Só oito cidades vão atravessar um século no “G-20”, aponta Ipardes
Metamorfose urbana desde o censo de 1950 arrastou nomes que eram destaque no mapa do Paraná para o ostracismo e 12 novas protagonistas estarão em cena
PUBLICAÇÃO
segunda-feira, 06 de janeiro de 2025
Metamorfose urbana desde o censo de 1950 arrastou nomes que eram destaque no mapa do Paraná para o ostracismo e 12 novas protagonistas estarão em cena
Lúcio Flávio Moura - Especial para a FOLHA

O Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social divulgou em dezembro a população projetada para os 399 municípios do Estado em 2050 e movimentou as conversas em muitas rodas de “demógrafos amadores” do rio Paraná ao Oceano Atlântico, das barrancas do Iguaçu às represas do Paranapanema.
Além de todas as considerações menos surpreendentes como a concentração dos municípios mais populosos no colar metropolitano de Curitiba, da constatação de que Londrina continuará sendo o município paranaense surgido no século XX com mais moradores nas próximas gerações, do vertiginoso crescimento de Cascavel e Toledo, os dados escancaram a metamorfose profunda que o mapa do Paraná vai demonstrar na celebração do seu bicentenário em 2053.

No centenário, comemorado com pompa e circunstância na capital, a realidade era outra, com a face ocidental do Estado ainda em processo de antropização. Havia excitação e curiosidade naquela Curitiba, de 200 mil moradores e naquele Estado ainda em processo de colonização: onde tanto progresso iria nos levar?
Se no bicentenário, a previsão é que o Paraná já esteja na curva demográfica descendente (o pico de 12,46 milhões será atingido em 2044) mas ainda entre os cinco estados mais populosos, naquele período o Paraná figurava na 9ª colocação, com uma população de 2,1 milhões, pouco mais da metade do número de habitantes do Rio Grande do Sul.

O desfile cívico triunfal na Avenida XV de Novembro, a Exposição Internacional do Café e a chamada Feira de Curitiba, com grandes pavilhões instalados em uma área baldia do Tarumã (onde hoje estão o Colégio Militar e o conhecido ginásio poliesportivo), impressionaram o presidente Getúlio Vargas, menos de um ano antes do seu suicídio.
No banquete oferecido pelo governador Bento Munhoz da Rocha ao presidente, Vargas fez um discurso descrevendo o momento brilhante da economia paranaense e resumindo o clima de euforia da efeméride: “O Paraná é um espelho de otimismo e de esperança, em que vemos engrandecida e venturosa a imagem da Pátria. Guardarei para as horas do meu labor devotado ao País e aos seus problemas, as exultantes impressões destes dias de festa, vividos onde a vida se mostra tão promissora e ao calor de uma hospitalidade que profundamente me comove. Fortaleço-me no vosso exemplo. A lição do Paraná reacende a fala da nossa fé inabalável nos destinos do Brasil”.
No Paraná de 2050, as grandes cidades do interior estarão espalhadas por todas as regiões, conforme a projeção do Ipardes. No grupo dos 20 municípios mais populosos, usando uma divisão regional histórica e já extinta, sete são do Norte Novo, quatro do Norte Novíssimo, quatro do Oeste, duas do Sudoeste, duas dos Campos Gerais e uma do Centro.

