Madri, Espanha - Descontentes com a perspectiva de deixar a União Europeia, cidadãos britânicos estão desafiando o próprio governo na Justiça. Eles pedem que o Parlamento, e não a primeira-ministra Theresa May, tenha o poder de romper com o bloco econômico.
O Reino Unido votou em 23 de junho para sair da União Europeia, no que ficou conhecido como Brexit. O governo deve acionar o artigo 50 do Tratado de Lisboa até março de 2017, dando início formal à saída. Mas as iniciativas que contestam o Brexit têm avançado nas últimas semanas, e podem chegar à Suprema Corte em dezembro.
Ainda que não tenham sucesso em impedir a saída, esses grupos colocam em debate a própria estrutura da democracia no Reino Unido. "É uma questão fundamental", diz Grahame Pigney, do movimento Desafio do Povo. "Se o Parlamento é o poder soberano no Reino Unido, então o governo não pode anular ou modificar atos do Parlamento." Pigney afirma que a entrada no bloco foi decidida fundamentalmente pelo Parlamento e, portanto, cabe a essa mesma entidade revogar a própria decisão. "É uma questão de democracia."
O Desafio do Povo é financiado coletivamente pela internet, e já reuniu mais de R$ 450 mil entre doações. Essa verba é investida em uma equipe de advogados. Há outros grupos com ações semelhantes, que serão julgadas em conjunto. "Por vezes nos representam como uma maneira de interromper o Brexit, mas não é isso o que estamos pedindo da Corte", diz Pigney. "Não acreditamos que a premiê, ou qualquer outro membro do governo, pode alterar ou anular atos do Parlamento. Especialmente quando esses atos garantem direitos específicos e benefícios a cidadãos britânicos."
Nesse sentido, grupos como o Desafio do Povo tiveram uma importante vitória na semana passada, quando a Justiça decidiu que o governo tinha que tornar públicos os argumentos de sua defesa - até então sigilosos - para impedir que o Parlamento decida o Brexit. Os papéis divulgados dão conta de que, para o governo, é "constitucionalmente inadmissível" que um Parlamento tenha tal autoridade, em vez da primeira-ministra.

QUESTÕES
Sem precedentes, a saída do Reino Unido da União Europeia deve afetar toda a região. Ainda não está claro como a ruptura será encaminhada, e há pressão para que a premiê May revele os detalhes de seus planos. Duas das principais questões que preocupam o país, e também o bloco, são a migração e os acordos comerciais. Ou seja, o status dos europeus que vivem no Reino Unido, e que acesso os britânicos terão ao mercado comum europeu, com 500 milhões de consumidores.