A ação ocorreu nesta quarta (30), data simbólica para a educação paranaense. Há 35 anos, as forças se segurança reprimiram violentamente uma manifestação de professores

Docentes aposentados e funcionários fizeram uma manifestação na Alep
Docentes aposentados e funcionários fizeram uma manifestação na Alep | Foto: Bruna Durigan/Divulgação

Professores e estudantes da rede estadual fizeram, nesta quarta-feira (30), um dia sem uso de plataformas e dispositivos digitais nas salas de aula. É uma ação que, segundo a APP-Sindicato (Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná), buscou a interação humana e os recursos didáticos tradicionais.

Ao mesmo tempo, docentes aposentados e funcionários fizeram uma manifestação na Alep (Assembleia Legislativa do Paraná), em Curitiba. Entre as reivindicações estão o pagamento do piso aos aposentados sem paridade e o avanço da reformulação das carreiras dos agentes educacionais. O líder do governo do Legislativo, deputado Hussein Bakri (PSD), recebeu uma comitiva da APP-Sindicato.

O 30 de agosto é simbólico na educação pública paranaense. Foi nesse dia, há 35 anos, que uma manifestação pacífica de professores foi reprimida violentamente pelas forças de segurança do Estado. O uso da cavalaria da PM (Polícia Militar) naquele dia é lembrado até hoje como uma resposta desproporcional à mobilização da categoria.

A presidente da APP-Sindicato, Walkiria Olegário Mazeto, explica que os docentes, em assembleia, decidiram não paralisar as atividades neste ano e denunciar “que outros tipos de violência” vêm ocorrendo no campo da educação. A “plataformização” seria uma delas.

“Uma das pautas centrais que a categoria traz para o debate neste ano é o uso intensivo das tecnologias e plataformas na sala de aula. A forma como a secretaria está organizando isso, e não só o uso enquanto ferramenta tecnológica, mas como metas de interação na plataforma”, afirma Mazeto. “O resultado publicado não é o número de estudantes que melhoraram a aprendizagem. É quantas interações na plataforma ‘x’ teve, quantas redações foram feitas no aplicativo tal. Tudo eles medem pelos acessos aos aplicativos e plataformas.”

A presidente ressalta que “uma grande parte da estrutura da gestão sabe que tem escolas que acessam porque são obrigadas a acessar”. E que isso não necessariamente tem retorno pedagógico para os estudantes.

MOBILIZAÇÃO

A professora Eli Inês Bieger, 61, de Língua Portuguesa e Oratória, diz que os docentes buscam chamar a atenção da sociedade neste 30 de agosto. “As pessoas não estão percebendo o desgaste e o atraso que essas plataformas estão trazendo para a educação. As crianças cada dia mais envolvidas com telas, sem reflexão, não há discussões, tudo imposto, tudo pronto”, avalia a docente.

Bieger também opina que “as plataformas não são nada agradáveis, não chamam atenção”, e isso acaba criando uma aversão por parte dos estudantes.

“Nossas aulas já vêm prontas no RCO [Registro de Classe Online], são conteúdos rasos, todo trimestre repetem-se os gêneros textuais, por exemplo, não estamos trabalhando quase nada da gramática e, produção textual, só na plataforma, porque não estamos conseguindo trabalhar o que seria interessante, importante para eles”, acrescenta.

A professora afirma que não há reflexão e uma proposta coerente, e que os docentes “não estão suportando o tempo que temos que ficar, primeiro cobrando dos alunos para que façam, depois corrigindo, e percebe-se que não leva a nada, a escrita não está melhorando”.

“A plataforma Redação Paraná é uma vergonha para os professores de português, porque ela faz a correção de uma forma grotesca, onde erros ortográficos inadmissíveis permanecem e a plataforma se preocupa muito com estrangeirismo, aí sim ela acusa que está errado. Mas erros ortográficos não, e isso é preocupante”, completa.

A docente também relata que precisa coordenar pelo menos quatro ferramentas - Redação Paraná, Leia Paraná, Quizizz e RCO - e que sente falta da presença de clássicos da literatura na plataforma de leitura, por exemplo, para os estudantes de 6° a 9° ano e do ensino médio.

“Me preocupa muito essa situação porque daqui a quatro, cinco anos, nossos alunos não terão mais acesso às universidades, e não é esse o objetivo da escola pública, que é preparar o aluno para a vida, para conseguir atingir seus objetivos, e as plataformas estão deixando eles cada vez com menos conhecimento.”

OUTRO LADO

Procurada pela reportagem, a Seed-PR (Secretaria de Estado da Educação) disse, em nota, que “o emprego de recursos tecnológicos serve como metodologia de apoio à aprendizagem” e cita um relatório da Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação) sobre o emprego de ferramentas digitais como suporte ao processo educacional.

De acordo com a pasta, hoje são disponibilizadas oito plataformas de aprendizagem “usadas como metodologia coadjuvante ao principal agente do processo de ensino: o docente”.

“Destaque-se que, somada ao ensino tradicional, a adoção de recursos tecnológicos de aprendizado resultou em significativa contribuição com o aumento dos níveis do desempenho acadêmico dos estudantes da rede estadual de ensino”, aponta a nota, citando que o Paraná teve nota 4,6 no último Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), “colocando o Estado no primeiro lugar nacional pela avaliação”.

A pasta também afirmou que é comprovada “a boa adesão por parte dos alunos”. Em relação às atividades feitas neste ano, foram 2.907.417 na Redação Paraná e 13.719.840 na Leia Paraná, por exemplo.

Segundo a secretaria, “todas as escolas do Estado possuem conexão de internet com rede WiFi para os alunos, professores e funcionários”, e que o governo do Estado distribuiu, apenas no primeiro semestre, 50 mil desktops, 50 mil tablets e 18 kits de robótica, “ respeitando política permanente de aquisição e atualização de dispositivos para garantir infraestrutura adequada para todas as escolas, de acordo com os critérios do guia EduTec do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB)”.