A cada início de ano, muitas pessoas gostam de definir metas, planejar viagens e listar coisas que querem alcançar durante os próximos 12 meses, seja no âmbito pessoal ou profissional. Como uma folha em branco, janeiro é o mês em que planos são desenhados de acordo com as vontades e ambições de cada um. Um tema que deve estar em pauta para todos é o cuidado com a saúde mental.

Com toda a crença de que um ano novo significa uma vida nova, também chegam as preocupações e as desilusões da vida cotidiana, já que ninguém é ou precisa ser bom em tudo. Todo mundo, hora ou outra, tem o direito de não estar contente com alguma coisa ou de passar por um momento mais triste. Porém, o problema assume um caráter mais sério quando esses questionamentos tomam conta da vida e da alegria de viver, levando a quadros de ansiedade, depressão e, em casos mais graves, ao suicídio.

O psiquiatra Eduardo Luiz Frassato aponta que, atualmente, ser jovem é um fator de risco para o suicídio pelo fato de que esse grupo etário é mais impulsivo e tende a sentir as coisas de forma mais intensa, já que ainda estão no início da vida e não têm tanta experiência. “Quando a gente é muito novo, não tem a vivência de muitas coisas, então as frustrações são sentidas de forma muito intensa”, explica.

De acordo com dados de 2022 da OMS (Organização Mundial da Saúde), pelo menos 700 mil pessoas morrem todos os anos vítimas de suicídio, o que equivale a uma morte a cada 100 registradas. Como um dos grupos mais atingidos por problemas relacionados à saúde mental, o suicídio é a quarta morte mais recorrente entre jovens de 15 a 29 anos.

“O suicídio para o paciente depressivo [acontece quando ele] já chegou ao fim do túnel e ele não vê mais a luz, não está conseguindo ter perspectiva nenhuma de melhora”, aponta. Segundo o psiquiatra, nem sempre uma pessoa dá sinais de que vai cometer o suicídio, mas, por outro lado, dá indícios de que não está bem.

Segundo ele, o quadro se potencializa quando há um transtorno psiquiátrico ou o abuso de álcool e drogas, sendo que a perda de perspectiva de futuro leva a uma desesperança muito intensa, em que esse jovem não consegue enxergar uma saída. “As drogas diminuem o nosso juízo crítico e a gente acaba tomando atitudes que às vezes, sem o uso e abuso de drogas, não tomaria”, explica.

O psicanalista Marcelo José de Castro explica que a juventude é um momento em que as pessoas ainda não sabem ou estão descobrindo muitas informações sobre a vida e sobre si mesmos. “O corpo [dos jovens] está em transformação, é uma explosão de hormônios, gerando a puberdade, que coincide com essa adolescência”, explica, complementando que os jovens também estão vulneráveis às idealizações vistas nas redes sociais, como a do corpo perfeito ou da roupa da moda.

Com a dificuldade em lidar com a falta que vem do não alcance das idealizações, o psicanalista reforça que algumas das fugas encontradas por jovens são o álcool e as drogas. “Eu descobri na clínica [ao atender jovens] que o único momento em que eles não estão de olho no WhatsApp ou no Instagram deles é nos 45 minutos, duas vezes na semana, que estão aqui”, explica, fazendo uma crítica à hiperconectividade.

Além disso, outro ponto que o psicanalista destaca é o fato de que, em muitos casos, todas as frustrações dos pais são depositadas neles, o que contribui ainda mais para o desenvolvimento de transtornos da mente.

O turbilhão de emoções, cobranças e frustrações são materializados na forma de transtornos alimentares, dismorfismo corporal, depressão e ansiedade. Além disso, a solução para todos esses problemas é reduzida a uma pílula em muitos casos. “A relação [entre pais e filhos] pode ser amistosa, mas pais não são amigos, amigos ele tem na escola, no condomínio, mas eles precisam de pai e de mãe e da função de adulto que os estimulem com exemplos e com limites”, afirma.

CUIDADO COM A SAÚDE MENTAL

O psiquiatra Eduardo Luiz Frassato explica que o mês que termina nesta quarta (31) é um período que inspira muitas pessoas a fazerem planos ou definirem metas, sendo um mês propício para falar de assuntos importantes e que podem mudar a vida das pessoas. “O [mês de] janeiro foi escolhido por ser o início, o começo, do ciclo [de um novo ano] e a questão do branco é que é como se ele [janeiro] fosse uma tela em branco, um papel, em que se pode criar coisas sobre ela”, ressalta.

Segundo ele, discutir o tema é muito importante pelo fato de que, quanto mais se fala sobre a saúde mental e os cuidados que devem ser tomados, toda a sociedade é beneficiada. Apesar dos diferentes tipos e gravidades, todos os transtornos mentais trazem sofrimento ao paciente, mesmo que a pessoa só pareça estar “chata”, “estressada” ou “preguiçosa”.

Ele reforça que, há alguns anos, o comum era não falar sobre os problemas de saúde mental, como depressão e ansiedade, assim como o suicídio, já que a mentalidade era de que o ato de falar poderia incentivar as pessoas a tirarem a própria vida.

“Hoje já se sabe que isso não é real, já é comprovado que falar sobre o suicídio não causa suicídio, então falar sobre a saúde é uma forma de conseguir desmistificar muitas coisas, muitos conhecimentos que não são corretos e que, às vezes, por tanta repetição, acabam virando verdade”, ressalta.

Por isso, dar espaço para que profissionais falem sobre o assunto, em campanhas como a do Janeiro Branco, é fundamental para que as pessoas conheçam essas patologias e saibam da importância do tratamento em busca da devolução da qualidade de vida para o paciente.

CVV

O CVV (Centro de Valorização da Vida) é uma associação civil criada em 1962 para auxiliar pessoas que estejam passando por momentos difíceis, promovendo um apoio emocial na tentativa de evitar casos de suicídio. Em 2023, o CVV recebeu, em média, mais de 200 mil ligações por mês. Dentre esse número, cerca de duas mil ligações foram feitas de Londrina e região (que utilizam o DDD 43) a cada mês.

De forma anônima, qualquer pessoa pode ligar para o CVV através do telefone 188 durante qualquer horário ou dia da semana. Além disso, no site https://cvv.org.br/ é possível conversar com algum dos voluntários por chat, email ou, ainda, presencialmente em algum dos endereços. Em Londrina, a sede do CVV fica na Rua Bahia, 23 (sala B), no centro.