São Paulo - O líder dos radicais islâmicos que derrubaram Bashar al-Assad do poder na Síria anunciou nesta terça (10) que irá elaborar uma lista de criminosos de guerra ligados à ditadura que serão perseguidos e julgados pelo novo governo.

"Nós vamos oferecer recompensas a qualquer um que nos der informações acerca de oficiais do Exército e das forças de segurança graduados envolvidos em crimes de guerra", escreveu Abu Mohammed al-Jolani usando seu nome verdadeiro, Ahmed al-Sharaa, no Telegram.

Na véspera, o grupo que ele lidera, a HTS (Organização para a Libertação do Levante), havia feito uma sinalização contrária, dizendo que todos os integrantes das Forças Armadas de Assad seriam anistiados na transição de governo.

Ela começou na segunda (9), como o premiê Mohammed al-Jalali anunciando a entrega do governo aos rebeldes. Tudo é incerto: as forças da HTS, apoiadas pela Turquia, não são as maiores entre os diversos grupos em ação no país.

Só o Exército Livre da Síria, que teve suporte turco e ocidental e é secular, tem cerca de sete vezes mais homens que Al-Sharaa, comandante de alegados 10 mil soldados fiéis. Já os curdos, que são combatidos pelos turcos, somam talvez 50 mil militares no nordeste sírio.

A questão da anistia é complexa, dada a história de brutalidade do regime sírio. Os rebeldes que tomaram Damasco no domingo (8) já estão vasculhando os porões de Assad atrás de evidências e provas dos crimes amplamente reconhecidos por organismos internacionais.

Até aqui, o resultado frustrou as expectativas. Segundo a agência France Presse, os rebeldes encontraram 40 corpos com sinais de tortura em um hospital de Damasco, mas ainda há dúvidas acerca do relato.

Já a Defesa Civil Síria, nome formal do grupo ligado à oposição a Assad conhecido como Capacetes Brancos, pelo uso da indumentária em missões de resgate nas áreas de conflito da guerra civil que assolou o país a partir de 2011, declarou estar desapontado.

Os Capacetes Brancos foram encarregados de vasculhar a infame prisão de Sednaya, conhecida como uma espécie de buraco negro onde opositores do regime de Assad desapareciam.

"Nenhuma evidência de celas secretas ou porões foi encontrada. A operação envolveu cinco times. Apesar desses esforços, nenhuma área escondida ou selada foi identificada", disse o grupo, em nota.

Até aqui, só há a confirmação da soltura de presos políticos em celas regulares, o que obviamente não significa que o regime era bonzinho. "Sednaya não dá a impressão de ser uma cadeia. É um inferno. É um abatedouro humano em que pessoas eram mortas e torturadas", disse à rede Al Jazeera Raed al-Saleh, o diretor dos Capacetes Brancos.

A ditadura de Assad, iniciada há quase 54 anos por Hafez, pai de Bashar, tem longo histórico de violações de direitos humanos relatados por dissidentes. As contas são sempre imprecisas, com estimativas colocando em até 500 mil os mortos pela repressão nessas décadas - número semelhante ao atribuído à guerra civil sozinha.

Segundo a Rede Síria de Direitos Humanos, baseada no Reino Unido, 85% dos cerca de 112 mil desaparecidos desde o começo da guerra civil sumiram enquanto presos pelo governo Assad - deixando desconfortáveis 15% para a oposição.