Um estudo da ONU (Organização das Nações Unidas) aponta que a quantidade de lixo eletrônico gerada em 2016 alcançou o recorde de 45 milhões de toneladas, um volume 8% maior em relação a 2014, quando foram descartados 41 milhões de toneladas. A pesquisa, elaborada pela Universidade da ONU em parceria com a União Internacional de Telecomunicações da ONU e Associação Internacional de Resíduos Sólidos, mostra que o peso do lixo eletrônico gerado em 2016 é equivalente a 4.500 torres Eiffel.

A China foi o país que mais produziu esse tipo de resíduo (7,2 milhões de toneladas), seguida pelos Estados Unidos (6,3 milhões de toneladas). Já o Brasil produziu 1,5 milhão de toneladas, sendo o país da América Latina que mais gera esse tipo de lixo. Na América Latina, a estimativa é de que foram geradas 4,2 Mt (uma megatonelada equivale a um milhão de toneladas) em 2016, o que dá uma média de 7,1 kg/habitante.

Durabilidade dos equipamentos e aumento do poder aquisitivo contribuem para o aumento do lixo eletrônico
Durabilidade dos equipamentos e aumento do poder aquisitivo contribuem para o aumento do lixo eletrônico | Foto: Ricardo Chicarelli


Um dos fatores mais graves é que apenas 20% desse lixo eletrônico foram reciclados. A maior parte deste tipo de resíduo – que inclui tudo que possui bateria ou precisa ser ligado na tomada – acaba em aterros sanitários, mesmo que a reciclagem faça sentido economicamente. O valor das matérias-primas, entre elas, ouro, cobre, platina e paládio, contidas neste lixo em 2016 é estimado em 55 bilhões de euros (R$ 213 bilhões).

No Brasil, segundo levantamento da Abetre (Associação Brasileira de Empresas de Tratamento de Resíduos e Efluentes), em 2016 o Paraná aparecia na quarta posição do ranking, com cerca de 86,8 mil toneladas produzidas de resíduo eletrônico, atrás de São Paulo (448 mil t ao ano); do Rio de Janeiro (165,2 mil t); e de Minas Gerais (127,4 mil t). Na região Sul, o Paraná fica quase empatado com o Rio Grande do Sul (86 mil t); e bem acima do volume gerado por Santa Catarina (61,6 mil t).

O professor do curso de engenharia elétrica da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Ewaldo Luiz de Mattos Mehl, explicou que em razão da inexistência de tecnologia economicamente viável é praticamente impossível separar e recuperar os metais valiosos contidos nos equipamentos. "São pequenas quantidades de metal que estão soldadas uma nas outras. A fiação de cobre, por exemplo, está recoberta pelo estanho, pois se ela ficasse exposta oxidaria", descreveu.

Mehl também comentou sobre o material utilizado na fabricação da placa de circuito impresso, que é extremamente duro, o que dificulta a reciclagem. "Tudo isso acaba em aterros. A preocupação é como descartar tudo isso de forma segura. Alguns resíduos são danosos à saúde", alertou. "Metais como o chumbo e o mercúrio infiltram no solo, acabam contaminando o curso d'água e vamos acabar bebendo isso."

Mehl ressalvou que um dos itens que pode ser reciclado e possui viabilidade econômica é a bateria de lítio. "É um metal caro e pode ser reciclado facilmente. As partes plásticas dos equipamentos eletrônicos também podem ser removidas e recicladas", apontou.

Cláudia Mendes é proprietária da Parcs, uma empresa especializada na manufatura reversa de resíduos eletrônicos de Curitiba. "Com exceção do toner, cartuchos e discos de corte, que precisam ser descartados em aterros industriais, eu consigo vender tudo o que coleto. As pilhas, baterias e lâmpadas de vapor eu preciso pagar uma empresa para descontaminar e dar uma destinação correta. Mas as placas de eletrônicos nós mandamos para fora do Brasil, para a Bélgica. Lá eles possuem tecnologia para retirar os metais." Ela destaca que metais como o alumínio, ferro, inox ficam todos no Brasil. "A indústria reaproveita esse material. Com o alumínio dos eletrônicos, por exemplo, eles fazem outros produtos, como janelas."

