Pinochet foi de alguma forma punido, mas faltam muitos Do correspondente Gilles Lapouge2/Mar, 18:02 Paris, 02 (AE) - Poucos comentários devido à hora da notícia. Quem melhor sintetiza o sentimento de muitos franceses é o mais célebre cartunista francês, Jean Plantu, na primeira página do Le Monde. Seu desenho mostra dois homens, um é americano, Odell Barnes, que foi executado quarta-feira à noite, no Texas, o estado assassino por excelência, clamando sua inocência. O segundo é Pinochet, com seus óculos negros, que sai de sua bela residência inglesa e vai pegar o avião. Eis a legenda: Odell Barnes pergunta a Pinochet: "O que permite ser libertado?" E Pinochet lhe responde: "O que permite ser inocente?" Mas, enfim, terminou e acredita-se ouvir o "desprezível alívio" de Tony Blair que discute com o general havia 16 meses. O que mais dizer? Durante esses 16 meses teve-se tempo de ouvir os argumentos dos dois lados. Como acrescentar o que quer que seja? Pode-se espantar com algumas anomalias: Pinochet estava em um estado físico e cerebral tal que um julgamento "não poderia ser justo", repetiu o ministro inglês do Interior, Jack Straw, que teve de tratar desse "abacaxi". Bem, mas por que então ter ignorado os países que, como a França, demandaram a realização de um novo exame em Pinochet? Onde estava o perigo, se Pinochet for realmente esse cérebro desertado? Admitamos, no entanto, que Pinochet não compreende mais nada. Que sua memória é um grande e lúgubre vazio, um cemitério de esquecimentos. Mas neste caso, o que se faz com que o inglês Patrick Robertson ouse dizer que "Pinochet estava nitidamente nervoso e ansioso antes da decisão"? Para um profundo gagá, o general estava, então, bem lúcido. Outro comentário, o de Pierre George, também no Le Monde (único jornal a falar do assunto, pois sai à tarde): "Dezesseis meses: teríamos tempo de julgá-lo, se as vias da justiça não fossem tão dilatórias quanto cheias de precauções". Isso é uma condenação, uma crítica? Talvez, mas pode-se ler as coisas inversamente e dizer, ao contrário, que precisamente a honra dos homens, a honra da democracia é que não se mata um homem sem acumular as precauções, as reflexões, as regras, as indagações. Realmente é essa a principal diferença entre a honra e a infâmia: os assassinados do Chile não se beneficiaram de proteções jurídicas tão minuciosas. Muitos criticam que um processo não tenha permitido fornecer ao mundo inteiro as provas do crime. Outros, mesmo horrorizados com o velho general, pensarão que um homem tão decrépito, às portas da morte, deveria ser remetido simplesmente à sua noite e a seus monstros. As duas atitudes são possíveis. Pessoalmente, é em um outro prisma que gostaria de ler a libertação do amigo de Margaret Thatcher: há 16 meses, foi um personagem com vivacidade que chegou a Londres. Mesmo depois de preso, sob a petição do juiz espanhol Baltazar Garzon, ele vangloriou-se diante do tribunal de Bow Street, invocando sua "alta idéia de honra". O homem que partiu, hoje, para sua terra natal não tem honra. "É um covarde patético que fez tudo para evitar a justiça", resumiu o deputado trabalhista inglês, Jeremy Corbyn. É nesse sentido que a atitude do juiz espanhol Garzon, sem dúvida, entrará para a história do direito internacional. Mesmo se, de fato, a minuciosa justiça inglesa libertou Pinochet, a partir de agora o general é desprezado mundialmente. Além disso, pelo menos teoricamente, nenhum país civilizado, mesmo a Grã- Bretanha, mesmo a França (que acolheu vários tiranos do Terceiro Mundo) poderá servir de "exílio", pois algo mexeu no direito das nações. Foi o que disse a Anistia Internacional, com ingenuidade: "O precedente estabelecido graças a essa questão continua a ser o mais importante para a justiça internacional desde Nuremberg. A partir de agora está claro que os crimes de tortura podem ser julgados em qualquer lugar do mundo independentemente do local em que o crime tenha sido cometido". Se a análise da Anistia Internacional estiver correta, é possível dizer que o velho tipo de Santiago pelo menos terá rendido esse serviço aos homens, à liberdade. Infelizmente, nada menos garantido: Vladimir Putin provocou o massacre de milhares de chechenos, provocou a morte de soldados, mulheres, crianças, e os ministros ocidentais consideram-no muito "patriota". Como eles são distraídos, nada dizem sobre Grosny e os crimes. E Milosevic em Belgrado? E as pessoas da ELK no Kosovo? E os tiranos que asfixiam o Congo democrático, o Sudão e tantos países africanos, tantos países da ásia? O caminho a ser percorrido ainda é longo.