Quase 20% das pessoas com deficiência são analfabetas no Brasil
Pelos critérios da pesquisa, uma pessoa é considerada alfabetizada quando consegue ler e escrever pelo menos um bilhete simples
PUBLICAÇÃO
sexta-feira, 07 de julho de 2023
Pelos critérios da pesquisa, uma pessoa é considerada alfabetizada quando consegue ler e escrever pelo menos um bilhete simples
Leonardo Vieceli - Folhapress
Rio de Janeiro - Quase 20% da população de 15 anos ou mais com algum tipo de deficiência no Brasil era considerada analfabeta no terceiro trimestre de 2022, apontam dados divulgados nesta sexta-feira (7) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).
Nessa camada da população, a taxa de analfabetismo foi de 19,5% à época. Em termos absolutos, o resultado significa que, de um total de 17,3 milhões de pessoas com deficiência, quase 3,4 milhões não sabiam ler e escrever.
Entre as pessoas de 15 anos ou mais sem deficiência, a taxa de analfabetismo foi de 4,1%. A diferença entre os dois indicadores foi de 15,4 pontos percentuais.
Os dados integram um módulo da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) sobre pessoas com deficiência.
A publicação destaca a existência de desigualdades que afetam essa parcela da população em áreas como educação e mercado de trabalho. Não há uma série histórica comparável no levantamento.
LEIA TAMBÉM:
+ Adultos analfabetos vão à escola em busca de independência
"As desigualdades eram esperadas, mas algumas são muito gritantes", diz Luciana Alves dos Santos, analista da pesquisa do IBGE. Um dos pontos que chamam atenção, segundo ela, é justamente a disparidade do indicador de analfabetismo.
Pelos critérios da pesquisa, uma pessoa é considerada alfabetizada quando consegue ler e escrever pelo menos um bilhete simples.
Segundo o IBGE, o analfabetismo impacta mais os idosos no país. A situação reflete a menor escolarização frente aos mais jovens. Entre a população idosa, com 60 anos ou mais, a taxa de analfabetismo foi de 25,1% para as pessoas com deficiência e de 12,6% para as sem deficiência.
ENSINO BÁSICO
O IBGE também traz uma comparação entre os brasileiros que concluíram o ensino básico - ou seja, que finalizaram pelo menos os estudos do ensino médio. De novo, as disparidades aparecem.
Considerando as pessoas de 25 anos ou mais com deficiência, apenas 25,6% haviam concluído pelo menos o ensino básico. A taxa foi de 57,3% entre a população sem deficiência na mesma faixa etária.
De acordo com a pesquisa, cerca de 18,6 milhões de pessoas de dois anos ou mais tinham algum tipo de deficiência no Brasil no terceiro trimestre de 2022 - o equivalente a 8,9% desse grupo etário.
O IBGE estima que 47,2% das pessoas com deficiência tinham 60 anos ou mais. Entre as pessoas sem deficiência, apenas 12,5% estavam nesse grupo de idade.
A metodologia da pesquisa considera como pessoa com deficiência quem tem muita dificuldade ou não consegue de modo algum realizar as atividades perguntadas em ao menos um dos quesitos investigados, como ouvir, enxergar, andar ou subir degraus.
TRABALHADORES
A informalidade atinge mais da metade da população com deficiência que trabalha no Brasil. Segundo o instituto, a taxa de informalidade das pessoas com algum tipo de deficiência foi de 55% em 2022 - os dados foram coletados no terceiro trimestre do ano passado.
Em termos absolutos, isso quer dizer que, do total de 4,6 milhões de profissionais ocupados com deficiência, quase 2,6 milhões recorriam a vagas sem carteira assinada ou CNPJ como forma de inserção no mercado de trabalho à época.
Entre a população ocupada sem deficiência, a taxa de informalidade foi menor, estimada em 38,7%. A média geral foi de 39,4%.
As estatísticas integram um módulo da Pnad Contínua (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua) sobre pessoas com deficiência. Além do mercado de trabalho, a área de educação também é analisada no levantamento. Não há uma série histórica comparável na pesquisa.
De acordo com o IBGE, 36,5% dos ocupados com deficiência trabalhavam por conta própria. É a principal forma de inserção desse grupo no mercado de trabalho.
Empregados no setor privado (35,4% do total) e empregados no setor público (11,5%) aparecem na sequência.
De novo, há diferenças em relação aos ocupados sem deficiência. Nesse grupo, a principal forma de inserção no mercado é a dos empregados no setor privado (50,5% do total). O trabalho por conta própria vem em seguida (25,4%). Os empregados no setor público (12,3%) aparecem depois.
Para calcular o percentual de trabalhadores por conta própria, o IBGE contabilizou os profissionais com e sem CNPJ. Ou seja, formais e informais.
O trabalho autônomo está mais associado no Brasil a postos informais, incluindo os populares bicos. Isso ajudaria a explicar a taxa mais elevada de informalidade para os profissionais com deficiência.
"O trabalho por conta própria é muito menos dos autônomos formalizados e mais das pessoas que não conseguiam se inserir no mercado de trabalho", disse Luciana Alves dos Santos, analista da pesquisa do IBGE.
Historicamente, o setor informal também é visto como fonte de salários menores, em média, na comparação com vagas formais.
De acordo com o IBGE, a renda média do trabalho principal das pessoas com deficiência foi de R$ 1.860 em 2022. O valor, já ajustado pela inflação, ficou em torno de 30% abaixo do rendimento dos ocupados sem deficiência (R$ 2.690).
O IBGE ainda aponta diferenças na taxa de desemprego. Entre as pessoas com deficiência, o indicador foi de 9,1%. Ficou acima tanto do patamar registrado entre as pessoas sem deficiência (8,7%) quanto do índice geral (também de 8,7%).
Já a taxa de participação na força de trabalho foi de 29,2% entre as pessoas com deficiência. É menos da metade do nível verificado entre as pessoas sem deficiência (66,4%).
A taxa de participação mede a proporção de pessoas de 14 anos ou mais que estão inseridas na força de trabalho como ocupadas (com algum tipo de vaga) ou desempregadas (à procura de oportunidades). Dependendo do contexto econômico, pode funcionar como uma espécie de termômetro de atividade - ou atratividade - do mercado.
A desigualdade, diz o IBGE, persiste inclusive entre as pessoas com nível superior. Nesse recorte, a taxa de participação foi de 54,7% para o grupo com deficiência e de 84,2% para o sem deficiência.
O instituto destacou que, entre as pessoas com deficiência, o percentual de desalentados em relação à população em idade de trabalhar foi de 6%. O resultado supera com folga a proporção verificada entre as pessoas sem deficiência (3,7%). Sob olhar das estatísticas oficiais, os desalentados representam os trabalhadores que desistem de procurar vagas por acharem que não terão vez.

