Agência Folha
De São Paulo
Após visita à Fundação para o Remédio Popular (Furp) e ao Hospital das Clínicas de São Paulo, membros da CPI dos Medicamentos voltaram ontem a Brasília com a certeza de que há abuso na composição dos preços praticados pela indústria farmacêutica. A Furp é um laboratório estatal que produz 82 itens de medicamentos para abastecer hospitais e postos de saúde do Estado e dos 645 municípios de São Paulo. Segundo o presidente da Furp, Pompilio Mercadante Neto, os seus medicamentos chegam a ser mais de 2.000% mais baratos que os vendidos nas farmácias.
A Furp tem isenção do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre a venda do produto – o que, descontando o ICMS embutido no preço da matéria-prima importada pela fundação, seria equivalente a uma isenção de 8%. O captopril (anti-hipertensivo), por exemplo, é vendido a R$ 0,70 (30 comprimidos) pela Furp à Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo. Seu respectivo medicamento de marca, o Capotem (Bristol-Myers Squibb), custa R$ 16,82 na farmácia – uma diferença de 2.303%.
‘‘Não investimos em marketing, usamos embalagens simples e temos isenção do ICMS, o que explica nossos baixos preços. Mas não há explicação para diferenças tão exorbitantes,’’ disse. A Furp ainda tem uma margem de lucro de 12% sobre cada produto, o que é reinvestido na produção.
O Hospital das Clínicas, que produz internamente 215 remédios dos 727 que são consumidos no hospital, também apresentou à CPI diferenças de preços significativas. José D’ Elia Filho, superintendente do HC, citou, por exemplo, o diazepan (ansiolítico). Uma caixa com 20 comprimidos é produzida pelo custo de R$ 0,027 (preço da matéria-prima). Seu respectivo medicamento de marca, o Valium (Roche), é vendido pelo fabricante à farmácia por R$ 3,79 (também com 20 comprimidos) – ou seja, 141 vezes o preço da matéria-prima. Para o consumidor, a caixa com 20 comprimidos custa R$ 5,41 – 202 vezes o preço da matéria-prima. ‘‘A CPI deve investigar o que acontece com os preços das embalagens, do marketing etc.,’’ diz D‘‘Elia Filho.
A CPI vai votar hoje a quebra do sigilo fiscal de laboratórios que estão sob investigação por superfaturamento dos preços dos remédios, formação de cartel e boicote dos remédios genéricos e falsificação de produtos farmacêuticos. A dúvida para a sessão plenária, marcada para as 14h30, é quanto à extensão da lista de quebra de sigilos, segundo o deputado Ney Lopes (PFL-RN), relator da CPI.
‘‘A tendência minha e do (Nelson) Marchezan (presidente da CPI, do PSDB/RS) é de restringir a lista, uma coisa exemplar e significativa para conseguirmos resultados práticos rapidamente,’’ afirmou Lopes. Segundo o relator, além da discussão sobre o critério de escolha dos laboratórios que terão o sigilo fiscal quebrado, está certo que o plenário vai aprovar a quebra de sigilo no caso de falsificação descoberto em Uberlândia.
Há vários requerimentos de quebras de sigilos à espera de votação na CPI dos Medicamentos. Um deles pede a quebra do sigilo fiscal dos 21 laboratórios que participaram de uma reunião, em julho passado, em que supostamente teria sido combinado um boicote aos remédios genéricos. O requerimento é de Fernando Zuppo (PDT-SP).Deputados visitam laboratórios alternativos em São Paulo e encontram diferenças exorbitantes no valor dos remédios vendidos nas farmácias
Agência EstadoINVESTIGAÇÃOMarchezan, o presidente da CPI, conversa com o relator Ney Lopes, durante visita ao laboratório do Hospital das Clínicas