No ano em que pela primeira vez o índice geral de pretos e pardos matriculados em instituições de ensino superior públicas superou os 50%, a UEM (Universidade Estadual de Maringá) é mais uma a adotar o sistema. Com 98 votos favoráveis, quatro contrários e sete abstenções, o Conselho de Pesquisa, Ensino e Extensão aprovou a adoção das cotas raciais como mais uma modalidade de ingresso na instituição de ensino para a partir do ano que vem.

A decisão foi amplamente comemorada por professores, alunos, servidores e militantes do movimento negro que acompanharam por cerca de três horas o debate no Auditório do Departamento de Economia da Universidade. Assim como a UEL (Universidade Estadual de Londrina), a UEM conta com um Neiab (Núcleo de Estudos Interdisciplinares Afro-Brasileiros), que desde a criação, há 13 anos, lutava pela retomada deste debate. Desde julho do ano passado, o Coletivo Yalodê-Badá e o Neiab intensificaram a mobilização e apresentaram na reitoria da universidade um abaixo-assinado com mais de 3 mil assinaturas pedindo cotas raciais.

Decisão foi confirmada em debate no Auditório do Departamento de Economia da UEM
Decisão foi confirmada em debate no Auditório do Departamento de Economia da UEM | Foto: Divulgação/Assessoria de Comunicação/UEM

Para a coordenadora do Neiab e professora do Departamento de Ciências Sociais da UEM, Marivânia Araújo, a tarde desta quarta-feira (20), Dia da Consciência Negra, foi um dia histórico no campus, uma vez que esta era uma “situação devida e necessária à universidade”. “Uma das características da população negra é a persistência e fomos bastante persistentes. As cotas são necessárias para a população e também para a universidade, pois a universidade precisa refletir a sociedade, que tem 54% da população negra”, disse.

Com a decisão, 20% das vagas serão destinadas para a população preta e parda, sendo que 75% destas vagas serão ocupadas por alunos oriundos de escolas públicas e 25% por estudantes de qualquer percurso escolar. A UEM já contava com cotas sociais que reservavam 20% das cerca de 1,6 mil vagas por vestibular para alunos de baixa renda, o que foi um dos argumentos contrários à implantação das cotas raciais, uma vez que muitos alunos negros já estariam contemplados.

No entanto, segundo a Comissão de Vestibular Unificado da UEM, no vestibular de inverno 2019 apenas 16,94% dos candidatos se autodeclararam negros. Já no vestibular de verão 2018, este índice foi de 19,21%.

De acordo com a professora, os argumentos de que a universidade apresentaria queda na qualidade a partir da adoção foram facilmente combatidos com dados da própria UEL (Universidade Estadual de Londrina), uma das instituições públicas brasileiras cuja política de ação afirmativa está mais consolidada. “Uma das vantagens da UEM ter sido uma das últimas a implantar foi que pudemos apresentar dados de universidades que já têm, como a UEL. Quando a UEL entrou nessa luta, a resistência era muito maior. Embora aqui tenha um grupo de pessoas contrário, houve também um que percebeu que a em algum momento a UEM teria que ter também”, avaliou Araújo.

Questionado se o novo sistema já será adotado já no próximo vestibular, marcado para os dias 8 e 9 de dezembro e que ofertará 1.519 vagas ao todo, o vice-reitor da UEM, Ricardo Dias Silva, explicou que não. Mas que deverá ser implantado no processo seletivo 2020. “Vamos esperar o fim do prazo recursal e nesta quinta-feira (21) teremos a resolução publicada. Em seguida encaminharemos para a Comissão de Vestibular Unificado. Legalmente, a possibilidade de alguém entrar com recursos existe e, de fato, tem que haver o respeito à legislação. Não acredito que alguém o fará porque a resolução foi amplamente debatida, o processo foi longo, mas é preciso respeitar o prazo recursal”, avaliou.

Na UEL, Dia da Consciência Negra foi celebrado com debates

Enquanto em Maringá os primeiros passos da ação afirmativa foram dados, em Londrina o Dia da Consciência Negra foi marcado por um debate sobre os desafios de uma educação mais democrática. Durante a manhã, estudantes, servidores e professores da UEL (Universidade Estadual de Londrina) participaram de uma mesa de abertura no Anfiteatro Maior do Centro de Ciências Humanas.

Excepcionalmente neste ano não houve o feriado na UEL por conta das mudanças no calendário letivo. Mesmo assim, debates e rodas de conversa foram realizados até à noite.

Segundo o reitor Sério Carvalho, o sucesso da política de cotas raciais na UEL podia ser visto ali mesmo, na plateia do evento, "com a sociedade como ela é, formada pelas mais diferentes cores", disse. Participaram do debate a coordenadora do Neab (Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros) e docente Maria Nilza da Silva, a coordenadora da Educação das Relações da Diversidade Étnico-Racial e Educação Escolar Quilombola, da Secretaria de Estado da Educação (SEED), Edna Coqueiro, a presidente do Conselho Municipal da Igualdade Racial, Maria Eugênia de Almeida Pinto, a coordenadora-geral do evento, Marleide Perrude, a ex-reitora da UEL, Lygia Pupatto, e o chefe de gabinete da Prefeitura Municipal de Londrina, José Antônio Tadeu Felismino.

No período noturno, a programação contaria também com as presenças do coordenador do Núcleo de Apoio ao Discente e ao Docente (NADD), Adriano Luiz da Costa Farinasso, do professor do Departamento de História da UEL, Jairo Queiroz Pacheco, do representante do Coletivo Pró-Cotas, Eduardo Baroni Borghi, além de Thaiza de Oliveira, da Unopar, e os estudantes egressos da UEL, Nikolas Gustavo Pallisser Silva e Mariana Panta.