Doenças ameaçam homem do século 21
PUBLICAÇÃO
domingo, 02 de janeiro de 2000
Napolão Sabóia
Agência Estado
De Paris
O forte crescimento da população mundial, a falta de saneamento nas regiões pobres do planeta, a globalização facilitando o deslocamento rápido dos microorganismos, a poluição, as mudanças climáticas e a generalização incontrolada do uso de antibióticos são as causas mais apontadas pelos especialistas europeus para prever o surgimento de doenças infecciosas no próximo século e o agravamento das já existentes.
Em recente colóquio promovido pelo Escritório de Análise e Previsão da Unesco, o assunto foi discutido pelos médicos Luc Montaigner, co-descobridor do vírus da Aids, e David Heymann, diretor da Divisão de Doenças Transmissíveis da Organização Mundial da Saúde (OMS). Ambos concordaram no prognóstico global: o alcance maior ou menor das enfermidades emergentes e reemergentes dependerá basicamente do nível de melhoria das condições sócio-econômicas das populações, das ações de prevenção sanitária e do acesso aos medicamentos.
Montaigner, da Academia de Medicina da França, observa que o aparecimento de doenças infecciosas sempre esteve ligado aos deslocamentos de populações e à globalização progressiva do mundo. Mas o Século XX adicionou novas causas ao aparecimento e reaparecimento de doenças: o forte crescimento da população, inédito na história da Humanidade e que fez surgirem cidades gigantes em torno das quais se criou um mundo marginal, e a globalização. Os germes podem hoje se deslocar na mesma velocidade dos aviões, eles se adaptam sem dificuldade às condições de seu novo habitat e se propagam, de preferência, no seio das populações mal preparadas, vulneráveis do ponto de vista sanitário.
A poluição, diz o especialista, contribui ao fazer do ar um agente capaz de enfraquecer o organismo humano. Assim, é provável que as doenças alérgicas aumentem, porque a poluição nas grandes cidades em geral superou os limites toleráveis, argumenta. O aumento da esperança de vida criou, por sua vez, condições favoráveis ao desenvolvimento das doenças crônicas como as doenças cardiovasculares, o câncer e as enfermidades neurodegenerativas.
Emergentes Heymann observa que as doenças emergentes não poupam nenhum país, como a Inglaterra da vaca louca e o Japão, que enfrenta a grave epidemia causada pelo germe Escheríchia coli 157. Mas lembra que os países em desenvolvimento terão, obviamente, um desafio a mais a enfrentar neste campo. Os países do Terceiro Mundo têm problemas econômicos e sociais que acentuam as dificuldades para que seja contida a propagação das enfermidades infecciosas, como a tuberculose, o cólera e a malária, que reaparecem em razão da falência dos sistemas de saúde, analisa.
Nos países da antiga União Soviética, por exemplo, a difteria reapareceu em escala epidêmica. O cólera, lembrou, também ressurgiu na América Latina nos últimos anos, mas, felizmente, não tomou as proporções epidêmicas previstas de início, apesar da insuficiência dos sistemas de saneamento e abastecimento de água.Globalização, pobreza e mudanças climáticas favorecem o aparecimento de novas enfermidades e o agravamento da já existentes
Arquivo FolhaTERCEIRO MUNDO Técnica da Saúde recolhe amostras de água poluída em Paranaguá, onde surgiram foco de cólera. A falta de saneamento básico é um dos principais vetores para o alastramento de doenças infecciosas, principalmente nos países subdesenvolvidos.