A professora Camila Bordini é hoje uma nova pessoa. A paciente, moradora de Grandes Rios, retornou para casa nesta quinta-feira (2), após 25 dias internada na Santa Casa de Londrina para receber o transplante de coração. Ela deixou o hospital sob aplausos da equipe que a atendeu.

O transplante cardíaco de Camila foi o primeiro a ocorrer na macrorregião de Londrina depois do início da pandemia do novo coronavírus. Os últimos dois procedimentos do gênero ocorreram em 2020, ano em que a Covid-19 se alastrou no Brasil, a partir de março.

Mesmo sendo considerada uma cirurgia de emergência, muitos pacientes desistiram dela temporariamente devido aos riscos do coronavírus - em outras ocasiões, por orientação de equipes médicas.

Camila foi diagnosticada com cardiopatia congênita aos 11 anos e, aos 13, passou pela primeira intervenção médica, para troca de válvula cardíaca e implante de marcapasso.

Ela estava na fila do transplante havia três anos e, durante a pandemia, teve a oportunidade por duas vezes de passar pelo procedimento, mas o medo das consequências da Covid-19 a levou a desistir.

“Passar por isso foi angustiante, porque a gente [paciente] fica esperando a oportunidade e, quando chega, não pode aceitar naquele momento [por conta da Covid-19]. Daí, começa uma espera mais angustiante ainda, porque não sabia quando ia acabar [a pandemia]. Quando passou, veio a esperança de novo”, contou a paciente, ao lado da mãe, Maria Juliana Bordini, no saguão do hospital.

A Santa Casa de Londrina é a única instituição credenciada pelo Ministério da Saúde para executar este tipo de procedimento no Norte do Paraná. O transplante de Camila foi o 68º executado pela equipe de profissionais do hospital, também habilitado para transplantes renais.

NOVAS EXPERIÊNCIAS

Embora tenha tido uma vida normal, a doença coronária trouxe limitações para Camila, como impedimento de fazer viagens longas, percorrer trilhas, praticar natação ou mesmo andar de bicicleta. “Foram muitas coisas que não consegui fazer, experiências que eu não tive, mas que eu pretendo começar a fazer, assim que terminar a recuperação”, afirmou.

Ela também pretende voltar a viver na própria casa, já que acabou indo morar com a mãe, e encontrar um emprego. “Não sei se vou dar aulas de novo, mas quero fazer alguma coisa”, destacou.

Camila é acompanhada clinicamente desde os 13 anos pela equipe do cirurgião Gualter Pinheiro Júnior. Ele e o também cirurgião cardíaco da Santa Casa e do Instituto de Cirurgia do Coração de Londrina Luís Fernando Tirolli Sanches fizeram o transplante de Camila, no dia 8 de janeiro.

De acordo com Sanches, um transplante é uma situação complicada em qualquer hospital, por demandar um cuidado multiprofissional. Entretanto, no caso da transplantação cardíaca, é ainda mais grave pela logística que demanda – muitas vezes, o doador não está no mesmo local que o receptor – e o paciente, geralmente, já está em estado de doença cardíaca terminal, quando outras opções de tratamento já foram descartadas, como no caso de Camila.

O procedimento médico durou cerca de cinco horas e demandou uma equipe com dez médicos, além de enfermeiros e auxiliares de enfermagem. Também há cuidados pré e pós-operatórios com outros profissionais, como nutricionista e fisioterapeuta.

Segundo Sanches, a emoção de ver um paciente deixando o hospital é muito grande, visto que criam-se laços durante a trajetória desde a fila de transplante e exames. “Então, a emoção que ela tem quando acorda e percebe que tem a esperança de continuar viva, com uma melhor qualidade de vida em comparação ao que tinha anteriormente, acho que é a mesma que a gente sente”, disse.

DOAÇÃO DE ÓRGÃOS

Enfermeiras da CIHDOTT (Comissão Intra-Hospitalar de Doação de Órgãos e Tecidos para Transplante), Thaís Xavier Marinho Ferreira e Tatiane Mendes Cizotto são responsáveis por buscarem possíveis doadores e fazerem as entrevistas com os familiares, no intuito de tirar dúvidas e esclarecer a importância sobre os transplantes de órgãos para a saúde pública.

Entre os trabalhos exercidos pelas profissionais está o acolhimento das pessoas que perderam entes queridos e conscientizar sobre a importância deste ato de amor ao próximo. “Nada mais lindo que ver a Camila saindo daqui. A doação de órgãos salva vidas e ressignifica o óbito”, afirmou Thaís. “A doação salva toda uma família, que tem mais tempo para continuar junto com seus entes queridos”, complementou Tatiane.

Devido à delicadeza da situação, os profissionais que fazem o contato com os parentes dos doadores, como Tatiane e Thaís, são altamente habilitados e treinados para argumentar sobre a importância deste ato de amor, afirma a coordenadora da Organização de Procura de Órgãos de Londrina, Emanuelle Zocoler.

No Paraná, a fila de espera chega a três mil pacientes – no Brasil, o número é de 51 mil pessoas. “Então, é importante nos conscientizarmos que, um dia, podemos ser nós precisando de um órgão. Daí a importância de se falar sobre a doação, em casa, com a família, porque são eles que vão decidir se vai ser um doador ou não”, afirmou.

Aliás, a desinformação é a maior dificuldade encontrada por estes profissionais. Segundo Emanuelle, informações falsas sobre tráfico ou comercialização de órgãos, por exemplo, trazem temores aos parentes dos doadores.

A preocupação, entretanto, é descabida, uma vez que todo o processo, desde as organizações de procura de órgão até a fila única de doações ficam sob a tutela do Estado. Além disso, o Sistema Nacional de Transplante é todo transparente. “A Camila, quando entrou na fila, sabia em qual posição estava, quantos órgãos haviam sido ofertados para a equipe em que ela está cadastrada, quantos órgãos foram disponibilizados. E essas informações podem ser acessadas de qualquer computador ou smartphone”, esclareceu Emanuelle.

****

Receba nossas notícias direto no seu celular! Envie também suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link wa.me/message/6WMTNSJARGMLL1.