O Paraná é o terceiro estado com maior número de municípios que adotam a tarifa zero no transporte coletivo, atrás de São Paulo e Minas Gerais. Por aqui, 11 cidades usam o chamado passe livre nos ônibus: Cianorte, Clevelândia, Ibaiti, Itaperuçu, Ivaiporã, Matinhos, Paranaguá, Pitanga, Quatro Barras, Rio Branco do Sul e Wenceslau Braz.

A gratuidade vem sendo debatida na Câmara Municipal de Londrina desde novembro, quando o presidente do Legislativo, Emanoel Gomes (Republicanos), apresentou um projeto de lei que prevê a tarifa zero. Pela proposta, seria criado um fundo para custeio do benefício, com recursos da prefeitura, governo do Estado e União. A medida, que passaria a valer em 2027, é analisada pela Frente Parlamentar para Viabilização do Programa Tarifa Zero.

RECURSOS

Em entrevista à FOLHA, o prefeito Marcelo Belinati (PP) afirmou ser favorável ao passe livre no transporte da cidade. No entanto, ponderou que é preciso cautela para verificar de onde sairiam os recursos.

“É uma ideia muito bacana. Eu creio que todas as cidades do Brasil gostariam de praticar a tarifa zero. Mas não existe nada de graça. O custo do transporte em Londrina é de aproximadamente R$ 215 milhões por ano. Você teria que analisar de onde vem as fontes para arcar com esses custos. E são recursos que poderiam ser utilizados em outras esferas da administração como saúde, educação, asfalto ou outras políticas públicas. O transporte é uma política pública importante, mas a grande dificuldade é onde conseguir R$ 215 milhões para praticar a tarifa zero”, considerou.

A mesma análise é feita por Marcelo Cortez, presidente da CMTU (Companhia Municipal de Trânsito e Urbanização). Desde o último dia 1º de janeiro, o município aumentou o valor da tarifa para R$ 5,75.

“Acho a discussão válida, pois o transporte coletivo passa por um momento difícil em todo o país. No entanto, a forma com que se discute precisa acontecer dentro da legalidade, em especial, das fontes de custeio”, pontuou.

DISCUSSÕES POLÍTICAS

O professor Lafaiete Santos Neves, doutor em Desenvolvimento Econômico pela UFPR (Universidade Federal do Paraná) e especialista em transporte coletivo, avalia que as discussões que envolvem a tarifa zero nas cidades são políticas e carecem de força de vontade dos gestores. “O prefeito de São Paulo implantou a tarifa zero aos finais de semana no domingo, já temos 11 cidades no Paraná com tarifa zero, então não há desculpa alguma. A decisão é completamente política para não se indispor”, afirmou à FOLHA.

Conforme Neves, para tirar o projeto da tarifa zero do papel é necessário alterar o sistema de cálculo do transporte. “Primeiro é preciso mudar a metodologia de cálculo da tarifa. A atual metodologia de cálculo é de 1987 da época do Geipot, que era um órgão federal que cuidava do transporte público. O Geipot calculava o número de passageiros por quilômetro e é o que acontece até hoje. Essa fórmula de cálculo é que torna a tarifa explosiva para o usuário, porque a tarifa nada mais é que a divisão do custo total pelo total de passageiros. Com o número de passageiros diminuindo a tarifa sobe”, explicou.

O prefeito Belinati cita que não existe tarifa zero, pois o custo é pago de alguma forma. “Quando você vê em algumas cidades eles colocando que é tarifa zero, não é tarifa zero. A prefeitura está pagando o transporte do município”, concluiu.

QUALIDADE DE VIDA

Investimento que para o Lafaiete Santos Neves rapidamente retorna aos cofres da prefeitura, já que na avaliação do economista os trabalhadores passam a gastar o dinheiro de outra forma.

“Com a tarifa zero, o trabalhador economizará 30% do salário mínimo, que será revertido na melhor qualidade de vida da sua família. As prefeituras com esse acréscimo de consumo aumentarão a arrecadação de ICMS, que pagará o custo da tarifa zero”, destacou.

O projeto que tramita na Câmara de Londrina indica que o transporte é considerado um direito social, razão pela qual se propõe um sistema único, assim como ocorre com o SUS (Sistema Único de Saúde). A justificativa é a mesma defendida pelo professor Neves.

“A tarifa zero é muito mais do que uma simples tarifa. Ela vai dar a liberdade de mobilidade para população de baixa renda, que é composta de trabalhadores. Hoje o trabalhador só conhece o seu local de moradia e o local onde trabalha, isso é semiescravidão. A tarifa zero vai acabar com a semiescravidão e para mim esse é o valor universal maior dela”, finalizou.

EXEMPLO QUE DEU CERTO

Em Wenceslau Braz (Norte Pioneiro), a 215 quilômetros de Londrina, a tarifa zero existe desde 2009. A cidade tem cerca de 20 mil habitantes e criou um sistema que, de acordo com o prefeito Atahyde Ferreira dos Santos Júnior, tem dado certo nesses quase 15 anos.

“Isso (tarifa zero) no meu primeiro mandato, quando começou, eu achei que eu precisava dar uma força em questão de geração de emprego que estava meio pra baixo. O custo é significativamente barato, não é um custo caro. Nós fazemos até no sábado na hora do almoço, fazemos a última viagem às 13h. No domingo e sábado à tarde não funciona o circular. Enfim, a gente achou um cronograma que está funcionando”, disse à FOLHA.

A manutenção da frota é feita pela própria prefeitura. Neste ano, estão previstos investimentos para melhorar o sistema. “A manutenção do ônibus é feita por nós mesmos. Então, o valor é compatível para gente trabalhar [...] Estamos investindo em uma frota nova e remodelando o trajeto para que a gente possa atender cada vez melhor a população”, afirmou.

Orgulhoso pelo projeto ter funcionado, o prefeito acredita que pode ter sido exemplo para outras cidades no país. “Acredito que a gente pode servir de exemplo. Acho que nós fomos, não digo pioneiros, mas um dos primeiros a implantar isso. A gente deve ter dado algum incentivo para que outros tomassem essa atitude. É lógico que em cidades grandes, com distâncias grandes, é mais complicado lidar com isso, porque as despesas aumentam”, ressaltou.