A Sesp (Secretaria de Estado da Segurança Pública) está licitando a locação de 300 câmeras corporais para uso das polícias Militar e Rodoviária Estadual. A estimativa de investimento é da ordem de R$ 6 milhões ao longo de um ano, em período de teste.

O processo licitatório começou em abril, mas foi suspenso e retomado em junho. A secretaria informou que a suspensão foi necessária por conta do valor da contratação e para impedir que “algumas especificações que podem ser corrigidas nesta fase de planejamento prejudiquem a competitividade da licitação” ou que gerem “prejuízo na execução do contrato”.

“Quando o contrato for aprovado e efetivado, o Estado terá 90 dias úteis para a entrega total do trabalho para a empresa que ganhou a licitação, que deve ocorrer ao final de 2023”, acrescenta a pasta por meio de nota. “Seguindo os trâmites normais da licitação e contratação, se o processo não tiver intercorrências, a estimativa é que ainda em 2023 [as câmeras corporais] estejam em funcionamento.”

De acordo com o edital, Londrina receberá 44 unidades, sendo 20 destinadas à 2ª Companhia da PRE (Polícia Rodoviária Estadual) e 24 ao 5° BPM (Batalhão de Polícia Militar). Outras cidades contempladas serão Cascavel, Maringá, Marechal Cândido Rondon, Curitiba, Ponta Grossa, São José dos Pinhais, Colombo e Paranaguá.

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A pasta informou que as chamadas “body cams” serão utilizadas inicialmente visando a “análise de efetividade” e somente após a conclusão da licitação e a instalação e operação das câmeras “será possível ter uma base da importância referente à modalidade de equipamento”.

O procurador de Justiça Leonir Batisti, coordenador do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), aponta que o MPPR (Ministério Público do Paraná) fez a recomendação para o uso dos equipamentos e que há um grupo acompanhando o processo de implementação.

“Como é natural, nós consideramos uma ferramenta importante”, avalia, pontuando que a câmera permite “a verificação eventual do comportamento policial do ângulo daquele que porventura seja alvo de uma operação” e também garante ao agente “evitar que seja imposto a ele ou afirmado a ele qualquer situação de ilegalidade”.

Batisti também ressalta que é papel do MPPR apurar cada morte resultado de intervenção policial verificando “se as circunstâncias justificaram ou não a ação policial”.

“Quando existe uma câmera, é natural, existem certos cuidados. Nós esperamos que esses cuidados sejam apenas no sentido de agir em conformidade com a lei, e não para inibir a ação policial que é necessária”, ressalta.

Na avaliação do procurador, apenas o uso isolado de câmera não reduz a letalidade policial, o que depende de um conjunto de ações que passam, inicialmente, pelo treinamento dos agentes. “Quando o policial está bem, ele vai agir de acordo com os protocolos, tendo a inteligência de distinguir situações.”

‘SOCIEDADE DESIGUAL’

O professor Cezar Bueno de Lima, da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), afirma que todas as ações governamentais que oferecem transparência na ação dos agentes são importantes.

“Essas câmeras são importantes para os policiais e também para preservar, digamos assim, os direitos das pessoas que estão sendo acusadas e eventualmente presas. A princípio, eu acho que é uma medida importante e, paralelo a isso, precisamos estabelecer uma cultura de ação mais preventiva do que repressiva”, diz o sociólogo.

No entanto, Lima acredita que, levando em consideração o efetivo de policiais militares no Paraná, o total de 300 câmeras “é absolutamente insignificante, é simbólico”.

“Tem alguma utilidade se efetivamente o governo do Estado estiver oferecendo as 300 câmeras para fazer um treinamento, uma amostragem, que possa efetivamente ter o compromisso de expandir de maneira muito significativa, para dar conta do número de policiais de cada um dos municípios”, ressalta. “Caso contrário, eu diria que isso é mais um espetáculo e uma forma de postergar a importância do uso das câmeras entre os policiais militares.”

Lima enfatiza que o Estado “não tem o direito de matar”, e que é fundamental que o setor de segurança pública atue rigorosamente dentro da lei. Também, que o uso das câmeras pode simbolizar uma mudança importante em prol de uma ação mais cuidadosa da polícia.

Dados do Gaeco divulgados no início deste ano apontam que a maioria dos mortos em confrontos policiais são pardos (51%) e negros (7%). “Na sociedade brasileira, cada vez mais percebemos que essas mortes têm destino, são seletivas. Os corpos que estão sendo tombados são pobres e negros. Isso demonstra uma seletividade do aparato de repressão e controle contra os segmentos mais pobres e vulneráveis da sociedade brasileira”, completa.

SECRETARIA

Questionada sobre ações adotadas para minimizar a letalidade policial e a morte de agentes no Paraná, a Sesp afirmou que “investe constantemente em capacitação e em equipamentos de proteção individual, para evitar quaisquer fatalidades envolvendo servidores das forças de segurança”.