Qual é o seu nome? Embora a pergunta seja simples, a resposta pode ter mudado nos últimos dias para algumas pessoas. Isso porque a nova legislação federal (nº 14.382/22), antiga Medida Provisória que tratava da prestação de serviços on-line pelos cartórios, e que foi convertida na nova Lei de Registros Públicos no último dia 27 de junho, permite a alteração do nome diretamente em Cartório de Registro Civil, independentemente de prazo, motivação, gênero, juízo de valor ou de conveniência (salvo suspeita de vício de vontade, fraude, falsidade, má-fé ou simulação) e de decisão judicial. A medida é válida no Brasil para qualquer pessoa maior de 18 anos.

Gustavo Alves de Carvalho foi uma das primeiras pessoas a solicitar a alteração de seu nome no Paraná
Gustavo Alves de Carvalho foi uma das primeiras pessoas a solicitar a alteração de seu nome no Paraná | Foto: Arquivo Pessoal

O presidente do Irpen/PR (Instituto do Registro Civil das Pessoas Naturais do Estado do Paraná), Mateus Afonso Vido da Silva, explicou que os cartórios terão capacidade de atender todos que desejarem realizar a mudança. “Com isso, os cartórios mostram, mais uma vez, que estão aptos a realizarem serviços que antes eram exclusivamente judiciais.”

Devido à importância que o nome tem na vida de um cidadão, a justiça trata de defendê-lo contra qualquer ameaça de terceiros, e por isso existe a necessidade do registro de nascimento no início da vida da pessoa natural. É nesse sentido que o processo de alteração de nomes no Brasil sempre foi difícil, para evitar eventuais alterações indesejáveis para a segurança das relações jurídicas. Mas nem todos se identificam com o nome que recebem.

O nome é composto por duas partes: prenome (primeira parte do nome e que é escolhido pelos pais para a distinção dos demais membros da família) e sobrenome (também chamado de nome de família, que indica o parentesco da pessoa). Ou seja, o patronímico é um nome recebido por meio da genealogia, um nome transmitido.

NUNCA GOSTEI DO MEU NOME

Quando a pessoa que o recebe não se identifica como tal, pode gerar crise de sentimentos. Foi o que ocorreu com um técnico em telecomunicações no Paraná, cujo nome Jorge Luiz Alves de Carvalho nunca o agradou. “Segundo a minha mãe, recebi o nome Jorge em homenagem ao meu avô, que é Jorge também. Seria só Jorge, mas falaram para ela colocar o Luiz na frente para complementar”, apontou. “ Desde criança eu nunca gostei do meu nome. Como antigamente não podia mudar, mantive o nome.”

Com o advento da nova legislação, ele vislumbrou a possibilidade de realizar o antigo desejo de ter outro nome e foi um dos primeiros em Curitiba a realizar a troca. Logo o outrora Jorge Luiz se tornou Gustavo. “Na verdade, a escolha foi bem aleatória. Tinha alguns nomes no meio, mas o nome Gustavo ainda não havia surgido. Foi quando recebemos um e-mail com esse nome e minha esposa falou que Gustavo era uma boa opção”, destacou.

Ele explicou que o processo foi rápido. “Para dar entrada no cartório, eles pedem várias certidões, mais ou menos umas 18 delas, e todas devem ser autenticadas. Quando você consegue todas as certidões, é preciso pagar a taxa para fazer a alteração na certidão de nascimento. Depois que eu dei entrada no processo, no mesmo dia já saí com o nome novo na minha certidão. Entre as certidões que eles pediram e a entrada no processo gastei aproximadamente R$ 800”, contabilizou.

Atualmente ele possui um apartamento em seu nome antigo e terá de fazer uma retificação. Em relação às contas bancárias, ele espera que ao atualizar o CPF os bancos mudem automaticamente o seu nome com os dados da Receita Federal. “Acho que em uns dois meses eu consigo regularizar tudo”, projetou.

“Parece que a ‘ficha ainda não caiu’ depois que eu mudei o nome. Demorou uns dias para eu me acostumar. A minha esposa ainda me chama de Jorge e eu falo que agora é Gustavo. Acho que vai levar um tempo para se acostumar. Tem um pessoal que ainda me chama de Jorginho. Na minha família, alguns aceitaram e outros não acharam muito legal. Mas é uma questão de gosto pessoal e quando fiz o processo fiquei bem feliz de conseguir realmente mudar.”

