Guarulhos, SP - Os Estados-membros da OMS (Organização Mundial da Saúde) concordaram nesta quarta (1º) em lançar uma negociação para formular um tratado internacional voltado para o controle de futuras pandemias. O acordo para fortalecer as medidas de mitigação a crises sanitárias deve estar pronto em maio de 2024.

A natureza jurídica do documento, porém, já é tema de divergência. Enquanto a União Europeia (UE) e outras 70 nações pressionaram por um pacto de efeito vinculativo - com os países sendo obrigados a seguir o que for decidido em seu âmbito -, membros como Brasil, EUA e Índia, alguns dos mais afetados pela pandemia, relutaram em se comprometer, de acordo com relatos de diplomatas à agência Reuters.

A embaixadora Lotte Knudsen, chefe da delegação do bloco europeu em Genebra, argumentou em comunicado que o documento precisa ser ambicioso, o que só pode ser alcançado por meio de um compromisso multilateral e um instrumento juridicamente vinculativo.

Para Deisy Ventura, professora de saúde pública e direito internacional da USP (Universidade de São Paulo), a decisão é um passo importante, mas que deveria ter sido dado há muito tempo. "Quando a comunidade internacional tem vontade política, acordos são firmados em meses; quando não tem, são estabelecidos em anos."

Além da natureza do acordo - se terá ou não teor vinculativo -, Ventura salienta que mecanismos de controle e punição devem ditar o peso real do tratado. Sem medidas que constranjam nações que descumprirem o que for estabelecido, o documento perde força, diz.

E o mecanismo pode vir por meio de duas vias: tanto a da punição - Estados que desrespeitarem o acordo poderiam ser excluídos de processos decisórios da OMS, por exemplo - quanto a do incentivo - como oferecer linhas de financiamento a países que seguirem as determinações.

Torna-se preciso, porém, assegurar a chamada "geometria variável", de modo que países desenvolvidos e com sistema de saúde robustos e nações em desenvolvimento ou envolvidos em conflitos domésticos, por exemplo, não recebam o mesmo tipo de constrangimento, destaca a especialista.

Ainda que com reservas ao efeito vinculativo, os EUA, líderes mundiais em números absolutos de mortes por Covid, saudaram o acordo, dizendo tratar-se de um passo importante na responsabilidade coletiva para tornar o sistema de saúde global mais forte e ágil. Já a Austrália, por meio da embaixadora Sally Mansfield, disse que o texto foi produto de compromissos e francas discussões.

Enquanto o tratado oriundo da decisão apelidada de "The World Together" (o mundo junto) não for finalizado, os 194 Estados-membros da OMS deverão respeitar o Regulamento Sanitário Internacional, documento aprovado em 2005 que, entre outros pontos, obriga os países a alimentarem um sistema de informações sanitárias para diminuir o tempo de resposta em uma emergência.

mockup