Brasília, 04 (AE) - Caso o governo consiga aprovar durante a convocação extraordinária a emenda constitucional criando o regime único de Previdência para servidores públicos e trabalhadores nas empresas privadas, o funcionalismo que for contratado a partir das novas regras terá de se associar a fundos de previdência complementar privados para aumentar o valor da aposentadoria. Isso porque a proposta de unificação acaba com a aposentadoria integral para os futuros servidores públicos, limitando o benefício ao teto geral existente para os trabalhadores na iniciativa privada, que hoje é de R$ 1.255,32.
O relator da proposta de emenda constitucional, deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA), disse hoje que em seu substitutivo pretende desobrigar o setor público de instituir previdência complementar como pré-condição para limitar as aposentadorias e pensões de seus servidores. Essa exigência está prevista no artigo 40 da emenda 20, aprovada no ano passado, que permite à União, Estados, Municípios e Distrito Federal fixar tetos para os benefícios de seus servidores, desde que implantem fundos de previdência complementar. Mas Aleluia ainda não fechou questão, até porque o PT, maior partido de oposição na Câmara, sequer aceita discutir a unificação da Previdência sem que sejam criados fundos de pensão complementar pelo setor público.
"Os poderes têm que possuir institutos de previdência públicos", alegou, hoje, o líder do PT na Câmara, deputado José Genoíno (SP). Ele se diz contra a discussão da previdência única agora. "Se o governo já tem dificuldades em aprovar a proposta de cobrar a contribuição previdenciária de inativos, vai complicar sua situação se insistir nesta proposta", acredita. "Isso só vai contaminar a pauta do Congresso". Genoíno salientou que a proposta original de Eduardo Jorge previa também que o sistema único de previdência seria gerido por um conselho, com a participação de trabalhadores. "Não se pode mexer nisso a toque de caixa", sustentou o líder petista.
A emenda de unificação da previdência entrou na pauta de carona na proposta de emenda constitucional que institui a taxação dos inativos. O deputado Luiz Carlos Hauly (PSDB-PR) apresentou uma emenda à PEC criando o sistema único previdenciário, tomando como base proposta anterior do deputado petista Eduardo Jorge (SP). Agora, Aleluia deverá fazer o substitutivo agregando idéias das duas propostas, de Hauly e Jorge. Ornéllas - O ministro da Previdência Social, Waldeck Ornéllas, disse hoje que a permanência ou não da previsão de existência da previdência complementar pública para o funcionalismo é uma questão para o relator examinar. "O que queremos é que no futuro só exista um regime de previdência". Ele quer é concluir o processo de reforma da previdência, equacionando o que para ele é o último obstáculo, a previdência pública.
Pela proposta de unificação, só as pessoas que ingressarem no serviço público após a promulgação da emenda terão as suas aposentadorias limitadas ao valor do teto válido para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Como as regras serão iguais para todos, também os novos funcionários públicos estarão sujeitos ao fator previdenciário. Segundo o ministro, o Brasil precisa aumentar sua poupança interna, o que será possível com a expansão dos fundos complementares de previdência.
Hoje, o patrimônio desse setor equivale a 11% do Produto Interno Bruto (PIB), o que é pouco para um país emergente, segundo Ornéllas. O relator da PEC dos inativos e da emenda de unificação da Previdência diz que é favorável à expansão do setor. "A experiência tem mostrado que o setor público não tem visão para administrar a previdência com olhos para o futuro", afirmou. Mas Aleluia não descarta a possibilidade de criar mecanismos para que o setor público participe de alguma forma da previdência complementar para dar a segurança necessária ao servidor.
"Deve haver previdência complementar e elas poderão ser públicas também", afirmou o autor da emenda, deixando claro que a discussão ainda está em aberto. Luiz Carlos Hauly retorna terça-feira a Brasília e começa a discutir o assunto, com Aleluia, que quinta-feira já estará analisando as duas propostas. Proposta - A viabilidade política da proposta de unificação é vista como no mínimo delicada. O presidente da Câmara, deputado Michel Temer (PMDB-SP), disse hoje acreditar que é possível discutir a tese durante a convocação extraordinária. "É bom lembrar que essas matérias envolvendo previdência são sempre muito complicadas".
O objetivo da unificação dos regimes de previdência é estancar um déficit crescente no setor público, já que a Constituição de 1988 autoriza a União, Estados e Municípios a pagarem os salários integrais para os servidores inativos. O resultado é uma conta negativa anual de R$ 35 bilhões (valor de 1999) entre as contribuições recolhidas pelos três níveis de governo e as aposentadorias e pensões concedidas a 3 milhões de pessoas. Já os 18 milhões de aposentados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) geram anualmente um déficit de R$ 9,8 bilhões, que na previsão de Ornellas irá desaparecer em dez anos.