"NÃO É PARA APAGAR O PASSADO"

A diretora acadêmica do Irpen/PR, Maria Fernanda Meyer Dalmaz, explicou que a alteração é realizada no nome, mas que os números de RG e CPF vão permanecer os mesmos. Ela reforçou que todas as documentações solicitadas são para evitar que a pessoa mude o nome para apagar o passado. “Basicamente é o RG e CPF e as certidões de registro civil atualizadas, como nascimento e casamento. Quem é casado mais de uma vez, deve ter a certidão dos casamentos anteriores, dos divórcios e do novo casamento. Os registradores civis podem pedir cópia de passaporte, certidão de distribuição e ações judiciais do foro cível ou também criminal, decisão de execução criminal, certidão do protesto da justiça eleitoral, da justiça do trabalho, da justiça militar. É uma série de análises que é feita para poder deferir ou não a alteração do nome”, explicou.

Questionada se o registrador civil porventura deixar passar algo que possibilite fraude, Dalmaz respondeu que é um risco que todo mundo corre. “Um risco que já existe e não é novo é de uma pessoa já casada casar de novo. Para eu ver se ela é mesmo solteira, eu vou pedir certidão de nascimento atualizada, mas ela vai ser emitida em um prazo de 60 a 90 dias. Eu não tenho como garantir 100% de certeza que a pessoa não casou nos últimos 10 dias, por exemplo. Todas as cautelas que eu devo tomar para evitar que aconteça um tipo de fraude, eu devo tomar. E se mesmo assim a pessoa trocou de nome usando da má-fé mesmo e não foi percebido isso pelo registrador, eu não vejo como vir a ter uma responsabilização pelo registrador, que tomou todas as cautelas devidas”, afirmou. Ela explicou que, por meio de comandos judiciais, essa alteração fraudulenta seria passível de anulação.

Ela ressaltou que a inclusão de sobrenome, que antes era feita só por decisão judicial, agora pode ser feita em cartório a qualquer tempo. “Meu sobrenome, por exemplo, é Meyer Dalmaz, mas não tenho o sobrenome da minha avó, que é Anchal. Se eu quiser incluir o sobrenome de minha avó, eu consigo, mas não poderei retirar os demais sobrenomes”, explicou. Sobre a alteração do prenome, agora é possível fazer isso diretamente em cartório assim que completar 18 anos. “Antes, a lei permitia fazer isso somente no primeiro ano após completada a maioridade. Agora é possível fazer isso a qualquer tempo e diretamente no cartório, sem necessidade de intervenção judicial e muito menos manifestação do MP (Ministério Público), como acontecia em muitos casos.”

Outra novidade atinge as pessoas que tenham se divorciado e ficado com o sobrenome do ex-cônjuge e queiram retomar o nome anterior ao matrimônio. “Já é possível fazer isso direto em cartório também.” A nova lei também tornou possível alterar o nome de recém-nascido que, porventura, foi escolhido por só um dos pais sem a concordância do outro. No prazo de 15 dias após o registro, os pais podem pedir alteração, dessa vez de comum acordo, já direto no cartório. “É algo que ocorre muito na prática. Também é um procedimento de retificação administrativa no cartório.”

ALTERAÇÕES SUBSEQUENTES

Dalmaz disse que, ao fazer a mudança, nos registros dos imóveis deverá ser feita uma averbação para constar essa alteração de nome para essa matrícula do imóvel que esteja no nome antigo. “É como se tivesse acrescido um sobrenome por conta de casamento. Os procedimentos acabam sendo os mesmos, inclusive os registradores devem alertar em letras garrafais e também verbalmente quando processam essa questão de alteração de nome de que é necessário fazer todas as alterações de documentos. Não é simplesmente alterar o nome, está tudo resolvido. Há o dever, inclusive da parte que pedir alteração, de promover todas as alterações subsequentes.”

Em relação à correção de erros de grafia cometidos pelo registrador, já era possível fazer esse ajuste ao apresentar as certidões com os nomes corretos, sem custos. “Por exemplo, quando há questões de erro com relação ao nome dos pais. Vamos supor que o nome da mãe era Susana com a letra S, mas acabou saindo no livro com a letra Z. Foi um erro do nome da mãe dele no livro dele. Com as certidões já era possível fazer esse ajuste direto em cartório. Quando o erro foi nitidamente do registrador, não tem custo para fazer esse ajuste.” Sobre a questão da diferença da grafia de sobrenome para tentar obter cidadania do país de origem da família, o abrasileiramento da grafia de um sobrenome nos primeiros registros da família aqui no Brasil ainda não está abarcado diretamente na nova lei.

Receba nossas notícias direto no seu celular. Envie também suas fotos para a seção 'A cidade fala'. Adicione o WhatsApp da FOLHA por meio do número (43) 99869-0068 ou pelo link wa.me/message/6WMTNSJARGMLL1.