Seis em cada dez professores do país avaliam que os alunos estão mais violentos desde que retornaram às aulas presenciais, após terem ficado dois anos em atividades remotas por causa da pandemia. Para 97,9% dos educadores, o aumento da agressividade atrapalha o aprendizado. Os dados são de uma pesquisa feita pela Nova Escola, organização social que atua para apoiar professores da educação básica.

Seis em cada dez professores do país avaliam que os alunos estão mais violentos desde que retornaram às aulas presenciais
Seis em cada dez professores do país avaliam que os alunos estão mais violentos desde que retornaram às aulas presenciais | Foto: iStock

O levantamento foi realizado de forma on-line com 5.305 educadores de todas as regiões brasileiras entre os dias 8 e 22 de julho. Participaram profissionais da educação básica (do infantil ao ensino médio) das redes pública e privada.

Dos entrevistados, 65,8% responderam que os alunos estão mais violentos neste ano, sendo que 22,9% disseram que os casos de violência acontecem mais de uma vez por semana na escola em que atuam. Outros 23,4% afirmam que acontece mais de um caso por mês.

Entre os principais motivos apontados pelos professores para a agressividade dos estudantes estão o aumento de doenças psicológicas por conta do isolamento nesse período (50,6%) e o agravamento da vulnerabilidade das famílias durante a pandemia (46%). Eles também apontam que o problema é resultado da pouca socialização dos alunos nos últimos dois anos (40,5%) e da falta de ações disciplinares para coibir a violência nas escolas (24,7%).

"A pandemia teve consequências negativas para toda a sociedade, mas as crianças e adolescentes sofreram mais por ter menos amadurecimento. Não é que elas ficaram dois anos sem ir para a escola e perderam só conteúdos escolares, elas perderam dois anos de convivência social em um ambiente que é fundamental para o seu desenvolvimento", diz Ana Ligia Scachetti, diretora da Nova Escola.

A pesquisa ainda mostra que 51% dos professores nunca receberam orientação das secretarias de educação para lidar com os casos de violência nas escolas. Para Scachetti, o número mostra como a responsabilidade para lidar com a maior agressividade tem recaído apenas sobre os docentes. "É um problema que precisa ser tratado por toda a comunidade escolar, pelas famílias, a direção da escola, as secretarias de educação. Todo mundo precisa ser envolvido, já que os problemas que entram na sala de aula não nascem ali dentro."

A psicóloga Patricia Ansarah afirma que o ser humano é relacional e precisa criar vínculos, no entanto, quando há essa volta para as escolas no pós-pandemia, dois anos depois, tudo está muito diferente e as pessoas já não se conhecem mais. “Os vínculos foram rompidos e, de repente, tudo voltou de uma forma desconhecida. Os professores também voltam para um outro ambiente, com novo formato de trabalho, ao mesmo tempo em que vivem seus contextos com muita apreensão e muita insegurança.”

Ela ressaltou que a ansiedade se tornou um transtorno patológico em que as pessoas vivem esse momento de muito medo e de preocupações em excesso, que está impactando as relações. Ela ressaltou que os vínculos foram fragilizados e deixaram um ambiente em que o medo está prevalecendo. “No caso dos professores, muitos sofrem síndrome de burnout, porque os alunos ficaram com déficit de aprendizado, e é feita uma cobrança para tentar tirar esse atraso gerado pela pandemia." Ela explicou que o burnout é o esgotamento físico, mental e emocional, e no momento atual não só os adultos estão desenvolvendo esta síndrome de burnout, mas as crianças também.

A ansiedade, a insegurança e esse medo são expressas nas micro violências como o bullying, na formação de panelinhas ou de desrespeito ao professor e com o professor desrespeitando os alunos, e todo mundo fica totalmente exausto. "É preciso definir esses acordos de convivência. Essas micro violências acabam ganhando uma dimensão maior e isso pode ter uma escalada perigosa dentro da sala de aula."

O diretor de Educação da Seed-PR ( Secretaria da Educação e do Esporte do Paraná), Roni Miranda, afirma que não teve contato com essa pesquisa, mas teve acesso a outros estudos correlatos. “Eu tive acesso a uma pesquisa da Fundação Lehmann. Isso é muito atrelado ao fato dos estudantes terem ficado reclusos quando a escola ficou muito tempo fechada. A questão da parte emocional do estudante estaria sendo afetada por esse isolamento. Faz parte do desenvolvimento do indivíduo essa interação com o outro, com o colega, com as suas diferenças”, destaca.

“Estamos em uma sociedade mais violenta, mais intolerante e o que ocorre dentro da escola reflete o que acontece fora dos muros. A gente tem que trabalhar essa parte de emocional de estudante, inclusive com o projeto de vida, o qual é um componente do ensino médio."

Miranda ressalta que a escola em tempo integral desenvolve essas habilidades. "Estou na rede estadual desde 2005. Fui professor em sala de aula, diretor de escola e sempre teve violência na escola. Realmente aumentou em algumas regiões, em alguns locais, e a gente tem trabalhado, principalmente com a ampliação da escola em tempo integral." O Paraná tem mais de 230 escolas em tempo integral contra 40 na época em que ele assumiu.

Já a secretária municipal de Educação de Londrina, Maria Thereza Paschoal de Moraes, afirma que não viu um aumento de violência fora da curva no município. "A gente não tem registro de aumento de casos que a gente teve de intervir, fora os casos normais de indisciplina e de bagunça das crianças, nos quais a gente faz a intervenção com psicólogos, professores mediadores e círculos de diálogo." (Com Folhapress)

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