Praticamente todos os Contratos de Locação, sejam residenciais ou comerciais, preveem uma cláusula de reajuste periódico do valor dos aluguéis, normalmente anual. Este reajuste pode ser baseado em um dos muitos índices de correção monetária calculados por institutos e órgãos (IGPM, IPCA, INPC, IGP-DI etc.), em uma taxa específica prevista pelos contratantes ou até mesmo em uma soma dessas duas possibilidades.

No entanto, praticamente tão comum quanto a previsão contratual do direito de reajuste dos aluguéis é o seu não exercício. Seja por mera negligência, por acordo entre os contratantes (formal ou informal) ou por outros motivos – como a alta concorrência de oferta de imóveis para aluguel –, os locadores deixam de exigir a atualização periódica dos aluguéis e acabam aceitando receber o valor original do aluguel por anos.

Nesses casos, a prática traz algumas perguntas: o locador pode voltar a exigir a atualização do aluguel e, em caso positivo, exigir a atualização acumulada de todo o período não corrigido? Mais que isso, o locador pode cobrar do locatário a diferença acumulada não paga pelo locatário?

Respondendo a estas perguntas, recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (3ª Turma) decidiu uma interessante situação envolvendo a gigante do varejo Havan e um Shopping Center de Maringá (PR).

No caso (REsp 1.803.278), a varejista, na condição de locatária do imóvel comercial localizado no Shopping, promoveu ação judicial com a finalidade de impedir o reajuste do valor do aluguel em mais de 50% (cinquenta por cento), do qual havia sido notificada pelo locador.

Tamanho reajuste seria devido em razão do longo tempo que os aluguéis ficaram sem qualquer atualização. Além de pleitear o novo e atualizado valor, o locador pretendia promover a cobrança de uma dívida referente a todas as atualizações anuais que a locatária deixou de pagar, pois se manteve pagando o valor original do aluguel por anos.

O argumento principal da locatária para impedir a atualização e também a cobrança era o chamado princípio da “supressio”, que significa a supressão (perda) de um direito em razão do seu não exercício pelo seu titular no curso da relação contratual.

A decisão do Tribunal Superior foi no sentido de que o fato de o locador não exercer o direito de aumento dos aluguéis não gera a legítima expectativa de que este direito não seria mais exercido.

Em outras palavras, não pode haver supressão (perda) de um direito que se renova periodicamente pelo simples fato de ele não ter sido exercido no passado. Dentre outras situações, isso se aplica também à hipótese de o locador aceitar receber os aluguéis de forma diversa da prevista no contrato de locação por um período (por exemplo, receber em dinheiro quando o contrato prevê depósito em conta) ou ao caso de o locador deixar de cobrar multa e juros pelo atraso de um ou mais aluguéis.

A tolerância, nesses casos, não gera ao locatário o direito de exigir tais situações, modificando obrigações contratuais.

Todavia, o recebimento dos aluguéis sem atualização, especialmente quando expresso por escrito (por exemplo, mediante recibo de quitação), gera a expectativa legítima de que, naquele período, não haveria atualização. Assim, não pode o locador exigir o pagamento do reajuste de forma retroativa, incidente sobre prestações já quitadas.

Foi exatamente o que decidiu o STJ, manifestando que, após longo período de inércia, o locador não poderia cobrar os reajustes retroativos, mas poderia exigir o reajuste nas parcelas futuras.

GABRIEL CARMONA BAPTISTA. Advogado e Vice-presidente da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB, Subseção Londrina (PR).