São Paulo - O Brasil caiu dez posições e ficou em 104º lugar entre 180 países no ranking IPC (Índice de Percepção da Corrupção) de 2023, divulgado pela ONG Transparência Internacional nesta terça-feira (30). Em escala global, o levantamento aponta um enfraquecimento do sistema judiciário e do Estado de Direito.

Enquanto a média mundial ficou estagnada em 43 pontos pelo 12º ano consecutivo - o índice vai de 0, que caracteriza o cenário mais corrupto, a 100, para o mais íntegro - , a pontuação brasileira passou de 38 para 36 pontos no primeiro ano do terceiro mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

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Trata-se da pior queda do Brasil desde 2017, quando o país perdeu 17 posições no ranking em relação a 2016 (foi de 79º para 96º lugar). É ainda a pior posição no ranking desde 2019, quando a nação aparecia em 106º.

Segundo o relatório, a responsabilidade pelo desmonte de marcos institucionais contra a corrupção que levaram décadas para ser erguidos é da gestão de Jair Bolsonaro (2019-2022). Ao mesmo tempo, porém, o governo Lula vem falhando na reconstrução de mecanismos similares.

"Tivemos uma série de retrocessos nos últimos anos e agora estamos testemunhando a dificuldade do processo de reconstrução das instituições", diz Guilherme France, gerente do centro de conhecimento anticorrupção da Transparência Internacional.

"A lição que fica é que o processo de degradação das instituições que compõem o Estado democrático de Direito pode acontecer de forma bastante rápida, mas o de reconstrução é demorado e demanda envolvimento de todos os atores da sociedade."

Os fatores negativos que contribuem para o resultado envolvem o Executivo, Legislativo e Judiciário. O relatório lista entre os pontos negativos do governo Lula 3 a indicação de Cristiano Zanin, amigo pessoal do presidente, ao STF (Supremo Tribunal Federal); a manutenção, ainda que com uso limitado, das chamadas emendas do relator; e o aumento do fundo eleitoral para as eleições de 2024.

Embora o Brasil tenha caído posições no ranking, o estudo também menciona eventos que facilitaram o combate à corrupção ocorridos no Brasil no ano passado. São exemplos indicações para postos-chave na Polícia Federal baseadas em competências técnicas e a aprovação da reforma tributária, cuja simplificação pode dificultar práticas corruptas.

O país, contudo, ainda figura abaixo das médias global (43 pontos), das Américas (43 pontos) e dos Estados da OCDE, ou Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (66 pontos), no ranking. Sua pontuação também está abaixo da média de 48 pontos do grupo das nações classificadas de "democracias falhas", que têm eleições livres e respeitam liberdades civis básicas, mas podem ter problemas como, por exemplo, violações da liberdade de imprensa.

O Índice de Percepção da Corrupção analisou 180 países e territórios no ano passado, com base em 13 fontes independentes de dados - cada local foi avaliado de acordo com pelo menos três delas. Elaborado desde 1995, o levantamento passou por alterações metodológicas em 2012, ano a partir do qual se permite fazer a série histórica em que se observa a estagnação na média mundial em torno dos 43 pontos.

Propostas da Transparência Internacional para combater a corrupção no Brasil incluem cessar o uso do que chama de "mecanismos opacos" nas negociações políticas, como as emendas do relator; promover independência e diversidade nas nomeações aos cargos de alto escalão; remover do governo funcionários que estejam sob investigação ou sendo processados por corrupção, entre outras medidas.

Apenas dois países das Américas, Guiana (40 pontos) e República Dominicana (35), melhoraram o desempenho no IPC na última década, enquanto os outros ficaram estagnados ou tiveram suas pontuações diminuídas.

O Canadá (76) e o Uruguai (73), com controles anticorrupção mais robustos, estão no topo da classificação regional. Venezuela (13), Haiti (17) e Nicarágua (17) têm as pontuações mais baixas, caracterizadas por impunidade generalizada e falta de independência do Judiciário, segundo o relatório. A ditadura venezuelana, que ocupa o 177º lugar no ranking, em empate com Síria e Sudão do Sul, está na prática à frente de só um país dos 180, a Somália.

O Chile (66 pontos) é destacado pelo IPC devido às "sólidas instituições democráticas e altos níveis de transparência". No entanto, o país registrou queda na pontuação desde 2014. Este ano, a nação se encontra em um momento crucial, diz o relatório, com potencial para combater a corrupção e coibir o crime organizado caso coloque em vigor as recomendações fornecidas pela Comissão Consultiva de Probidade e Transparência.

Os Estados Unidos, que têm eleições neste ano, aparecem em 24º lugar, com 69 pontos, à frente da média global. Seus rivais China (42 pontos), em 76º lugar, e Rússia (26 pontos), em 141º lugar, aparecem bem atrás.

Após a divulgação do ranking IPC (Índice de Percepção da Corrupção) de 2023, no qual o Brasil caiu dez posições e ficou em 104º lugar entre 180 países, a CGU (Controladoria-Geral da União) afirmou em nota publicada nesta terça-feira (30) que os resultados de levantamentos do tipo devem ser vistos com cautela.

Segundo a CGU, estudos internacionais discutem as limitações metodológicas de índices baseados em percepção. "Diversos organismos internacionais - entre eles ONU, G20 e OCDE - têm discutido a elaboração de novas medidas sobre o tema. A corrupção é um fenômeno complexo e nenhum indicador consegue medir todos os seus aspectos", diz trecho do comunicado.

O órgão afirma que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem restabelecendo a estrutura dos conselhos de políticas públicas para a prevenção e o controle da corrupção e destaca que o IPC reconheceu avanços nos âmbitos do controle social, da transparência e do acesso à informação.

A CGU diz trabalhar para identificar e corrigir riscos de corrupção em políticas públicas, contratações e outras ações do Estado. "Também estamos fortalecendo a integridade dos órgãos federais e colaborando para a implementação de programas de integridade pública, fomentando a adoção de mecanismos de prevenção à corrupção por empresas e aprimorando mecanismos de detecção e sanção de corrupção."