A morte do papa emérito Bento 16, aos 95 anos, no último dia 31 de dezembro, acendeu a discussão sobre o legado deixado pelo pontífice para a Igreja Católica. Alemão, Joseph Ratzinger tinha como características a humildade e o conservadorismo, que são exaltados pelos especialistas ouvidos pela FOLHA.

Segundo o padre Rafael Solano, era quase inimaginável que um papa renunciasse e isso trouxe uma nova visão para a igreja
Segundo o padre Rafael Solano, era quase inimaginável que um papa renunciasse e isso trouxe uma nova visão para a igreja | Foto: Gustavo Carneiro

Bento 16 ficou cerca de oito anos como papa e outros dez anos como papa emérito. Em fevereiro de 2013, quando anunciou a renúncia, dividiu opiniões entre os que criticaram um precedente perigoso para o papado e os que elogiaram a coragem.

Para o professor de teologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUC-PR) e presbitério da arquidiocese de Curitiba, Roberto Nentwig, Bento 16 construiu pilares que devem nortear os próximos passos da igreja, especialmente pela renúncia.

"Teve humildade, coragem e confiança em Deus para renunciar. Assim fazendo, deixou aberto para uma renovação da igreja. A começar pela cúria romana. Se questionava muito, quando o papa Francisco assumiu, se o papa iria reformar e atacar os pontos nevrálgicos da cúria romana, mas isso foi um caminho aberto por Bento 16", disse à FOLHA.

Bento 16 foi o primeiro papa a renunciar depois de 600 anos. Na ocasião, ele alegou não ter mais forças físicas para continuar na função
Bento 16 foi o primeiro papa a renunciar depois de 600 anos. Na ocasião, ele alegou não ter mais forças físicas para continuar na função | Foto: Raul Arboleda/AFP

Bento 16 foi o primeiro papa a renunciar depois de 600 anos. Na ocasião, ele alegou não ter mais forças físicas para continuar na função. Segundo o padre Rafael Solano, sacerdote da Arquidiocese de Londrina, isso era quase inimaginável e trouxe uma nova visão para a igreja.

"Pensar em renunciar era uma coisa quase que mirabolante, inesperada. Mas Bento 16 mostrou claramente que não, que um papa pode renunciar. E Francisco tem falado sobre isso com uma naturalidade impressionante [...] Um ato de honestidade, um ato de desapego com tanta tranquilidade. Nós não precisamos ficar grudados eternamente nas coisas deste mundo. Tudo é transitório”, considerou em entrevista à FOLHA.

Conforme Roberto Nentwig, a renúncia feita por um papa conservador trouxe mais peso para a decisão. “Eu acredito que sua renúncia deve ser lida como algo muito positivo. Não se cogitava esse acontecimento, foi uma grande surpresa. E eu acredito que foi bom ser um papa considerado conservador, porque assim não pairou tantos questionamentos", avaliou.

O papado de Bento 16 foi marcado, ainda, pelos escândalos associados a milhares de casos de pedofilia dentro da Igreja Católica. O professor de teologia da PUC lembrou que, na época, o Vaticano teve que enfrentar e assumir a responsabilidade pelas graves denúncias de abuso sexual.

“De certo modo foi um papa de transição. Foi o primeiro a levar a sério as questões de abuso sexual na igreja. Hoje, o papa Francisco faz um grande trabalho neste sentido, mas foi o papa Bento 16 que começou", disse Nentwig.

O legado teológico de Bento XVI também é evidenciado pelos especialistas. Roberto Nentwig o classificou como um grande pensador e citou uma das passagens escritas por ele: ‘Justiça é dar ao outro o que é dele. Amor é dar ao outro o que é meu’ para ressaltar a mensagem de união deixada pelo pontífice.

“Um teólogo de peso, de envergadura. E suas encíclicas são obras preciosas. É claro que devemos separar o teólogo Joseph Ratzinger do papa Bento 16, mas uma coisa influencia a outra, porque ele como papa deixou grandes escritos”, pontuou.

Na última quinta-feira (5), padre Rafael presidiu uma missa em sufrágio do papa emérito Bento 16, na Catedral de Londrina. Ele lembrou que Joseph Ratzinger possuía um conceito muito claro do que significa a razão e a fé.

“Quando a história fala de Bento 16 vai fazendo de diversas formas. Uma delas, sem dúvida nenhuma, em primeiríssimo lugar, será o homem ecumênico. A sua cultura e a sua teologia permitiam que ele entrasse em contato com pessoas de todos os credos, de todos os pensamentos, e mostrasse com clareza a beleza da fé cristã [...] Sua personalidade sempre foi muito sensível às necessidades dos outros. Talvez uma das coisas mais belas que eu sempre vi no papa foi a sua doçura, a sua gentileza, o dom de pessoa que esse homem tinha”, garantiu.

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