Apesar de o total de mortes em janeiro de 2022 no Paraná ter diminuído 4% e os falecimentos por mortes naturais - aqueles causadas por doenças - também terem caído 9%, as mortes por causas violentas - como homicídios, acidentes de trânsito e suicídios - aumentaram 75%, o que mostra que a diminuição do isolamento contribui para a elevação desses índices.

O número de óbitos registrados no mês de janeiro deste ano ainda pode aumentar, assim como a variação da média anual e do período, uma vez que os prazos para registros chegam a prever um intervalo de até 15 dias entre o falecimento e o lançamento do registro no Portal da Transparência. Além disso, alguns estados expandiram o prazo legal para comunicação de registros em razão da situação de emergência causada pela Covid-19.

O professor Cezar Bueno de Lima, da Escola de Educação e Humanidades da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná), em Curitiba, afirmou que, em relação a mortes em acidentes de veículos, seria preciso analisar até que ponto a ausência do pagamento de pedágio pode ter aumentado o tráfego nas estradas. “Com o fim do pedágio, muita gente quis sair de casa para sair desse período de isolamento. De alguma forma esse desejo de retorno à normalidade, associado a esse retorno à liberdade de viajar, somado com a liberação temporária do pedágio, gera uma conjuntura na qual ocorrem os acidentes de veículos, porque o custo econômico do pedágio é considerável para a população paranaense.”

“Essa maior liberdade e sensação de não serem vigiados pela polícia podem ter causado um número grande de acidentes, com resultados fatais. A gente tem visto um número significativo de mortes nas estradas do Paraná durante as férias. Esse é um elemento que a gente precisava olhar com mais cuidado e com um lapso de tempo maior para dizer se essa é uma tendência estável, ou se é meramente sazonal.”

icon-aspas Tráfico de drogas produz uma série de homicídios

Já o caso de homicídios, Bueno explica que é evidente o elemento do tráfico de drogas, principalmente nas fronteiras, que produz uma série de conflitos que resultam em homicídios com uma certa estabilidade. “Talvez também pelo porte de arma maior e pela liberdade do uso da arma, isso resulte em uma maior propensão de conflitos que geram letalidade. Então é um caso para a gente estudar. São elementos novos.”

Já o aumento dos suicídios, aponta o pesquisador, é um ponto que efetivamente pode estar mais ligado ao isolamento social. “Muita gente entrou em depressão com a tendência das pessoas se isolarem cada vez mais. A gente não tem acesso ao sistema de saúde pública, mas no caso da PUC, em relação aos estudantes, a gente teve um número significativo de situações de transtorno mental, de depressão e outras doenças mentais e que foram realmente causadas e aprofundadas durante esse isolamento social.”

Em relação à crise financeira, Bueno diz que também pode ter sido um dos motivos para o aumento de registros de mortes. “Uma das tendências do suicídio é aquela em que você estava empregado e tinha uma renda estável e tinha um horizonte, mas, de repente, por conta da crise pandêmica, muita gente perdeu o emprego ou perdeu o seu próprio negócio. É bem possível que uma das causas possíveis seja isso”, expôs. Ele ressalta que a crise econômica já existia, mas foi demasiadamente expandida em razão da pandemia.

Sobre a relação do suicídio e do homicídio decorrente de relacionamentos familiares e amorosos conflituosos, o professor foi confrontado com a possibilidade de rompimentos de relacionamentos porque os casais e as famílias ficaram isolados dentro de casa e passaram a conviver mais e disso surgiram muitos atritos. “Eu diria que os homicídios nesses casos ocorreram por essa questão patriarcal. Durante a pandemia, a gente teve que reaprender a conviver e a falar com as pessoas. Em um momento de normalidade, muitas famílias estão presentes fisicamente, mas elas não se comunicam dentro de casa. Durante a pandemia, não. Você tem que permanecer dia e noite convivendo com a pessoa por um longo período. Evidentemente isso gera conflito."

Bueno ressalta que daqui para frente, à medida que a normalidade vai se impondo, a tendência é que as pessoas retornem às suas rotinas de trabalho, de estudos, e aos seus afazeres cotidianos. "Conforme isso for consolidando a propensão é de que tudo retorne aos patamares, digamos, entre aspas, aceitáveis de mortes por essas causas citadas aqui.”

Porém, algumas mudanças podem reduzir as mortes a curto prazo. “Algo que a gente pode melhorar é o combate ao feminicídio, que é uma questão cultural. É evidente que um isolamento social pode aumentar a tendência do feminicídio, mas é uma questão patriarcal e sociocultural. A gente precisa corrigir pela educação. Jamais se pode aceitar que o homem mate a sua companheira, a sua esposa. É um processo que temos que trabalhar, seja do ponto de vista da lei, seja do ponto de vista das mudanças culturais, através da educação."

"Já o suicídio, é possível que a gente tenha uma redução das taxas à medida que as pessoas começarem a vislumbrar uma perspectiva de retorno e a possibilidade de mobilidade social ascendente, de retornar a um equilíbrio das suas vidas do ponto de vista econômico e das relações pessoais”, conclui.

Acidentes de trânsito estão entre as causas de mortes violentas que aumentaram no Paraná
Acidentes de trânsito estão entre as causas de mortes violentas que aumentaram no Paraná | Foto: iStock

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