O nome do pecuarista Mauro Janene, condenado pelo assassinato da professora Estela Pacheco, voltou ao noticiário na última semana de agosto após se entregar à Polícia Civil para cumprir a pena de 10 anos e seis meses em regime fechado pelo assassinato ocorrido em 14 de outubro de 2000, em edifício de luxo em bairro nobre de Londrina. O júri de Janene só ocorreu em 2018, quando houve a condenação, e a Justiça aguardava o julgamento de um agravo regimental pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que foi negado.

Durante todo o processo do assassinato de Estela Pacheco, Janene permaneceu em silêncio e sempre recusou entrevistas. A única vez que ele decidiu falar sobre o caso foi na investigação pelo podcast “Banco dos Réus”, em 2022, uma produção do Grupo Folha de Londrina com ICFJ (International Center for Journalists), Meta, ANJ (Associação Nacional de Jornais) e Aner. Em entrevista, o pecuarista chegou a falar sobre seu desejo de cumprir a pena. Trecho da entrevista do assassino condenado de Estela foi publicado no terceiro episódio, “O enigma da sacada”, que reconstitui a noite da morte da professora com uma extensa pesquisa documental e entrevistas com personagens envolvidos no caso - como peritos que estiveram na cena do crime e promotores de justiça. Além disso, o podcast publicou um episódio bônus com outros trechos da entrevista exclusiva com Janene, que quebrou o silêncio e contou sua versão sobre a noite de 14 de outubro de 2000.

A editora gerente de produtos digitais da FOLHA, Patrícia Maria Alves, afirma que entrevistar Janene “foi um momento intenso, difícil” e a primeira vez que ele falou durante todos os anos em imbróglio judicial.

“Trazer voz ao assassino, para que todos o conheçam, o escutem, é mostrar que ele é um homem comum”, citando que muitos agressores são íntimos das mulheres. “Janene, assim como os outros assassinos, são pessoas comuns, que às vezes colocamos em um lugar distante e não olhamos a realidade que vivemos como se pudesse ser alguém do nosso circulo mais íntimo. O podcast veio como um alerta para todas as mulheres, para que possam olhar ao seu redor e, se estiverem em uma situação de risco, possam sair antes do pior.”

Alves diz que o intuito da produção foi resgatar essas histórias em que, devido ao tempo, não houve justiça para as vítimas. A partir do jornalismo investigativo e combatendo a desinformação causada pelos longos anos de espera, ela afirma que o fechamento do caso com a prisão é uma vitória.

“A nossa proposta com o podcast era visibilizar essas mulheres que por muito tempo não tiveram justiça e seus familiares que viveram com a dor de ver seus assassinos soltos. A prisão do Janene para nós foi um momento de vitória, e assim gostaríamos que fosse com os outros assassinos”, acrescenta.

Banco dos Réus

O documentário em áudio aborda a história de cinco mulheres vítimas de crimes emblemáticos ocorridos em Londrina entre 1989 e 2019 que em 2022 - ano de lançamento do documentário, ainda não haviam encontrado justiça.

EPISÓDIOS

O documentário investiga, no episódio “Fúria e sangue no 12° andar”, a morte de Fernanda Estruzani, que foi esfaqueada 72 vezes pelo ex-marido, Marcos Campina Panissa, em 1989. Mesmo confessando o crime, ele nunca foi preso.

O segundo episódio, “O crime do triplex”, acompanha a história da empregada doméstica Cleonice de Fátima Rosa, encontrada morta na escadaria de acesso ao apartamento dos patrões, em 1993. A artista plástica Vanda Pepiliasco foi condenada pelo crime.

A morte de Amanda Rossi é investigada no episódio “Morte na casa de máquinas”. O caso aconteceu em 2007, quando a jovem, com 22 anos, foi morta por asfixia na faculdade em que cursava educação física. Ninguém foi preso.

O penúltimo episódio do podcast aborda a morte da servidora pública Daniela Pergo, em 2019. Ela foi alvejada com quatro tiros na cabeça, ainda em seu carro, quando saia de casa para trabalhar. Essa é mais um caso sem solução até o momento.

“Carta na mesa” encerra a produção fazendo um balanço dos casos e promovendo uma discussão sobre a equidade nos julgamentos. A cultura de culpar as vítimas por suas tragédias pessoais também é abordada no episódio.

PRODUÇÃO

O podcast “Banco dos Réus” foi uma produção oriunda do programa “Acelerando a Transformação Digital”, da ANJ (Associação Nacional de Jornais) e Aner (Associação Nacional dos Editores de Revistas), em parceria com o ICFJ (Centro Internacional para Jornalistas) e o Meta Journalism Project.

A partir do financiamento do programa, foi possível a construção do estúdio FolhaCast, onde foram gravados os episódios. Mas, a produção começou ainda em 2019, com o levantamento de dados e das histórias das vítimas.