Trump vai a Nova York e prepara circo midiático
Ex-presidente viajou para Nova York para ouvir a acusação que o transformará no primeiro ex-presidente dos EUA réu por um caso criminal
PUBLICAÇÃO
segunda-feira, 03 de abril de 2023
Ex-presidente viajou para Nova York para ouvir a acusação que o transformará no primeiro ex-presidente dos EUA réu por um caso criminal
Thiago Amâncio - Folhapress
Washington - Donald Trump embarcou no começo da tarde desta segunda (3) em direção a Nova York para ouvir a acusação que o transformará no primeiro ex-presidente dos EUA réu por um caso criminal.
O republicano deve passar a noite na Trump Tower e se apresentar no começo da tarde de terça (4) ao tribunal, "acredite ou não", escreveu ele em rede social, onde também registrou em letras maiúsculas que o processo se trata de interferência nas eleições do ano que vem, às quais já anunciou sua pré-candidatura.
Só então deve-se saber de quais crimes Trump é acusado no caso que envolve a compra do silêncio da atriz pornô Stormy Daniels durante a eleição de 2016. Ela recebeu US$ 130 mil de advogados do então candidato para não revelar um suposto affair com ele, e os gastos foram lançados como "despesas jurídicas", no que seria uma maquiagem de gastos de campanha, segundo investigações.
Trump terá suas impressões digitais colhidas, e, até aqui, ainda existe um debate sobre se será preciso tirar uma foto oficial como suspeito. Se ela for feita, porém, não deve ser divulgada oficialmente e só viria a público com um vazamento - desde 2019 Nova York deixou de tornar públicas imagens do tipo.
Legalmente, Trump estará detido e não pode deixar o tribunal até que seja liberado. Mas, como o caso não envolve um episódio de violência, a chance de que ele permaneça preso é praticamente nula. Assim, o republicano deve voltar à Flórida assim que a burocracia for concluída.
O ex-presidente pretende usar o indiciamento a seu favor na corrida à Casa Branca, mas até aqui não há sinais claros sobre se o plano será útil. Pesquisa desta segunda da CNN apontou que 60% dos americanos dizem aprovar o indiciamento.
Apesar disso, 76% afirmam que a decisão da Justiça teve algum componente político - sendo que, para 52%, a política ocupou um espaço central. News/Ipsos apontou que 45% dos entrevistados acreditam que Trump deveria ser condenado pelo caso.
O republicano, porém, já vem se gabando de ter virado o caso a seu favor. Na última sexta (31), afirmou que em menos de 24 horas sua campanha conseguiu arrecadar US$ 4 milhões (R$ 20,3 mi) com "perseguição política sem precedentes" da promotoria de Manhattan, sendo 25% das doações de apoiadores que nunca haviam contribuído antes.
Mas o que Trump quer mesmo com a acusação é adiantar as primárias do Partido Republicano e unir o apoio de correligionários em torno de seu nome, até agora a candidatura mais forte da legenda para disputar a Casa Branca no ano que vem.
Pesquisa YouGov de sexta, um dia após o anúncio do indiciamento, mostrou o ex-presidente com 57% das intenções de voto na legenda, bem a frente dos 31% do governador da Flórida, Ron DeSantis, seu principal rival.
Trump conseguiu alvejar DeSantis por seu silêncio inicial em relação ao processo, e o governador da Flórida correu para corrigir a rota ao condenar a acusação assim que ela foi divulgada, na última semana.
No fim de semana, a corrida se alargou com o anúncio do ex-governador do Arkansas Asa Hutchinson de que também vai concorrer. Ex-procurador federal, ele defendeu que Trump deveria se retirar da corrida para se concentrar no processo em Nova York "pelo bem da Presidência" e evitar "espetáculo e distração".
A corrida é menos emocionante no jogo aberto, onde concorrem também a ex-governadora da Carolina do Sul Nikki Haley e o empresário Vivek Ramaswamy, do que nos bastidores, com as candidaturas ainda não anunciadas, como o ex-vice Mike Pence e o ex-secretário de estado Mike Pompeo, além de DeSantis.
Em público, a Casa Branca tem se afastado da discussão, e o presidente Joe Biden não fez nenhum comentário sobre o caso desde que o indiciamento veio à tona, na última quinta-feira (30).
Mas há temores de protestos, convocados por Trump em rede social quando levantou a possibilidade de ser preso, e o governo americano está em contato com autoridades locais monitorando a situação, disse nesta segunda John Kirby, do Conselho de Segurança Nacional.
Ele afirmou que "protestos pacíficos têm muito valor na democracia", mas "não deve haver violência neste ou em qualquer outro processo legal", afirmou. "Estaremos preparados se houver necessidade."
O prefeito de Nova York, o democrata Eric Adams, afirmou que não há ameaças concretas, mas desencorajou manifestantes e citou a deputada ultradireita Marjorie Taylor-Greene, que já anunciou que vai protestar na cidade. Segundo ele, quem cometer atos de violência "será preso e responsabilizado, não importa quem seja".
Se o caso da compra de silêncio da atriz pornô Stormy Daniels é visto como uma coisa menor, outro processo que pode render um indiciamento avança para dar mais dor de cabeça ao ex-presidente.
Reportagem do Washington Post apontou que o Departamento de Justiça e o FBI reuniram evidências de que Trump praticou obstrução de justiça na investigação sobre os documentos secretos que ele manteve de maneira irregular em sua casa na Flórida após deixar a Presidência.
Trump também batalha contra o andamento de outro processo, na Geórgia, que pode levá-lo ao banco dos réus, por tentativa de interferência na eleição que perdeu para Biden no estado em 2020.
Nada disso, no entanto, vai tirá-lo da corrida, já que os EUA não têm uma lei equivalente à da ficha limpa, e candidatos condenados podem concorrer normalmente. A exceção seria um processo por insurreição ligado à invasão do Capitólio. A 14ª Emenda, aprovada durante a Guerra Civil, impede que envolvidos em insurreição ou rebelião assumam cargos públicos.
O indiciamento de Trump ainda mexeu com a algo combalida direita populista no mundo. Nesta segunda, o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, publicou no Twitter uma foto com Trump e o chamou de presidente. "Continue lutando, senhor presidente! Estamos com você."