Washington - Após vetarem a resolução proposta pelo Brasil na semana passada, os Estados Unidos apresentaram um texto próprio ao Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre o conflito no Oriente Médio.

Ainda não há previsão de quando o texto será votado. A missão americana na ONU ainda não solicitou a análise do texto ao conselho, presidido neste mês pelo Brasil.

Em reunião do órgão nesta terça (24), o secretário de Estado americano, Antony Blinken, afirmou que o documento "se baseia em muitos elementos da resolução proposta pelo Brasil", somados ao feedback de outros membros do conselho.

A Rússia, no entanto, que tem poder de veto, já afirmou que não pode apoiar o texto americano e que elaborou uma terceira proposta, sintetizando sua própria redação do documento (derrotada no conselho na semana passada), a brasileira e a americana.

Na semana passada, os EUA foram o único país a votar contra a resolução brasileira, sob a justificativa de que ela não afirmava o direito de Israel de se defender.

Assim, o texto apresentado por Washington "reafirma o direito inerente de todos os Estados à autodefesa individual e coletiva" e elimina o trecho presente na resolução brasileira que pedia a rescisão da ordem de evacuação imposta por Israel a civis no norte de Gaza.

Diante das críticas à reação de Israel, a resolução americana também "reafirma que, ao responder a ataques terroristas, os Estados-Membros devem cumprir integralmente todas as suas obrigações nos termos do direito internacional, em particular o direito internacional dos direitos humanos, o direito internacional dos refugiados e o direito internacional humanitário".

Assim como o texto proposto pelo Brasil, a resolução americana condena os ataques perpetrados pelo grupo terrorista Hamas, mas inclui "outros grupos terroristas". O texto faz ainda um apelo para que todos os Estados-membros "intensifiquem seus esforços para reprimir o financiamento do terrorismo".

Enquanto o documento brasileiro pedia diretamente pausas humanitárias, o americano pede "a adoção de todas as medidas necessárias, como pausas humanitárias, para permitir o pleno, rápido, seguro e não impedido acesso humanitário".

Ambos os textos fazem um apelo para que agentes relevantes usem sua influência para evitar uma ampliação do conflito na região, mas o texto americano cita explicitamente a exigência para que o Hezbollah - apoiado pelo Irã - pare seus ataques.

O secretário de Estado americano afirmou que pretende trabalhar por esse objetivo durante visita de seu par chinês, Wang Yi, a Washington nesta semana.

Blinken mencionou ataques sofridos por pessoal americano no Iraque e na Síria, atribuídos por ele a aliados do Irã. "Repito aqui: os EUA não buscam um conflito com o Irã, não queremos que essa guerra cresça, mas se o Irã atacar pessoal americano, não se enganem. Nós vamos defender nosso pessoal, nossa segurança", alertou.

A sessão sobre Oriente Médio do Conselho de Segurança nesta terça já estava no calendário do órgão desde antes da eclosão do conflito - trata-se de uma agenda trimestral. No entanto, com a escalada da violência após os ataques perpetrados pelo Hamas em 7 de outubro, o encontro ganhou outro escopo.

Ministros de relações exteriores, como o brasileiro Mauro Vieira, representaram seus países, em vez dos embaixadores das missões nacionais na ONU, como é de costume. Além dos 15 integrantes do conselho, outros Estados também foram autorizados a participar, como Egito e Alemanha, e o observador do Vaticano.

Vieira, falando na condição de representante do Brasil, repetiu os apelos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para que os reféns sejam soltos, e para que Israel pare os bombardeios para que civis palestinos saiam de Gaza.

Sem citar os EUA, o diplomata disse que "estratégias obstrutivas têm impedido que decisões cruciais sobre a paz e segurança internacional sejam tomadas". "Como resultado, a situação no Oriente Médio é de longe um dos assuntos mais obstruídos no Conselho de Segurança", afirmou. "É provável que sejamos testados e considerados culpados pelas gerações futuras por nossa inação e complacência."

LULA

O presidente Lula voltou a criticar nesta terça-feira a reação militar de Israel ao ato terrorista promovido pelo Hamas, grupo que controla a Faixa de Gaza. "Não é porque o Hamas cometeu ato terrorista contra Israel que Israel tem que matar milhões de inocentes. Não é possível que as pessoas não tenham sensibilidade", afirmou o petista.

Gaza, território palestino onde vivem mais de 2 milhões de pessoas, é alvo de bombardeios que já mataram mais de 5.700 pessoas, incluindo 2.360 crianças, segundo autoridades de Saúde do Hamas.

A fala do presidente aconteceu durante o “Conversa com o Presidente”, programa transmitido ao vivo na internet que foi retomado nesta terça, após quase um mês de pausa. A última edição havia ido ao ar em 26 de setembro, poucos dias antes de Lula passar por uma cirurgia no quadril e nas pálpebras. Desde então, o presidente vinha se recuperando no Palácio da Alvorada, a residência oficial da Presidência.

Lula disse que ainda insiste na formação de um corredor humanitário em Gaza para proteger o fornecimento de energia elétrica nos hospitais e "garantir que não se mate mais crianças". O bloqueio total que Tel Aviv impôs ao território palestino após os ataques deixou hospitais, incluindo aqueles que atendem bebês em incubadoras, à beira do colapso.

Em suas redes sociais, o presidente escreveu que se indigna com a morte de crianças no conflito no Oriente Médio e lembrou o ataque a uma escola na zona leste de São Paulo.

"Vou continuar falando de paz. Vou continuar me indignando com as mortes de crianças na guerra. Vou continuar me indignando com mortes como a que aconteceu na escola em Sapopemba. Não é aceitável que tragédias como essas sejam normalizadas", escreveu o presidente.

O presidente e outros integrantes do seu governo vinham buscando uma postura de neutralidade em relação ao conflito entre Israel e o grupo terrorista Hamas, iniciado após um ataque por ar, água e ar contra o território israelense.

Lula prontamente condenou os "atos terroristas", mas não citou diretamente o Hamas em sua primeira manifestação. Mais recentemente, na sexta-feira (20), ao participar virtualmente de cerimônia dos 20 anos do programa Bolsa Família, o petista relacionou pela primeira vez o grupo que controla a Faixa de Gaza com o conceito de terrorismo. Ao mesmo tempo, descreveu como "insana" a reação de Israel.