País gasta mal verbas destinadas à área social, revela estudo da ONU
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quarta-feira, 12 de janeiro de 2000
Por Wilson Tosta
Rio, 12 (AE) - Um estudo da Comissão Econômica para a América Latina (Cepal) das Nações Unidas que comparou gastos sociais de 13 países latino-americanos e caribenhos mostra que o Brasil é o país da lista que destina mais recursos ao setor, mas permanece em situação ruim ou apenas regular na área. De acordo com números do trabalho "Gasto Público em Serviços Sociais Básicos na América Latina e Caribe: Análise sob a Perspectiva 20/20", o País gastou, de 1994 a 1996, US$ 741 em média per capita no setor, mas ficou em quinto em desenvolvimento humano e é o quarto com mais analfabetos dentre os pesquisados.
"O País gasta muito na área social, mas gasta mal", disse o economista Ib Teixeira, da Fundação Getúlio Vargas, que analisa o estudo na revista "Conjuntura Econômica" de janeiro. Segundo ele, é possível que as crises tenham reduzido os recursos sociais, mas a posição relativa dos países é a mesma. Além do Brasil, foram pesquisados Belize, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Equador, El Salvador, Guatemala, Jamaica, Nicarágua, Peru e República Dominicana. Uruguai e Argentina foram excluídos, provavelmente, segundo Teixeira, por terem índices sociais acima dos demais.
A Iniciativa 20/20 é resultado da Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social, realizada em Conpenhage, Dinamarca, em 1995. Ela estabeleceu, para alçançar a meta de cobertura universal de serviços sociais básicos, o investimento de 20% dos recursos públicos na área e de 20% dos empréstimos internacionais para desenvolvimento social. De acordo com um estudo feito por pesquisadores brasileiros, usado pela Cepal, o Brasil destinou, em 1995, 20,9% de seu PIB aos gastos sociais (a média de 17 países da região foi de 10,8%).
Descontados gastos financeiros e transferências, o Brasil destinou 63% das verbas à área social, mas só 8,2% aos setores básicos, como educação, saúde, saneamento, alimentação e nutrição. De acordo com o estudo dos pesquisadores brasileiros usado pela Cepal, a maior parte dos investimentos sociais do Brasil vai para as classes média e alta. O trabalho da comissão é de Enrique Ganuza, Arturo León e Pablo Sauma e foi concluído em 1999. Números - Em números brutos, o Brasil está, de fato, bem à frente dos outros em investimentos sociais. O segundo colocado no ranking é o Chile, com US$ 651 per capita de 1994 a 1996. Terceiro lugar nessa lista, com US$ 521, a Costa Rica supera os brasileiros em alguns indicadores sociais e apresenta desenvolvimento humano (qualidade de vida, segundo a Organização das Nações Unidas) acima do brasileiro.
Mesmo a Colômbia, com US$ 284 per capita, supera o Brasil em alguns índices, como o de mortalidade infantil, em que registra 30 por mil nascidos vivos, mais que os 42 do Brasil. Nos principais indicadores relacionados aos serviços sociais básicos, o Brasil só lidera positivamente em taxa de escolaridade bruta (100), mesmo assim empatado com a Colômbia e a Costa Rica.
Em taxa de analfabetismo, com 19%, o País fica atrás apenas da Guatemala (35%), da Nicarágua (34%) e de El Salvador (29%); em mortalidade infantil, está à frente apenas de Bolívia (66 por mil nascidos vivos), Guatemala (46), Equador (46), Peru (45) e Nicarágua (43). Em expectativa de vida ao nascer, o Brasil é o 9º colocado, com 68 anos, empatado com Peru e Nicarágua e à frente da Guatemala (64) e da Bolívia (61). A líder é a Costa Rica, com 77, seguida do Chile, com 75.
Doenças - No item porcentual da população infantil imunizada, o Brasil, com 79%, está empatado com a República Dominicana e à frente apenas de Bolívia (78%), Guatemala (76%), Equador (74%) e Colômbia (74%). A taxa de desnutrição infantil brasileira (15) é pior que a chilena (1), boliviana (12), colombiana (8), costa-riquenha (2), salvadorenha (11), jamaicana (10), peruana (11) e dominicana (11%).
O País consegue indicadores melhores em cobertura pré-natal (86%) - mesmo assim atrás de Chile (100%), República Dominicana (96%), Belize (95%), Costa Rica (92%) e Nicarágua (87%) - e em partos atendidos por pessoal capacitado. Nesse último indicador, o Brasil chega a 92%, embora atrás do Chile (100%) e Costa Rica (97%). Os brasileiros habitam o 9º país em pobreza entre os pesquisados, segundo o Índice de Pobreza Humana (IPH), que é de 15,8. O Chile é o que tem menos pobres na listagem (4,8), e a Guatemala, o país com mais (28,3).
Qualidade de vida - O atraso social do Brasil também se reflete no Índice de Desenvolvimento Humano, indicador que mede a qualidade de vida. O País não é considerado como de alto desenvolvimento (acima de 0,800). Nesse caso, de acordo com números de 1997, estão apenas Chile (0,844) e Costa Rica (0 801). O Brasil é considerado de médio desenvolvimento (mais de 0 500 e menos que 0,800), mas, com 0,739, está atrás da Colômbia (0,768) e do Equador (0,747) e está empatado com o Peru.
"O atraso relativo do Brasil é muito grande", disse Teixeira. "O Chile (praticamente) não tem analfabetos".