São Paulo - Um dia após sobreviver a uma moção de desconfiança que poderia ter lhe custado o cargo, o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, prometeu nesta terça-feira (7) que lançará nas próximas semanas um pacote de medidas econômicas em uma tentativa de fortalecer sua liderança à frente do país e recuperar o apoio do Partido Conservador.

Boris Johnson ganhou popularidade na Ucrânia depois de ter agido de forma rápida para fornecer armas ao país em janeiro, antes mesmo da invasão russa
Boris Johnson ganhou popularidade na Ucrânia depois de ter agido de forma rápida para fornecer armas ao país em janeiro, antes mesmo da invasão russa | Foto: Leon Neal/Pool/AFP

Na noite de segunda (6), 148 dos 359 parlamentares conservadores britânico votaram para que o premiê perdesse o cargo, mas o número ficou abaixo dos 180 (pelo menos metade da bancada) necessários para removê-lo do poder.

Desde o fim do ano passado, Johnson é alvo de fritura após denúncias de que participou de uma série de festas que violaram regras estabelecidas por seu próprio governo para conter a disseminação da Covid-19. O escândalo ficou conhecido como "partygate".

Em questão está a integridade de Boris. Seus adversários o acusam de ser um mentiroso contumaz, e ele enfrenta uma investigação que apura se ele teria enganado o Parlamento ao dar explicações sobre as festas realizadas em Downing Street, residência oficial e sede do governo, enquanto os britânicos seguiam regras rígidas de lockdown durante a pandemia.

Agora, com o respiro após vencer a bancada rebelde de sua legenda, seu primeiro desafio é convencer os aliados mais importantes, alguns dos quais que provavelmente concorreriam para substituí-lo caso perdesse o mandato, de que ele será capaz de superar a desconfiança.

Nesta terça, em reunião com seu gabinete, Boris agradeceu aos ministros pelo apoio e afirmou que nas próximas semanas deve lançar novas políticas de habitação e propostas para reduzir o custo com cuidados infantis.

O primeiro-ministro planeja fazer um discurso aos eleitores nesta semana focado em habitação, além de outro discurso focado na economia na próxima semana. O governo pretende ainda seguir adiante com o polêmico projeto de enviar imigrantes que entraram no país de maneira ilegal para Ruanda. A ideia é que o primeiro grupo vá para o país africano em 14 de junho.

Segundo o jornal britânico Daily Telegraph, o premiê estuda ainda reformular seu gabinete e recompensar correligionários que mostraram lealdade na votação. A ideia é principalmente promover uma geração mais jovem de parlamentares, sobretudo os eleitos em 2019, para ganhar o apoio dessa parcela da bancada que teria mais resistência ao premiê, além de punir funcionários de alto escalão que não o defenderam publicamente. Ao jornal, no entanto, o governo negou que pretenda fazer mudanças no momento.


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O presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, comentou a vitória de Boris no Parlamento. "Estou muito feliz com isso", disse em um evento organizado pelo jornal Financial Times. "Estou feliz por não termos perdido um aliado muito importante, esta é uma ótima notícia." Boris ganhou popularidade na Ucrânia depois de ter agido de forma rápida para fornecer armas ao país em janeiro, antes mesmo da invasão russa.

Para William Hague, que liderou o Partido Conservador de 1997 a 2001, a posição de Boris como primeiro-ministro não é mais viável e ele deveria "voltar sua mente para sair" para dar ao partido uma chance de recomeçar. Continuar no comando do país, para ele, seria como "dirigir na estrada com dois pneus furados", disse à agência Reuters.

Nesta terça, os jornais britânicos ofereceram pouco conforto à ideia propagada pelo premiê após a votação de que o resultado seria definitivo. O Daily Telegraph, onde o próprio Boris fez carreira como jornalista, chamou o resultado de uma "vitória vazia". No Times, a avaliação foi a de que a diferença pequena de votos não é boa para a autoridade política do premiê.

À AFP, o cientista político Anand Menon, do King's College London, afirmou que a votação foi um "golpe maciço" para o primeiro-ministro. "Duvido que ele renuncie, então a questão é se os deputados obviamente descontentes encontrarão uma maneira de derrubá-lo", disse.

As regras do Partido Conservador estipulam que o primeiro-ministro está a salvo de outra moção de desconfiança pelos próximos 12 meses, mas isso pode tecnicamente ser alterado se houver vontade política suficiente para fazê-lo.

Enquanto ele permanecer no cargo, "a vulnerabilidade do primeiro-ministro será o principal fator que influenciará as ações do governo: será difícil interpretar todos os anúncios políticos, todas as iniciativas, como algo mais do que táticas para compensar sua fraqueza", afirma Menon.

Em 2018, a antecessora de Boris, Theresa May, venceu uma moção de desconfiança contra ela com uma porcentagem mais folgada que a do atual premiê, e mesmo assim renunciou seis meses depois em meio às dificuldades de levar o Brexit a cabo.

Nesta terça, a Transparência Internacional no Reino Unido pediu que o governo britânico endureça os códigos de conduta para políticos de modo a tentar recuperar a confiança da população.

"Acontecimentos recentes demonstraram como convenções de longa data em torno de padrões éticos na vida pública não são mais observadas como uma coisa natural, e existe pouca possibilidade de fiscalizar a má conduta por parte dos que estão no poder", disse Daniel Bruce, executivo da entidade. "Esse desvio de padrões e as decisões decorrentes dele correm o risco de alimentar a desigualdade, frear nossa economia e minar as respostas eficazes às crises aqui em casa".

O grupo pediu que o Código Ministerial, que estabelece padrões de conduta para políticos de alto escalão, seja regulamentado para evitar que seja descartado pelo primeiro-ministro da época, entre outras mudanças. A movimentação ocorre depois que, no mês passado, o governo anunciou alterações em suas regras de ética para que os ministros que violem o código não sejam mais obrigados a renunciar.

Na segunda-feira, o legislador conservador John Penrose renunciou ao cargo de representante anticorrupção do governo, dizendo que estava claro que Boris quebrou o código de conduta ao mentir ao Parlamento negando que tenha participado de festas no período de proibição pela Covid-19.

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