Imagem ilustrativa da imagem Promotor do caso Evandro se diz 'estupefato' com áudios que indicam tortura
| Foto: Marco Jacobsen

O promotor paranaense Paulo Sérgio Markowickz, que atuou no julgamento do caso Evandro, afirmou que o Ministério Público não tem legitimidade para pedir a revisão criminal do caso Evandro. Entretanto, afirmou à reportagem que tem convicção da responsabilidade dos condenados, com base nas provas dos autos.

No início de junho, após áudios de confissão sob tortura terem vindo à tona, o Tribunal de Justiça do Paraná extinguiu a ficha criminal de Beatriz Abagge, uma da condenadas pelo suposto homicídio de Evandro Ramos Caetano em abril de 1992.

Markowicz é o representante do Ministério Público que aceitou participar da série documental “O Caso Evandro”. Em um dos momentos que mais chama a atenção, no penúltimo episódio, ele é um dos entrevistados que ouve, pela primeira vez, gravações em fitas cassete da confissão dos condenados.

Os áudios foram entregues por uma fonte anônima ao jornalista Ivan Mizanzuk, que narra em detalhes todo o desenrolar da história no podcast “Projeto Humanos: O Caso Evandro”. As gravações reforçam a tese da defesa, de que as confissões foram obtidos sob tortura.

Durante o primeiro julgamento do caso, ainda nos anos 1990, uma fita cassete com a confissão dos acusados chegou a ser sugerida como prova, mas a perícia indicou haver muitos cortes e edições. A defesa, então, insistiu na manutenção da fita, mas, no trâmite dos autos entre fóruns, ele acabou se perdendo.


REAÇÃO LEGÍTIMA

Markowicz confirma que ouviu o conteúdo dos áudios divulgados recentemente pela primeira vez durante a gravação da série documental, em 10 de março do ano passado. “Quando tive contato com essas fitas, o fato é que uma delas é semelhante à que havia no processo, mas há outros trechos inseridos [na mais recente]. Foram me mostrados alguns trechos que poderiam caracterizar tortura e, claro, fiquei estupefato em todos os sentidos. Minha reação, ali, é real, legítima”, diz o promotor.

Três dias após ouvir as gravações, Markowicz e outros promotores que atuaram no caso estudaram as medidas a serem tomadas e chegaram à conclusão de que, se algo devesse ser feito, deveria partir da promotoria em Guaratuba, comarca na qual o crime ocorreu. Um ofício foi encaminhado, mas o MP no litoral considerou que, uma vez que o crime de tortura só passou a ser considerado imprescritível em 2002, o caso foi arquivado.

REVISÃO CRIMINAL

O promotor afirma que o aparecimento das fitas com as confissões sob tortura é um fato grave, mas que, juridicamente, precisa ser analisada por vários pontos, como a confirmação pericial da autenticidade do conteúdo. “Precisa-se confirmar se são reais ou contrafeitas, algo que não podemos afastar. Ou seja, não posso nem confirmar a autenticidade [dos novos áudios], nem o contrário”, explica.

Em relação à revisão criminal, Markowicz ressalta a ilegitimidade do MP, mas afirma que, se houvesse essa legitimidade, pediria as fitas para periciar. Por outro lado, ele também diz que a revisão criminal, para ocorrer, tem de trazer prova cabal de inocência desde o início do processo, ou seja, não seria possível trazer novas provas.

Por fim, o promotor diz que, se o caso for reaberto, o que mais pesa, para ele, é o sofrimento pelo qual passaria, novamente, a família de Evandro Ramos Caetano, o garoto desaparecido em abril de 1992. “Foi uma dor que senti. É claro que houve um emprego de energia pessoal [de minha parte] muito grande neste caso, mas, a primeira dor que me veio ao coração, foi pela família da vítima, da mãe do Evandro, pela veiculação da série e, em caso de autenticidade das fitas, da possibilidade de reabrir o caso”, diz.