Imagine a seguinte situação: uma fazenda foi vendida em sete prestações e entregue ao comprador após o pagamento da primeira parcela.

O comprador, por sua vez, deixou de pagar as demais parcelas do preço.

Diante da inadimplência, o vendedor notificou extrajudicialmente o comprador inadimplente, que deixou decorrer o prazo sem a quitação da dívida.

A partir daí, com base no contrato de compra e venda – que continha cláusula resolutiva expressa – o vendedor promoveu a imediata resolução contratual, de forma extrajudicial.

Diante deste cenário, poderia ou não o vendedor promover a resolução contratual de forma “automática”?

Foi exatamente no julgamento deste caso concreto que a Quarta Turma do STJ decidiu que a existência de cláusula, com previsão expressa de resolução contratual por falta de pagamento, autoriza o ajuizamento de ação possessória, sem a necessidade de outra ação judicial, prévia ou concomitante, para rescindir o negócio de compra e venda de imóvel.

Em outras palavras, a dispensa do ajuizamento de ação judicial para viabilizar a resolução do contrato permite ao credor - vendedor no caso acima exemplificado - promover a imediata e direta resolução do contrato, tornando-a mais célere.

O entendimento consagrado pela recente decisão do STJ, alterando o entendimento jurisprudencial até então prevalecente, autoriza o contratante ao rompimento imediato do vínculo contratual em caso de inadimplência, em prestígio ao princípios da autonomia da vontade e da não intervenção do estado nas relações privadas.

Embora a previsão expressa do artigo 474, do Código Civil já dispense a via judicial quando existente cláusula resolutiva expressa, o STJ considerava imprescindível a prévia manifestação judicial para que fosse consumada a resolução do compromisso de compra e venda do imóvel, em prestígio ao princípio da boa-fé objetiva.

Contudo, o novo posicionamento do STJ se baseia no fato de que “a lei não determina que o compromisso de compra e venda deva, em todo e qualquer caso, ser resolvido judicialmente; pelo contrário, admite expressamente o desfazimento de modo extrajudicial, exigindo, apenas, a constituição em mora ex persona e o decurso do prazo legal conferido ao compromissário comprador para purgar sua mora".

O novo entendimento está também em consonância com o enunciado nº 436 da V Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal que prevê: “A cláusula resolutiva expressa produz efeitos extintivos independentemente de pronunciamento judicial.”

Ao devedor subsiste a alternativa da via judicial para pleitear a manutenção do contrato, a restituição de valores pagos ou devolução da coisa entregue, que não terá efeito desconstitutivo do contrato, mas meramente declaratório da relação já extinta por força do próprio contrato.

A solução proposta pela Quarta Turma do STJ mostra-se mais harmônica com as expectativas da sociedade em relação à mínima intervenção estatal no mercado e nas relações particulares e acarretará certamente uma redução de demandas judiciais, na medida em que não mais será necessário o ajuizamento de ação para resolução contratual quando existir cláusula com previsão expressa de resolução contratual por falta de pagamento.

Marcela Rocha Scalassara. Advogada e membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB Londrina.

A opinião da autora não reflete, necessariamente, a opinião da FOLHA.

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