Da usucapião extrajudicial
Esforços do legislador para tornar o direito acessível aos cidadãos são elogiáveis. E, a usucapião extrajudicial reflete isso. O Código de Processo Civil incluiu o art. 216-A à Lei 6.015/1973 e deu ao cidadão o direito de escolher se recorrerá ao Judiciário ou se utilizará as serventias de Notas e de Registro de Imóveis para a aquisição da propriedade pela usucapião.

A usucapião é uma figura jurídica sedimentada pelo Código Civil e teve as suas modalidades ampliadas pela Constituição Federal de 1988, Estatuto das Cidades e também pela Lei 13.465/2017 que tratou da regularização fundiária.

O referido art. 216-A permite que a usucapião seja obtida por meio de ata lavrada pelo notário que atestará, via solicitação do possuidor/interessado, a posse qualificada, ou seja: aquela dotada dos elementos essenciais como tempo de posse e o seu exercício como dono da coisa imóvel urbana ou rural, somando-se os outros elementos legais peculiares a cada tipo de usucapião.

A escolha do tabelião é livre. Mas, se necessária a realização de diligências no local do imóvel, a ata será lavrada pelo tabelião da comarca de situação do imóvel.

O interessado apresentará ao registrador de imóveis requerimento subscrito por advogado (cuja presença é indispensável), a Ata Notarial, planta e memorial descritivo do imóvel com a anuência dos donos e titulares de direitos reais sobre o próprio imóvel e também dos imóveis vizinhos, certidões negativas de distribuições da comarca de situação do imóvel e do domicílio do possuidor e também justo título e/ou documentos que qualifiquem a posse.

Apresentada a documentação, haverá uma prenotação e a devida autuação dos documentos. O Registrador notificará o dono e titulares de direitos do imóvel ou vizinhos ainda não notificados, e via edital se não encontrados, e os entes públicos – União, Estado e Município. Promoverá, ainda, a publicação de edital em jornal de circulação para ciência de terceiros eventualmente interessados, sempre com 15 dias úteis para manifestação.

O silêncio, inclusive do dono e titulares de direitos sobre o imóvel, implicará na concordância ao pedido da usucapião, segundo recente Lei 13.465/2017. Se impugnado o pedido, o processo será remetido para uma vara competente para o processamento da usucapião judicial.

O que seria o justo título? Um recibo de sinal de negócio, um formal de partilha de direitos, uma carta de reserva, um compromisso, uma cessão que por alguma razão não originaram título para aquisição definitiva, mas que serviram para a consideração da existência da posse contínua, não contestada e com ânimo de dono.

O registrador poderá realizar diligências para obter o seu convencimento ou mesmo promover audiência de justificação administrativa.

Ele acatará o pedido e registrará a usucapião na matrícula do imóvel ou naquela a ser aberta, ou rejeitará o pedido, sempre fundamentando as suas razões. Na última hipótese, suscitará dúvida ao juiz corregedor competente. O interessado também poderá suscitar dúvida inversa se discordar das diligências solicitadas.

De fato, abriu-se uma oportunidade para que esferas de aplicação do direito auxiliem no atendimento aos direitos dos cidadãos, o que é desafiador e merece ser abraçado de forma séria e corajosa por todos os envolvidos.

Ana Lúcia Arruda dos Santos Silveira, advogada e coordenadora da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB de Londrina