No cenário dinâmico do mercado imobiliário, apesar de corriqueira a prática de compra de imóveis na planta, merecem especial atenção os detalhes legais dos contratos celebrados entre construtoras e adquirentes.

Uma prática que tem suscitado muitos debates jurídicos é a cobrança de reajuste mensal em contratos de compra e venda de imóveis na planta, considerada ilegal à luz do artigo 46 da Lei 10.931/04.

Esta lei prevê que as construtoras e incorporadoras só podem exigir correção monetária mensal nos contratos de comercialização de imóveis caso o prazo do contrato seja igual ou superior a 36 meses.

Ou seja, em contratos de compra e venda de imóvel com duração inferior aos 36 meses, a correção pelo INCC só pode ocorrer de forma anual.

Tal proibição visa proteger o adquirente, assegurando um ambiente mais equilibrado e previsível nas relações contratuais.

Contudo, para burlar a determinação legal, as construtoras e incorporadoras “maliciosamente” incluem parcelas simbólicas, de valores irrisórios, de modo a inflar de forma artificial o prazo contratual e possibilitar a incidência do reajuste mensal.

Isso é facilmente verificado pelo acréscimo de parcelas de baixo valor (R$ 100,00 ou R$ 1.000,00, por exemplo), com vencimento normalmente após o término do pagamento das demais parcelas do imóvel, apenas para que “no papel” o contrato tenha prazo igual ou superior a 36 meses, de forma a possibilitar – de forma indevida - o reajuste mensal.

Em outras palavras, formalmente o contrato fica com prazo igual ou superior a 36 meses apenas para que a construtora possa cobrar o reajuste mensal, conduta considerada ilegal.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem sólido entendimento no sentido de que a cobrança de reajustes mensais em contratos de compra e venda de imóveis na planta, em afronta ao artigo 46 da Lei 10.931/04, é ilegal e passível de revisão judicial.

Os Tribunais de Justiça do Paraná e de São Paulo possuem entendimento favorável ao consumidor, reconhecendo que são ilegais tanto a inclusão de parcelas para estender o prazo contratual, quanto o reajuste mensal, determinando a devolução em dobro de valores pagos indevidamente.

Mas mesmo que o comprador tenha concordado e assinado o contrato com tal disposição tem o direito de exigir a restituição dos valores pagos a maior?

Sim, como se está diante de um contrato de adesão, é possível o questionamento de tais disposições, que devem ser interpretadas em favor da parte vulnerável da relação contratual, no caso, o comprador (consumidor).

Assim, consumidores, pessoas físicas ou jurídicas, que tenham comprado imóveis na planta, em que o pagamento da última parcela tenha ocorrido há menos de 3 anos, podem exigir a restituição das diferenças pagas.

O Código de Defesa do Consumidor assegura, ainda, que a devolução do valor pago indevidamente seja feita em dobro, conforme dispõe o parágrafo único, do art. 42.

Diante desse contexto, é aconselhável que os compradores estejam atentos às cláusulas contratuais e busquem assessoria jurídica especializada para assegurar o direito de exigir a restituição das diferenças pagas.

Marcela Rocha Scalassara. Advogada e membro da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB Londrina.