STF decide se acaba com a farra do boi
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segunda-feira, 31 de março de 1997
Agência Estado, de Brasília
A farra do boi, uma das mais tradicionais e polêmicas festas de Santa Catarina, pode estar com os dias contados. O Supremo Tribunal Federal (STF) julga, até a próxima semana, uma ação de quatro entidades de proteção aos animais que querem o fim da brincadeira.
Ontem, a artista plástica Maria Cristina de Oliveira, que teve sua casa invadida no final de semana, em Florianópolis (Santa Catarina), por um boi de 500 quilos e centenas de pessoas, esteve no Supremo Tribunal Federal reforçando o pedido das entidades de proteção. Nos últimos anos, a farra não só se tornou uma violência contra os animais, mas, também, contra as pessoas.
Alguma coisa tem de mudar, não se pode mais fazer este tipo de violência em nome da tradição, disse a artista plástica, que chora todas as vezes que relembra o drama que passou no final desta semana.
Era um boi acuado dentro de minha casa e centenas de pessoas depredando tudo, relembra Cristina, uma das poucas pessoas que estavam em casa e não saíram feridas. Se tudo é tradição, então os japoneses teriam que voltar a praticar o harakiri, que também é tradição naquele país, disse.
O julgamento da farra do boi foi transferido de hoje para a outra semana, mas a tendência é que a maioria dos quatro ministros que fazem parte da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal acompanhe o voto do relator, o ex-ministro Francisco Rezek, atualmente integrante da Corte Internacional de Haia.
Pouco antes de ser designado para a Corte de Haia, Rezek votou pelo fim da farra, considerando que ela fere o artigo 225 da Constituição, que proíbe práticas que submetam os animais a crueldade.
Francisco Rezek disse em seu voto, anunciado em fevereiro deste ano, que esperou por muito tempo antes de se decidir sobre o caso, na esperança que as autoridades catarinenses tomassem providências. Como isso não aconteceu, ele votou contrariamente à brincadeira, alegando que, a cada ano, ela se torna mais violenta.
Neste fim de semana, centenas de pessoas invadiram a casa de Maria Cristina de Oliveira perseguindo um boi de cerca de 500 quilos. A turma, segundo o marido de Cristina, o engenheiro César Seara Júnior, continuou perseguindo o animal depois que ele deixou sua casa e entrou numa lagoa. De acordo com o engenheiro, eles cortaram os cascos do boi para impedí-lo de correr, lhe impuseram maus-tratos com um mourão de cerca e foram embora arrastando-o pelas ruas.
A decisão final sobre a farra do boi será tomada pelos ministros Néri da Silveira, Carlos Velloso, Marco Aurélio e Maurício Corrêa.