Bem diferente do G-20 do Censo de 1950, nove municípios estavam na face oriental do Estado - quatro nos Campos Gerais, três no Norte Pioneiro e dois no Sul. O Norte Novo já tinha sete municípios na elite. Contudo, as potências do Oeste e Sudoeste ainda estavam em gestação ou incipientes. Da lista, a hoje discreta Clevelândia, na divisa com Santa Catarina, era o ponto mais a oeste no mapa da elite.
Outra presença curiosa na lista é a líder Mandaguari, município do qual Maringá se desmembraria em 1951. Três anos antes do Censo de 1950, Mandaguari conseguiria sua autonomia em relação ao município de Apucarana, englobando uma área de 14 mil quilômetros quadrados, que era banhado pelos rios Paranapanema, Ivaí, Paraná e Pirapó. A população de mais de 100 mil habitantes estava espalhada por muitos distritos e a sede tinha apenas a sexta parte deste total.
Em 2050, provavelmente o município de Mandaguari terá mantido seus atuais 335 quilômetros quadrados, área cerca de 40 vezes menor do que 100 anos antes, com uma população projetada de pouco mais de 40 mil habitantes (35º maior do interior).
Além de Mandaguari, outros municípios que estavam na elite do interior em 1950 sofrerão queda populacional pela projeção do Ipardes, algumas igualmente significativa, como Clevelândia (54.838 para 9.540), que abrangia a área onde hoje está Pato Branco; também estão neste rol Cornélio Procópio (56.826 para 35.526), Pitanga (55.463 para 30.003), Jaguapitã (39.658 para 21.135) e Sertanópolis (36.467 para 14.308).
Governador pé-quente
Umuarama é o único município que figura no G-20 da projeção de 2050 que ainda não existia nos festejos do Centenário do Estado em 1953. Expoente do Noroeste, sua emancipação só foi efetivada em 1955.

