A escritora Flora Munhoz da Rocha viveu 87 anos sem saber o que significava ‘‘salvar um texto’’. A ferramenta que utilizava para dar corpo às suas idéias não exigia muito mais que o conhecimento da disposição das letras no teclado. Mas a máquina de escrever não lhe pareceu prática o suficiente quando decidiu compor as 228 páginas de sua autobiografia.
‘‘Entre Sem Bater’’, escrito entre 1998 e 1999, foi o primeiro resultado da relação de Flora com o computador. A máquina foi emprestada pelo neto, responsável pelas lições que a escritora tomou pouco antes de dar início à obra. ‘‘Não tive problema em aprender aquelas ‘coisinhas’’’, disse, referindo-se aos comandos básicos do Word. ‘‘Mas acho que agora já esqueci tudo.’’
O interesse fr Flora Munhoz pela informática – ou sua necessidade de utilizá-la no trabalho – não pode ser considerado um caso à parte entre os paranaenses na terceira idade. Pessoas com mais de 50 anos dão sinais de que a resistência contra a tecnologia é uma luta perdida. A Folha apurou junto a algumas escolas de informática de Curitiba que esse grupo já representa 10% dos alunos de cursos de computação.
Segundo o responsável pelo departamento de venda da escola People, Marcos Seller, quando a empresa abriu a sede em Curitiba, há cinco anos, era raro encontrar uma pessoa na terceira idade frequentando as aulas de informática. Hoje eles são o principal público, juntamente com os executivos, das aulas particulares oferecidas pelo estabelecimento. ‘‘Muitos sentem-se constrangidos em turmas grandes, achando que os jovens aprendem mais rápido’’, diz Seller. ‘‘Mas nós temos turmas homogênias com pessoas de mais de 22 anos... de casadas’’, brinca.
Seller acredita que a falta de familiaridade com o computador não significa que aprender a lidar com a máquina seja um grande desafio aos alunos crescidos. ‘‘A dificuldade está em eles se convencerem de que aprender informática é difícil’’, diz. Desafio ou não, alguns alunos na terceira idade não se deixam intimidar pelas turmas repletas de representantes da geração que já nasceu na era da informática.
O engenheiro civil Raimundo Marussig, de 71 anos, fez questão de voltar a ser estudante ao lado de dezenas de jovens. ‘‘É bom estar em movimento’’, diz. As aulas, para ele, não são apenas um passatempo. ‘‘Eu uso no trabalho’’, conta Marussig, que decidiu trocar o tempo ocioso da aposentadoria pelo departamento financeiro da empresa de sua mulher. Além de instrumento de trabalho, o computador do engenheiro é companheiro das noites de insônia. ‘‘Quando não consigo dormir, vou praticar os exercícios que aprendo em aula.’’