São Paulo - Ao menos 74 pessoas morreram e outras 52 ficaram feridas nesta quinta-feira (31) em um incêndio que atingiu um prédio de cinco andares no centro de Joanesburgo, na África do Sul. Trata-se de um dos incidentes mais letais do tipo no país em décadas.

O incêndio começou durante a madrugada, e as causas estão sendo investigadas, disse o porta-voz do Serviço de Gestão de Emergências, Robert Mulaudzi. Ao menos 12 crianças morreram, incluindo um bebê com menos de 2 anos. A maior parte das vítimas foi intoxicada por inalação de fumaça.

Imagens transmitidas pela TV local mostraram vários caminhões de bombeiros e ambulâncias do lado de fora do prédio, que foi isolado pela polícia. O fogo foi controlado, e o resgate de mortos e sobreviventes se estendeu por horas. Algumas vítimas ficaram irreconhecíveis devido às queimaduras.

"Estamos avançando, andar por andar, para recuperar os corpos", disse Mulaudzi. "É um dia muito triste para Joanesburgo [...]. Em mais de 20 anos de serviço nunca vi algo assim." Dezenas de corpos carbonizados foram enfileirados e enrolados em lençóis numa rua próxima ao local do incêndio. O prédio atingido pelas chamas fica num bairro que já foi comercial e hoje recebe poucos recursos do Estado.

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O incêndio começou por volta de 1h30 no horário local (22h30 de quarta em Brasília). Um homem de 25 anos que sobreviveu ao incêndio e se identificou apenas como Leo disse que escapou com a mãe pelas escadas. "Estava escuro e havia muita fumaça. Não dava para ver nada", afirmou.

Omar Arafat, outro sobrevivente, contou à agência de notícias Reuters que perdeu uma irmã de 21 anos no incêndio, além de todos os pertences da família. "Quebrei a janela, e quando caí, pensei 'estou morto'", disse, enxugando as lágrimas e acrescentando que outra irmã estava hospitalizada.

Há ainda relatos de testemunhas que viram moradores do prédio em chamas se lançando pelas janelas para tentar sobreviver e até jogando bebês em direção à rua para tentar salvá-los. Do lado de fora, ainda segundo testemunhas, havia vizinhos depositando colchões para aliviar o impacto da queda.

Segundo a emissora Newzroom Afrika, o prédio havia sido abandonado, mas foi ocupado por famílias em situação vulnerável. Mgcini Tshwaku, membro do comitê municipal responsável pela segurança pública, disse que o uso de velas para iluminar o interior do edifício pode ter dado início às chamas.

"Muitas pessoas podem ter ficado presas quando o fogo começou. Dentro do prédio havia um portão [de segurança] que estava fechado, para que as pessoas não conseguissem sair", afirmou ele. "Muitos corpos foram encontrados amontoados neste portão."

A ocupação ilegal de prédios abandonados é comum no centro de Joanesburgo, onde imóveis são controlados por grupos criminosos que cobram aluguel dos ocupantes. Em junho, outro incêndio destruiu um edifício na cidade e matou dois meninos que tinham menos de 10 anos.

O prefeito de Joanesburgo, Kabelo Gwamanda, disse que o local era propriedade das autoridades municipais e que tinha sido alugado a instituições de caridade que atuam com mulheres deslocadas. Sem entrar em detalhes, ele acrescentou que o prédio "acabou servindo a um propósito diferente".

Lebogang Isaac Maile, chefe do departamento de Assentamentos Humanos da província de Gauteng, que inclui Joanesburgo, endossou a suspeita de que algumas das vítimas pagavam aluguel para gangues que cobravam de forma ilegal. "Existem cartéis que atacam pessoas vulneráveis. Porque alguns desses edifícios, se não a maioria deles, estão na verdade nas mãos dos cartéis que cobram aluguel", disse.

Uma placa na entrada do bloco residencial identifica o edifício como uma construção histórica do apartheid, sistema oficial de segregação racial e discriminação institucionalizada que durou de 1948 a 1994, negando direitos básicos aos negros sul-africanos. Nesse tipo de construção, à época, os negros recolhiam os chamados "dompas", documentos que lhes permitiam trabalhar em áreas da cidade que o sistema classificava como pertencentes aos brancos.

Apesar do fim do regime, Joanesburgo é uma das cidades mais desiguais do mundo, com pobreza generalizada, desemprego e uma crise habitacional. Segundo o governo provincial de Gauteng, o município tem cerca 15 mil pessoas em situação de rua.