Outra curiosidade é que o engenheiro, professor e escritor parnanguara Bento Munhoz da Rocha Neto (1905-1973), além de ser o governador do centenário, do Centro Cívico, da Biblioteca Pública do Paraná e do Teatro Guaíra, sancionou as leis da criação de 10 municípios que devem estar na elite do interior no bicentenário: Maringá, Cascavel e Paranavaí (1951), Toledo, Francisco Beltrão,Pato Branco, Medianeira e Mandaguaçu (1952), além de Cianorte (1953).
Para professor, localização explica solidez das cidades
A Folha ouviu um pesquisador de Geografia Urbana, o professor do Departamento de Geociências da UEL, Fábio Cunha, doutor em Desenvolvimento Regional e Metropolização, para avaliar as mudanças previstas no Estado no intervalo entre 1950 e 2050. Confira abaixo:
A demografia paranaense tem algumas características peculiares?
Antes de tudo, é importante frisar que as estimativas são importantes instrumentos para o planejamento, porém, elas podem sofrer interferências geográficas de ordem natural, política, econômica e serem alteradas com o tempo. Por exemplo, até a década de 1920, o norte paranaense era uma vasta região natural que não despertava interesses, porém, são essas mesmas condições naturais, uma exuberante mata pluvial, derivada de um solo extremamente fértil, que vai fazer com que na região de Londrina, Maringá, Cianorte e Umuarama tenhamos o maior empreendimento imobiliário até então do país com o loteamento implementado pelos ingleses, pela Cia de Terras Norte do Paraná. Essas quatro cidades foram escolhidas pela própria companhia, uma decisão técnica, por se distanciarem cerca de 100 quilômetros dentro dos limites da companhia, para serem os principais centros de tal empreendimento. Londrina, por ser a primeira na marcha para o oeste, acabou recebendo mais investimentos, infraestrutura, o que deu a ela maiores vantagens sobre outras localidades. Neste mesmo processo, a fertilidade do solo e a economia cafeeira, fez com que um vasto contingente populacional se dirigisse para essa região gerando a formação de uma densa rede urbana no terceiro planalto paranaense.
Depois o ritmo de crescimento foi se estabilizando. Qual foi a razão?
Nas décadas de 1960 e 1970, mudanças institucionais como o estatuto do trabalhador rural e as geadas colaboraram para o fim da cafeicultura e uma mudança expressiva do uso do solo nesta região do estado. A mecanização da agricultura e o binômio milho/soja liberaram milhares de trabalhadores que viviam em zonas rurais e passaram a viver em cidades, sobretudo, as médias e grandes, que possuíam melhor infraestrutura. É nesse momento que Londrina e Maringá passam a ter um forte crescimento urbano e também se inicia uma perda populacional por parte de muitas cidades de menor expressão. Cascavel, começa a se destacar também em decorrência de uma forte migração do sul para a região sudoeste do estado. Ponta Grossa pela sua localização regional e influência da própria capital do estado. O fator localização tem uma importância considerada. As regiões para serem usufruídas precisam de ter centros para viabilizar o desenvolvimento econômico da própria região e que acabam se tornando centros regionais. Esses centros populacionais que foram se estruturando passaram a se aproveitar de suas vantagens locais, economias de aglomeração, pois, melhores infraestruturas acabam por atrair maiores investimentos que geram empregos e atraem populações. Assim, a agricultura paranaense, sobretudo, no terceiro planalto, fez com que houvesse num primeiro momento uma distribuição populacional por vários municípios e num segundo momento que parte considerada dessa população se dirigisse para alguns centros urbanos mais estruturados, gerando os centros regionais que temos hoje.
Por que surgiram tantas cidades importantes quando o Estado celebrava 100 anos em 1953? Isso de alguma maneira foi planejado ou foi surpreendente para as elites econômicas e políticas da época?
É importante lembrar que na década de 1950, do século passado, a marcha pioneira para o oeste do estado ainda estava em andamento. As ondas migratórias foram intensas na região norte e oeste em meados do século XX.
Por que alguns municípios aproveitaram melhor o fenômeno para ter um desenvolvimento contínuo enquanto outros simplesmente “murcharam”?
A primeira resposta, com relação aos centros regionais que foram se formando e suas vantagens comparativas locacionais colaboram para uma explicação dessa questão, mas precisamos levar em conta algumas singularidades que podem também explicar. Por exemplo, a chegada de uma grande indústria como em Telêmaco Borba, colaborou sem dúvida alguma para o seu desenvolvimento. Alguns municípios foram desmembrados o que acabou interferindo em seu desenvolvimento, por exemplo Mandaguari que tinha uma população mais expressiva que Maringá em 1950, mas acabou perdendo essa posição pois Maringá se tornou um centro regional mais atraente. Cito também a própria duplicação da rodovia Londrina-Maringá que, mudando seu traçado, por motivos técnicos e políticos, acabou por tirar fora desse eixo as cidades de Apucarana, Cambira e Jandaia do Sul, isso acabou por interferir no desenvolvimento desses centros urbanos.
A estabilidade demográfica no Paraná e no Brasil terá quais consequências econômicas, sociais e políticas?
As mesmas que os países centrais registram já há algum tempo: uma população que envelhece e precisa de mais políticas públicas assistenciais; falta de mão-de-obra e a necessidade de mão-de-obra imigrante para diminuir seus impactos econômicos. Quanto as estimativas anunciadas, destaco a permanência populacional do Aglomerado Metropolitano (não região metropolitana!) entre Londrina-Apucarana que, segundo a estimativa citada, permanecerá, além de Londrina, com mais 3 centros urbanos, com mais de 100 mil habitantes, a única região com essa expressividade fora da região da capital do estado.
NÚMEROS
Num espaço de 100 anos, o Paraná vai alterar profundamente sua demografia. As maiores cidades do interior em dois momentos da História.
1950 (Censo do IBGE)
Mandaguari 102.586
Apucarana 89.297
Londrina 72.144
Guarapuava 68.081
Arapongas 58.932
Cornélio Procópio 56.826
Pitanga 55.463
Ponta Grossa 54.838
Clevelândia 54.281
Lapa 46.980
Tibagi 46.379
Jaguapitã 39.658
Sertanópolis 36.467
Jacarezinho 34.668
Rolândia 34.641
União da Vitória 33.989
Campo Mourão 32.665
Assaí 31.583
Castro 29.475
Reserva 29.395
2050 (projeção do Ipardes)
Londrina 576.929
Maringá 474.517
Cascavel 445.662
Ponta Grossa 401.808
Foz do Iguaçu 294.336
Toledo 208.067
Guarapuava 180.447
Umuarama 139.835
Arapongas 133.859
Pato Branco 131.740
Francisco Beltrão 127.056
Apucarana 127.056
Cambé 111.749
Campo Mourão 110.348
Paranavaí 102.721
Rolândia 99.588
Cianorte 90.084
Mandaguaçu 82.219
Medianeira 81.066
Castro 73.768
*Em negrito, as oito cidades que aparecem nas duas listas

