O direito imobiliário é um dos ramos mais envolventes por ser muito dinâmico e, principalmente, por ter reflexos práticos que atingem o cotidiano de toda a sociedade. Nesse cenário, é inevitável que vários assuntos importantes para o mercado imobiliário sejam julgados pelo nosso Supremo Tribunal Federal – STF.

Dessa maneira, no ano de 2018 alguns ministros do STF, em especial da 1ª Turma, começaram a remexer e julgar um assunto extremamente delicado, que trata da penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação. Ao longo do ano de 2019, 2020 e já no início de 2021, apareceram ainda mais julgados sobre o tema, decidindo no sentido que é impenhorável o bem de família do fiador em contratos de locação comercial.

Acontece que esse assunto já foi decidido e consolidado pelo próprio STF no ano de 2010, em sede de repercussão geral (quando a decisão do STF vale para todos os casos e processos semelhantes), afirmando que é constitucional a penhora de bem de família pertencente a fiador de contrato de locação.

Agora, tendo em vista esses novos julgados na direção oposta do que já foi definido anteriormente, o STF deve decidir se esse tema deve ser julgado novamente pelo plenário, mais uma vez com carimbo de repercussão geral.

Assim, ao voltar a discutir esse assunto, a Suprema Corte brasileira traz uma insegurança jurídica imensurável não só pela questão de direito, como também na questão econômica e mercadológica do setor imobiliário, principalmente no campo das locações.

Importante destacar que a fiança é única modalidade de garantia gratuita prevista na lei de locações, de modo que, outros tipos de garantia causam um aumento no custo do contrato. Ainda, em recente pesquisa realizada em nível nacional, envolvendo aproximadamente 20.000 contratos de locação, constatou-se que dentre os contratos com valor médio de R$3.377,00, 78% deles eram garantidos

por fiadores e dentre esses, mais de 90% contam com os sócios na condição de garantidor da relação locatícia.

A conclusão que se pode tirar do estudo é no sentido de que a fiança, como garantia, está ligada com a intenção de diminuir os custos da empresa em relação ao contrato de locação, direcionando os recursos para o desenvolvimento da própria atividade empresarial.

Na prática, o locador de imóvel comercial, sabendo do entendimento consolidado pelo STF em 2010 e que que aceitou ter como fiador, o próprio dono da empresa inquilina, sabendo que sócio possui um imóvel considerado bem de família, corre o risco de ter sua garantia esvaziada. Ainda, nas novas locações, a tendência é de que os locadores não aceitem a fiança como garantia, considerando a insegurança jurídica causada pelo STF.

O fato é que, no fim das contas, ninguém ganha com isso, tanto o locatário/inquilino quanto o locador, perdem. De um lado, caso seja afastada a penhora do bem de família do fiador, essa modalidade de garantia não será mais aceita pelos locadores, bem como nos contratos em curso exigirão a substituição por garantias onerosas. De outro lado, diversos locatários e candidatos a se tornarem locatários, que com certeza prefeririam usar a fiança para garantirem seus próprios negócios, levando em consideração que é a única modalidade de garantia gratuita, serão prejudicados com um aumento no custo da locação em razão da necessidade de garantir o contrato com outra modalidade de garantia.

João Guilherme Stoppa, advogado e membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB Londrina.