Urna indígena com ossada quase causou rebelião em delegacia no Norte Pioneiro
Achado arqueológico dos anos 1970, em São José da Boa Vista, foi confundido com cena de crime; artefato está preservado em museu de Paranaguá
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terça-feira, 17 de junho de 2025
Achado arqueológico dos anos 1970, em São José da Boa Vista, foi confundido com cena de crime; artefato está preservado em museu de Paranaguá
Celso Felizardo

Um episódio inusitado ocorrido em 1973, no Norte Pioneiro, é descrito pelo arqueólogo Igor Chmyz em uma de suas obras. A descoberta de uma urna indígena com ossos humanos em São José da Boa Vista quase provocou uma rebelião na delegacia da cidade vizinha Wenceslau Braz.
A história começou quando agricultores da zona rural de São José da Boa Vista encontraram duas urnas cerâmicas indígenas em meio à terra vermelha de uma lavoura. Uma delas continha fragmentos ósseos e foi levada para a delegacia de Wenceslau Braz por suspeita de crime. A presença do artefato no local rapidamente gerou boatos. Com medo de “assombração indígena”, como diziam à época, os presos da carceragem ameaçaram uma rebelião caso a ossada não fosse imediatamente retirada.
As urnas haviam sido impactadas pelo arado e, como havia ossos humanos no seu interior foram levadas para a delegacia do município, onde um inquérito policial foi instaurado, pela suspeita de crime, fato que gerou grande insatisfação inclusive entre os detentos, que exigiram que a urna permanecesse do lado de fora da delegacia. No entanto, após esclarecimentos do professor Joaquim Gil, historiador do município de Wenceslau Braz, a peça arqueológica foi guardada e o inquérito policial encerrado
Igor Chmyz - arqueólogo
Na memória dos moradores
Depois de mais de 50 anos, o ocorrido ainda permanece na memória dos moradores de Wenceslau Braz. Nas redes sociais, há relatos de que a chegada da urna foi um acontecimento tão grande, pela curiosidade da população, que parecia que alguém muito importante estava visitando a cidade.

Foi o historiador local Joaquim Gil quem interveio, explicando que o material era de origem arqueológica e fazia parte de um sítio indígena milenar. O caso ganhou atenção da equipe do arqueólogo Igor Chmyz, que já atuava no mapeamento de áreas arqueológicas na região do Vale do Rio Itararé, que compreende municípios como São José da Boa Vista e Wenceslau Braz.
Preservação
A ossada e os fragmentos de cerâmica foram levados a Curitiba e, posteriormente, integraram o acervo do Museu Paranaense. Atualmente, estão preservados no Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade Federal do Paraná, com exposição em Paranaguá, dedicada à cultura indígena pré-colonial no território paranaense.
Igor Chmyz, que recentemente recebeu o título de Cidadão Benemérito do Paraná, foi responsável por identificar e registrar dezenas de sítios arqueológicos em todo o Estado. A atuação no Norte Pioneiro, em especial no Vale do Rio Itararé, ajudou a ampliar o conhecimento sobre a ocupação indígena antes da chegada dos colonizadores europeus.

