou na humanidade e na própria Igreja, sendo uma corrente filosófica e religiosa à qual exalta indevidamente o conhecimento como determinador da salvação e da santidade de uma pessoa.

Segundo Francisco essa corrente “[...] quer domesticar o mistério, tanto o mistério de Deus e da sua graça como o mistério da vida dos outros” (GE, 40-41). Entretanto, o papa alerta de um novo mal que se levanta na história da Igreja novamente: o gnosticismo hoje deu lugar ao pelagianismo; se o gnosticismo atribuía o poder de salvação à inteligência, o pelagianismo atual procura justificar a salvação e a santificação na própria vontade humana meramente ao esforço pessoal baseado em “regras de produtividade/assertividade”.

É este o erro que se encontra no coaching espiritual: pensar que por meio das nossas próprias forças, técnicas e estratégias se atinge o “nirvana espiritual”. E os testemunhos bíblicos diversamente relatam que não somos justificados apenas pelas nossas obras ou pelos nossos esforços, mas pela graça do Senhor que sempre toma a iniciativa (Rm 9,16). Os discursos dos “spiritual coaches” enfatizam e sustentam erroneamente uma fé com menor dor/insucesso diferentemente daquela fé que os primeiros apóstolos/mártires da fé fizeram a experiência.

Assistimos a perversão da Teologia da Prosperidade que não é a realidade ontológica e nem a realidade da ortopráxis da Igreja realizada por Jesus de Nazaré, o encarnado e o ressuscitado. Perdemos um anúncio autêntico profético da Palavra de Deus, que passa pela via crucis, sem contar os interesses mercadológicos na fé. Para muitos o Evangelho tornou-se indolor.

A espiritualidade cristã não tem como função ser “confortadora”, mas ao contrário, “confrontadora” da realidade de si mesmo e do mundo (At 7,55-60; 12,1-5; 23,12-15). Ter um encontro com Jesus é sentir provocado para uma mudança radical de vida (metanoia), que exige uma resposta desafiadora, como podemos ver por exemplo no relato do jovem rico que não foi capaz de aceitar o convite para seguir Jesus porque isso lhe exigia renúncia e privações (Mt 19,16-22). Com efeito, “[...] não falamos para agradar aos homens, mas, sim, a Deus, que perscruta o nosso coração” (1Ts 24).

Não podemos mais conceber pastores que preguem para agradar/potencializar públicos, para ter assembleias massivas ou até mesmo para galgar os altos escalões hierárquicos eclesiásticos. Portanto, não é possível sustentar teologicamente e biblicamente a existência de coaching espiritual. A fé cristã não é centrada nas próprias potencialidades, mas em Cristo e no Espírito, como diz Santo Inácio de Loyola. A salvação é um dom gratuito da misericórdia de Deus que é dado a todos e não um esquema metodológico/programação mental que não necessita da graça divina.

Diácono Caio Matheus Caldeira da Silva, mestre e doutorando em Teologia Bíblica, PUC-PR/ campus Curitiba

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