Paraná tem baixo índice de esclarecimento de assassinatos
Relatório do Instituto Sou da Paz apontou que apenas 31% dos homicídios ocorridos em 2016 foram denunciados até o final do ano seguinte. Polícia Civil diz que há melhora nas taxas. Para investigadores e peritos, falta pessoal
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quarta-feira, 13 de novembro de 2019
Relatório do Instituto Sou da Paz apontou que apenas 31% dos homicídios ocorridos em 2016 foram denunciados até o final do ano seguinte. Polícia Civil diz que há melhora nas taxas. Para investigadores e peritos, falta pessoal
Rafael Costa - Grupo Folha
É recorrente a ideia de que a prática de crimes como o homicídio no Brasil é encorajada por uma legislação branda. Um outro fator da equação, contudo, coloca dúvidas sobre iniciativas que visam tornar as punições mais severas com o objetivo de dissuadir a ação de criminosos: a maioria desses crimes nem chega a ter o autor identificado.
Um estudo do Instituto Sou da Paz apontou que o Paraná denunciou apenas 31% dos homicídios ocorridos em 2016 até o ano seguinte — taxa comparativamente baixa em relação a outros Estados e inferior à registrada no ano anterior (40,5%).
O índice corresponde a menos da metade da taxa de elucidação de Santa Catarina no mesmo período (69,5%) e fica abaixo também de São Paulo (50,8%) e do Rio Grande do Sul (58,4%) (veja infográfico).
Segundo o relatório, o Paraná denunciou em 2017 apenas 13% dos homicídios ocorridos naquele ano, o que poderia reforçar uma tendência de queda na elucidação já observada em 2015 e 2016.
O intervalo entre as ocorrências e a divulgação considera tanto o prazo necessário para as investigações e denúncias quanto para a própria coleta e análise dos dados. Não há indicador nacional oficial e apenas doze Estados enviaram informações consistentes ao Instituto Sou da Paz.
“São 70% de homicídios que não geraram denúncias [no Paraná]. A chance de um homicida se safar é altíssima”, destaca Stephanie Morin, gerente de Gestão do Conhecimento do instituto. “Isso acaba alimentando o ciclo de violência, levando pessoas a buscar justiça com as próprias mãos e abalando a confiança nas leis e instituições”, avalia, em entrevista à FOLHA. Para Morin, a certeza da punição é um dos desestímulos mais importantes a delitos. “Não adianta mexer nas leis sem investir fortemente na investigação.”
MELHORIAS
Procurada para se pronunciar sobre os índices, a Sesp (Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária) respondeu que o assunto deveria ser tratado com a PCPR (Polícia Civil). Por meio de assessoria de imprensa, a polícia informou que não comentaria dados referentes a gestões anteriores, mas afirmou que a tendência é de melhora.
Segundo a instituição, o percentual de homicídios de 2019 com autoria conhecida chegou a 61% no interior do Estado. O órgão não forneceu índices dos anos anteriores.
Em Curitiba, o percentual de homicídios e feminicídios com autoria conhecida está em 54,7% até setembro. Nos anos anteriores, as taxas consolidadas foram de 39% em 2018, 34,2% em 2017, 30% em 2016 e 33,8% em 2015. Os dados não podem ser diretamente comparados com os do estudo do Instituto Sou da Paz, já que se referem a identificação de autoria, e não a denúncias.
De acordo com a delegada da DHPP (Divisão de Homicídios e Proteção à Pessoa), Camila Cecconello, a polícia está investindo mais em provas técnicas e cruzando investigações sobre homicídio com informações de inteligência sobre facções criminosas, o que estaria contribuindo para um aumento da elucidação dos casos. “Consegue-se, às vezes, a partir de uma prisão, solucionar 15 inquéritos”, explica. Segundo a PCPR, também houve incremento do atendimento imediato ao local do crime.
Principal gargalo é a falta de pessoal
Fontes da área de investigação e perícia do Paraná ouvidas pela FOLHA apontaram a falta de pessoal como o principal gargalo para o aumento dos índices de esclarecimento de homicídios dolosos no Estado.
O emprego de policiais em funções burocráticas e na guarda de presos em delegacias também contribuiria para a dificuldade em solucionar os crimes. “A Polícia Civil está assoberbada de atividades que não são dela”, disse o presidente do Sipol (Sindicato dos Investigadores da Polícia Civil do Estado do Paraná), Roberto Ramires.
A PCPR disse reconhecer a necessidade de contratações e destacou que estão autorizados concursos públicos para 400 policiais civis. “São muitos homicídios e é um crime extremamente complexo de ser investigado. Por isso, países que têm pouquíssimos homicídios e muitas pessoas investigando têm taxas de elucidação mais altas”, diz a delegada Camila Cecconello.
Quanto à perícia, as dificuldades são maiores em cidades do interior. “A Polícia Científica não está em todas as áreas do Estado, o que gera deslocamentos muito grandes. Em muitos casos, a perícia nem é chamada”, diz o presidente do Sinpoapar (Sindicato dos Peritos Oficiais e Auxiliares do Paraná), Paulo Zempulski. “Isso contribui para prejudicar a qualidade dos inquéritos e a resolutividade dos crimes.”
“[O índice de elucidação] com certeza passa pelo baixo número de peritos no Paraná”, concorda o presidente da ABC (Associação Brasileira de Criminalística), Leandro Cerqueira Lima. “Por mais que tenha boa vontade do policial civil ao atender a ocorrência, se não houver uma perícia adequada, não haverá resultados satisfatórios”, aponta.
Segundo Stephanie Morin, gerente de Gestão do Conhecimento do Instituto Sou da Paz, a disparidade dos índices de resolução entre os Estados tem, de fato, ligação com a variação de investimentos em policiamento. “Especialmente nos Estados com desempenho inferior, faltam policiais e técnicos, de forma que a qualidade das provas varia muito e predominam provas testemunhais”, explica.
De acordo com Morin, também há melhores resultados nos Estados em que há comunicação constante entre todos os órgãos envolvidos no processo criminal desde a investigação.