Entre as obras capturadas em altíssima resolução está o famoso “Mestiço” (1934)
Entre as obras capturadas em altíssima resolução está o famoso “Mestiço” (1934)

Os incêndios em museus registrados nos últimos anos levaram os brasileiros a refletirem sobre o valor dos acervos mantidos por essas instituições e sobre a necessidade de preservá-los para as gerações futuras. É claro que nada substitui a visita presencial aos museus, mas a digitalização de acervos e as visitas virtuais podem ajudar a preservar a memória de locais que não existem mais, ou que estão muito distantes.

Cerca de 5 mil obras de arte e 15 mil cartas e documentos do artista brasileiro Cândido Portinari, que estão espalhados em coleções particulares em todas as partes do mundo, foram digitalizados e lançados na plataforma Google Arts & Culture na semana passada. Pela ferramenta, também é possível fazer uma visita em realidade virtual de 360º à casa do artista.

Dez das obras de Portinari foram capturadas em altíssima resolução (gigapixel), pela Google Art Camera, de forma que é possível se aproximar da imagem e enxergá-las nos mínimos detalhes. Até mesmo as pinceladas do artista podem ser percebidas nas imagens. Entre as obras capturadas em altíssima resolução estão o famoso “Mestiço” (1934), “Lavrador de Café” (1934) e “Café” (1935).

“Também estamos esperando que isso seja uma fonte poderosa de informação para curadores e especialistas ao redor do mundo estudarem os menores detalhes das obras, invisíveis a olho nu”, comentou Luisella Mazza, diretora de operações do Google Arts & Culture.

O filho de Cândido Portinari, João Cândido Portinari, esteve presente no evento de lançamento da retrospectiva do artista na plataforma da Google. Segundo ele conta, as obras de seu pai estavam espalhados por países como República Tcheca, Eslováquia, Finlândia, Canadá, África do Sul, Haiti e Israel. Para reunir o conjunto da obra do pai, ele fundou o Projeto Portinari.

“Nesses 40 anos, quando começamos, não tínhamos ideia do paradeiro da maioria das obras. Foi um trabalho de formiguinha que durou 25 anos”, conta Portinari. Segundo ele, 95% das obras do pai estão em coleções particulares, inacessíveis ao público. “É um paradoxo você ter um pintor que pintou para o povo brasileiro e esse povo não ter acesso às suas obras.”

Já estão disponibilizados no Google Arts & Culture obras de mais de 60 instituições culturais brasileiras. Conforme explica Luisella Mazza, desde que foi criado, em 2011, o projeto tem o objetivo de fazer com que a arte e a cultura se tornem mais acessíveis através da tecnologia. Apenas instituições culturais sem fins lucrativos podem se candidatar para ter suas obras disponibilizadas na plataforma. As ferramentas necessárias para a digitalização das obras em alta resolução e para a visita virtual – com o Google Street View - são providas pela Google às instituições gratuitamente.

Engajamento

Cerca de 500 dos principais itens da Pinacoteca de São Paulo – local onde “mora” uma das principais obras de Portinari, o “Mestiço” - estão disponíveis na Google Arts & Culture. Paulo Vicelli, diretor de Relações Institucionais da Pinacoteca, vê a tecnologia como uma ferramenta de engajamento virtual com o público, especialmente aquele formado pelas novas gerações. Além da digitalização do acervo, a instituição também tem uma Inteligência Artificial – o Watson, da IBM -, que responde às perguntas dos visitantes sobre suas obras, um aplicativo e uma conta no Spotify, com playlists sugeridas pela Pinacoteca.

“São ferramentas que ajudam o visitante, sobretudo da geração millenial, a entender o museu a partir dos seus olhos e do seu dia a dia. De que forma a gente se torna relevante para um menino de 12 anos de idade? É o que sempre digo: não adianta eu pregar para convertido. Preciso pregar para quem não costuma vir ao museu.” Em cerca de cinco anos, a instituição viu o número de visitantes saltar de cerca de 300 mil para 500 mil ao ano.