Rússia avança, e Kiev admite situação difícil no leste do país
A ação está concentrada em cidades que já estiveram sob o comando russo e pegou os ucranianos de surpresa
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terça-feira, 18 de julho de 2023
A ação está concentrada em cidades que já estiveram sob o comando russo e pegou os ucranianos de surpresa
Igor Gielow - Folhapress
São Paulo - Forças russas estão avançando no leste da Ucrânia, naquilo que o Ministério da Defesa em Kiev admitiu ser uma "situação complicada" enquanto procura fazer avançar sua própria contraofensiva nos territórios ocupados por Moscou na invasão de fevereiro de 2022.
A ação pegou de surpresa os ucranianos. Ela está concentrada no chamado eixo Liman (Donetsk)-Kupiansk (Kharkiv), duas cidades que já estiveram sob controle russo e foram retomadas no fim do ano passado pelos ucranianos.
A região não estava na prioridade da contraofensiva lançada por Volodimir Zelenski em 4 de junho: suas ações se concentram mais ao sul de Donetsk e também em Zaporíjia, no sul ucraniano. "A situação é complicada, mas está sob controle", afirmou o comandante das forças terrestres de Kiev, general Oleksandr Sirskii em mensagem no Telegram nesta terça (18).
Na segunda (17), o comando ucraniano na região havia afirmado ter monitorado a concentração de 100 mil soldados e 900 tanques russos naquele eixo de ação, o que configura se confirmado a maior ofensiva desde que Vladimir Putin usou 200 mil homens para tentar dobrar a Ucrânia no ano passado.
Naquela ocasião, a maior crítica foi a dispersão de forças em três frentes autônomas, além de erros táticos como a falta de proteção de infantaria a colunas blindadas. Ao que tudo indica, a lição foi aprendida agora, e se o contingente for o estimado, trata-se talvez de um terço dos homens em território ocupado na Ucrânia.
Após dois dias em silêncio, o Ministério da Defesa russo confirmou que está em uma ofensiva. Disse ter avançado 1,5 km numa frente de 2 km de largura, o que não é aferível neste momento. O movimento parece querer retomar as duas cidades, importantes centros ferroviários, cortando assim suprimentos para as forças ucranianas mais ao sul.
Uma opção tática, se isso for bem-sucedido, seria então fechar o cerco sobre os 45% restantes da região de Donetsk que ainda estão sob controle de Kiev. Junto com a vizinha Lugansk, a área compõe o Donbass, o leste russófono da Ucrânia cuja "defesa" que está no coração dos motivos anunciados por Putin para a guerra.
Isso ainda é especulativo, em especial com o ritmo lento da guerra. Mas é péssima notícia para Zelenski, que passou a semana passada reclamando mais armas e um cronograma de adesão à Otan, a aliança militar liderada pelos Estados Unidos que fez sua reunião anual de cúpula.
Algumas autoridades se queixaram do que chamaram de falta de gratidão do ucraniano, que rebateu. Seja como for, os tanques e blindados ocidentais empregados na contraofensiva até aqui não lograram penetrar as defesas russas ao longo da frente de batalha, que tem cerca de 1.000 km.
Houve ganhos incrementais, com Kiev alegando ter recuperado 210 km quadrados de área desde junho, mas sem uma ação decisiva: supõe-se que o principal objetivo dos ucranianos é cortar a chamada ponte terrestre entre ligando Rússia e Donbass à Crimeia, anexada em 2014, via o sul ocupado da Ucrânia.
Zelenski já admitiu as dificuldades, e Putin disse no domingo que a contraofensiva não estava dando efeitos. Na segunda, os ucranianos conseguiram um golpe simbólico ao alvejar com um drone marítimo a ponte que liga a Crimeia à região russa de Krasnodar, interditando parcialmente a vital linha de suprimentos às tropas na península.
Toda essa dinâmica, ainda muito fluida, pode favorecer o estabelecimento de novas fronteiras provisórias da guerra, o que analistas e políticos especulam poder desaguar em negociações. Por ora, nenhum dos lados as admite, mas o Kremlin já disse mais de uma vez que conversaria com base na "nova realidade geográfica", eufemismo para os 20% de área que ocupa na Ucrânia. Kiev, claro, não topa.
Mas há uma janela geopolítica a ser considerada, que é o calendário eleitoral americano. O presidente Joe Biden começará sua campanha à reeleição de 2024 com a sombra de enfrentar o antecessor, Donald Trump, visto como pró-Putin. Se conseguir sacar um acordo que ao menos congele o conflito, que drena bilhões de dólares do contribuinte dos EUA, poderá ter um trunfo na mão.
Há fatores outros, como o cansaço ocidental com a guerra e a renovada pressão sobre os preços de alimentos no mundo devido à suspensão da presença russa no acordo que viabilizou o escoamento da produção de grãos da Ucrânia pelo mar Negro, ocorrida na segunda.