PMs do Paraná começam a usar câmeras nos uniformes
Projeto é piloto e prevê a instalação de 300 câmeras entre cerca de 18 mil policiais; movimento dos Direitos Humanos critica a medida
PUBLICAÇÃO
sábado, 16 de março de 2024
Projeto é piloto e prevê a instalação de 300 câmeras entre cerca de 18 mil policiais; movimento dos Direitos Humanos critica a medida
Simoni Saris - Grupo Folha
O governo do Paraná iniciou neste mês a fase de testes e anunciou para abril a utilização de câmeras de segurança nos uniformes dos policiais militares. A medida é uma reivindicação recorrente da sociedade civil, órgãos do sistema judiciário e de proteção dos Direitos Humanos, que veem no uso dos equipamentos um meio de reduzir e inibir eventuais excessos cometidos no exercício da atividade policial, além de ser uma forma de proteção aos próprios agentes de segurança. Grupos favoráveis ao uso de câmeras corporais, no entanto, põem em dúvida a efetividade da medida em razão do baixo número de equipamentos disponíveis. Segundo informações repassadas a veículos de imprensa pela Polícia Militar do Paraná, serão cerca de 300 câmeras em um universo de aproximadamente 18 mil policiais, o que corresponde ao monitoramento de menos de 2% da tropa.
As câmeras foram alugadas a um custo anual de pouco mais
de R$ 1 milhão ou R$ 84 mil mensais. A empresa contratada para fornecer os
equipamentos é a Tronnix Soluções e Segurança Ltda.,
com sede em Goiânia (GO).
A distribuição dos dispositivos de monitoramento será feita entre agentes da
corporação em todo o Estado, sendo 60 para a Polícia Rodoviária Estadual, divididas
igualitariamente entre Londrina, Maringá e Cascavel. O BPFron (Batalhão de Polícia de
Fronteira) receberá 24 equipamentos e dois batalhões da PM em Curitiba, além de
batalhões em Londrina, Maringá, Ponta Grossa, São José dos Pinhais, Colombo e
Paranaguá contarão com 24 câmeras cada um, totalizando 192 dispositivos.
Em março, 5% do total das câmeras começaram a ser utilizados
em fase de teste. O restante dos equipamentos entra em
operação a partir do mês que vem.
Para o membro do Movimento Nacional dos Direitos Humanos no
Paraná, Carlos Enrique Santana, a quantidade de câmeras a serem disponibilizadas
neste momento está muito abaixo da necessidade. “Trezentas câmeras não dão nem
para cuidar do condomínio onde mora o governador”, comentou ele, que também
questionou o valor do contrato. “Esse preço é um roubo ao erário”, avaliou.
Santana tem uma fala bastante contundente em relação à conduta
da Polícia Militar paranaense. “Se o governo do Estado investigasse os crimes
como se deve, não teríamos policiais assassinos, matando a esmo. Em um estado
onde tem quase 20 mil policiais, colocar 300 câmeras é uma brincadeira de mau
gosto.”
As afirmações de Santana são respaldadas em dados
estatísticos. Um levantamento feito pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de
Combate ao Crime Organizado) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública
aponta Curitiba e Londrina como as cidades que mais registraram MDIP (Mortes
Decorrentes de Intervenção Policial) no Estado no período de cinco anos, entre
2017 e 2022, somando 559 e 226 mortes, respectivamente. Na sequência, estão três
cidades da Região Metropolitana de Curitiba: Colombo (178), São José dos Pinhais
(119) e Piraquara (66).
Em 2022, todo o Estado de Santa Catarina registrou 44 MDIP
enquanto apenas em Londrina foram 50 mortes dessa natureza em igual período. Naquele mesmo ano,
o Paraná contabilizou 488 MDIP contra 106 no Rio Grande do Sul, dois estados com contingente populacional semelhante. São Paulo, com um número
de habitantes quatro vezes acima do Paraná, computou, em 2022, 419 MDIP.
Familiares de pessoas mortas pela polícia se uniram em Londrina no movimento Justiça por Almas – Mães de Luto em Luta, que
cobra providências em relação à letalidade da Polícia Militar no Paraná. Eles afirmam
estar certos da existência de grupos de extermínio dentro da corporação no
Estado e que esses grupos atuariam especialmente nas periferias.
Todos os integrantes do movimento relatam histórias muito semelhantes. Eles afirmam que embora a vítima estivesse desarmada, a versão oficial é de que a morte teria sido decorrência de confronto com a polícia. Hayda Melo da Silva juntou-se ao Movimento Justiça por Almas depois que seu único filho, então com 18 anos, foi morto por policiais militares, em 2022. Como membro do movimento, uma de suas reivindicações é pelo uso de câmeras nos uniformes dos policiais, mas considera "vergonhosa" a forma como essa medida está sendo introduzida no Paraná. “É uma vergonha nosso governador colocar 300 câmeras em quase 18 mil agentes e mais vergonhoso ainda é falar que vai fazer um projeto piloto, sendo que em todos os estados onde as câmeras já são utilizadas já foi comprovado que foi positivo para a população e também para os policiais. Caiu a letalidade policial e caíram também as mortes de policiais por bandidos”, comentou Silva. “E eu duvido que eles vão colocar essas câmeras nos policiais que matam, duvido que vão colocar câmeras nos policiais do Choque e da Rotam (Rondas Ostensivas Táticas Metropolitanas).”
A PM do Paraná foi procurada pela reportagem por dois dias, mas não se pronunciou.