Para economistas, mudanças nas leis devem acompanhar o novo pacote
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sábado, 15 de janeiro de 2000
Quito, 15 (AE) - Há uma unanimidade entre os economistas e empresários equatorianos, independentemente de gostarem ou não da dolarização: se ela não vier acompanhada de uma série de mudanças na legislação com vistas a reduzir o déficit público (de 4% do PIB em 1999) e aumentar a competitividade, o país afundará de vez.
A razão é simples. Ao adotar o dólar, o governo se privou do recurso à emissão de moeda, que, embora inflacionário, cobria seus gastos. Com a lei garantindo a conversão de 25.000 sucres por dólar, a liquidez do país passa a depender do ingresso de divisas.
O governo fixou, no domingo, o dólar 20% acima do câmbio de sexta-feira, para ter alguma folga na conversão dos sucres em circulação. Pela nova cotação, eles foram estimados em US$ 650 milhões, enquanto as reservas oficiais são de US$ 850 milhões - embora alguns economistas acreditem que estejam abaixo disso.
Também por falta de divisas, o governo adiou em até dez anos o descongelamento de depósitos. De acordo com o economista Carlos Cortez, quando foram congelados, em março de 1999, os depósitos, no montante de 17 trilhões de sucres, valiam US$ 1,7 bilhão, já que o dólar estava cotado a 10 mil sucres. Hoje, com o dólar a 25.000 sucres, os mesmos depósitos valem US$ 680 milhões. Eles compõem a chamada "base monetária ampliada".
A capacidade do governo equatoriano de fazer uso da poupança interna para financiar seu déficit, lançando títulos da dívida pública, é muito restrita. O mercado financeiro é rudimentar e a bolsa de valores, quase irrelevante. Tanto assim que a dívida pública de US$ 13,7 bilhões - para um PIB de US$ 13 bilhões - é exclusivamente externa.
As exportações geraram superávit de US$ 1,5 bilhão no ano passado, mas graças ao encolhimento de 7,3% do PIB. Em 1998, quando a economia cresceu 0,4%, houve déficit comercial de US$ 1 bilhão.
Uma das saídas para obter recursos seria a privatização. A Ecuatoriana de Aviación foi a única empresa privatizada até agora. O simples anúncio de planos de privatizar as estatais do petróleo já levou os petroleiros à greve.
"Tenho procurado encontrar pelo menos uma vantagem na dolarização, mas não consigo", diz o economista Oswaldo Dávila. "O Equador é exatamente o tipo de país que não poderia ter feito isso." Dávila admite, no entanto, que a dolarização conteve a desvalorização do sucre e reduziu as taxas de juros (de 110% para 22%). Mas aponta três passos para que a dolarização não resulte em mais inflação com recessão: aceitação social da medida; acordo político sólido e amplo o suficiente para sustentar o novo modelo; e aprovação de reformas constitucionais e leis ordinárias.
"Saímos do esquema destrutivo de comprar insumos em dólares e vender em sucres", festeja o presidente da Câmara de Agricultura, Teodoro Gallego. "Mas é preciso aprovar o pacote adicional de medidas que acompanha a dolarização; se não, ela nos conduzirá à miséria." O presidente da Câmara de Comércio de Quito concorda: "A dolarização é o primeiro passo; agora, precisamos ser mais competitivos."
"Além de recuperar a confiança, a dolarização abre as portas ao investimento estrangeiro", completa o economista e empresário Roberto Goldbaum. "Mas, se não vier acompanhada de outras medidas, será um desastre."
Há um consenso entre a maioria dos economistas e o governo quanto às medidas complementares necessárias: lei de deságio para reduzir os altos juros dos investimentos de longo prazo; flexibilização das leis de ingresso de capitais e das leis trabalhistas; reforma da previdência; e reforço da supervisão bancária, entre outras.
O governo tem planos de afrouxar a estabilidade dos funcionários públicos, para reduzir a folha de pagamentos. Esse item faz parte de uma ampla flexibilização trabalhista, que introduziria remuneração por hora e contratações temporárias.
O argumento é o de que, com a dolarização, as empresas equatorianas terão de se tornar mais competitivas, porque desaparece o recurso da desvalorização cambial para facilitar as exportações.
Muitos economistas prestigiados abraçaram a causa da flexibilização, como chave para a estabilidade e o crescimento, no médio prazo. Esse promete ser um dos debates mais apaixonados no país. Perplexos com tantas novidades, os sindicatos ainda não entraram nele. (L.S.)