Regata entra em área de calmaria na Linha do Equador
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sábado, 01 de abril de 2000
Por Júlio Cruz Neto
Cabo Verde, 02 (AE) - Os veleiros que disputam a Regata do Descobrimento estão passando por uma região que pode fazer muita diferença no resultado final da terceira perna, entre Mindelo e Salvador. São os doldrums, uma área de calmaria nas imediações da linha do Equador. Cada um procura a melhor longitude para passar para o Hemisfério Sul, inclusive o navio-veleiro Cisne Branco, da Marinha, que leva a reportagem da Agência Estado.
"É uma região onde não há muito vento", explica o experiente Alex Welter, do trimarã Bahia: "Há muita nebulosidade, trovoadas e pancadas de chuva, mas prevalecem as calmarias." Veleiro mais rápido da prova, o Bahia já chegou lá e, segundo informou o barco Viva, achou uma janela com um pouco de vento entre os meridianos 29o e 30o. Ou seja, está num rumo que o levará direto para o Brasil.
Já o Cisne Branco não pode fazer isso, por não ter a mesma capacidade de orçar (velejar contra o vento). "Enquanto os veleiros pequenos conseguem orçar a partir de 30o, nosso ângulo mínimo é de 70o", explica o comandante Cantuária. Quer dizer, o navio não progride se o vento bate de proa (frente) - só de través (lado).
Aproveitando o vento que vem do norte, o Cisne Branco seguia hoje no rumo 190, quer dizer, praticamente em linha reta na direção sul - para depois arribar mais a oeste, com ventos de leste e sudeste, e seguir rumo à Bahia. "Se fosse por dentro agora", exemplifica o comandante, "ia parar em Fortaleza, não em Salvador".
Dos veleiros que realmente disputam a regata, os brasileiros Papa Léguas e Viva tem usado a mesma tática do Cisne Branco, assim como o português Mariposa - todos entre 26o e 27o. Somente seu compatriota Marujo, vencedor das duas primeiras pernas, navegava hoje próximo à latitude 29o, como fez o Bahia. Daqui a alguns dias, quando todos tiverem passado pelas calmarias, será possível saber quem se deu melhor. É um misto de estratégia e sorte.
O belga Thierry Stump, tripulante do Hozhoni, tem a mesma opinião de Cantuária, do Cisne Branco: "Vamos tentar passar no meridiano 27o, onde a faixa de calmaria costuma ser mais estreita." Mas mesmo com toda a sua experiência de 47 anos de idade e 30 no mar, ele admite que é impossível ter certeza: "A faixa se estreita e se alarga de um dia para o outro. O ideal é passar perpendicular a ela para sofrer menos o efeito."
Thierry, que construiu o Hozhoni e adaptou o Paratii, de Amyr Klink, para a expedição na Antártida, conta que durante as calmarias, costuma haver temporais violentos, mas breves: "As chuvas não passam de 45 minutos." Segundo o Serviço Meteorológico da Marinha, a previsão até a manhã desta segunda-feira é de pancadas de chuva e trovoadas numa área de 3 a 4 graus em torno da Zona de Congruência Intertropical (Equador). O Cisne Branco deve entrar amanhã nessa faixa, assim como boa parte dos veleiros.
No Cisne Branco, o objetivo é chegar ao Brasil só à base de vela. Mas se o vento sumir mesmo e a situação apertar, existe um motor para ser usado, assim como no Hozhoni, no Paratii e em todos os barcos que estão na viagem sem disputar a regata. "Qualquer coisa, ligamos o motor e vamos embora", diz Luiz Alberto Ballarin, do brasileiro Corumii.
Antônio Santos Carvalho, do veleiro português Vagalouca, também não tem a menor dúvida: "A estratégia nos doldrums é meter o motor." Se você pensa que só golfinhos acompanham barcos e navios no mar, está enganado. Hoje de manhã, um cardume de atuns ficou cerca de uma hora nadando na proa do Cisne Branco. Sorte deles que o comandante Cantuária não permite pescaria a bordo.