Mendes destaca que o aumento de lixo eletrônico acontece por causa da durabilidade dos equipamentos. "Antigamente um eletrodoméstico durava bastante, mas hoje ele fica obsoleto muito rápido", afirma ela, destacando também que o poder aquisitivo melhorou em relação a décadas atrás, o que possibilita adquirir produtos com mais facilidade. O professor da UFPR destaca que a geração de lixo está relacionada com o nível de atividade econômica. "Quanto mais rico, mais lixo vai existir", observou.

'Faltam políticas públicas'

Em 2018 a ONG E-Lixo irá completar dez anos de existência e nessa trajetória o volume de lixo coletado aumentou em três vezes. Atualmente são 60 toneladas por mês, das quais 15 toneladas são apenas de Londrina. O presidente da ONG, Alex Gonçalves, observa que são poucas ações promovidas para realizar a reciclagem. "Faltam políticas públicas, incentivo e investimento no setor. Das leis que já existem, poucas são cumpridas. A da logística reversa, por exemplo, ainda está com baixa adesão. A população tem consumido cada vez mais, no entanto com poucas iniciativas para reciclagem", aponta.

Segundo ele, vale a pena investir em reciclagem, pois trata-se de uma área que gera renda e promove qualidade de vida. "O trabalho da ONG demonstra que esse serviço é importante para a região, pois ele não é realizado nem pelo poder público e nem pela iniciativa privada em vários municípios que atendemos. Em 2018 queremos implantar a educação ambiental", aponta.

O presidente da ONG também trabalha em um projeto para criar uma franquia socioambiental que deve seguir os mesmos moldes da ONG e seria implantada em cidades com capacidade de fazer recolhimento. "Quero espalhar essas franquias Brasil afora e se a gente tiver sucesso teremos volume também para exportar os materiais", afirma. Ele explica que o volume atual não seria suficiente para manter contrato com uma empresa de fora. "Teríamos que ter de 10 a 20 toneladas por mês de metal. É uma coisa mais ampla. Nessa nova modalidade vamos conseguir", calcula.

Termos de compromisso com cadeias produtivas

O coordenador de Resíduos Sólidos da secretaria estadual de Meio Ambiente, Vinicius Bruni, informa que termos de compromisso têm sido firmados com diferentes cadeias produtivas. A coleta de pilhas e baterias será realizada em parceria entre a secretaria, a Abinee (Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica) e a ACP (Associação Comercial do Paraná). "Em seguida iniciaremos a discussão da coleta de eletroeletrônicos de pequeno porte, como rádios e aparelhos de som. Já os eletrodomésticos de grande porte, como geladeira, fogão, micro-ondas, serão tratados em uma terceira etapa", apontou Bruni, sem citar prazos.

Sobre a coleta de lâmpadas fluorescentes, que possuem mercúrio e chumbo em sua composição, ele destacou que há um acordo setorial com o instituto das empresas fabricantes. Segundo ele, estão previstos pontos de coleta em Curitiba e em outros quatro municípios, inclusive Londrina. Para se ter uma ideia do risco que se corre, uma lâmpada fluorescente de 32 watts possui potencial para poluir 30 mil litros de água.

De acordo com o presidente da Abetre, Carlos Fernandes, ainda não há no País um grande acordo setorial para a destinação do resíduos eletrônico, como foi feito, por exemplo, com as embalagens de óleo e os pneus. "No caso dos eletrônicos, quase todos os produtos comercializados e posteriormente descartados são importados e, evidentemente, o importador deve ser parte integrante da cadeia de responsabilidade pelo resíduo gerado.

O executivo aponta ainda o fator cultural como entrave para a logística reversa. "Mais de 500 milhões de equipamentos eletrônicos permanecem sem uso nas residências brasileiras."