Moradores e Direitos Humanos denunciam truculência da PM ao Gaeco
Onda de protesto foi desencadeada no Jardim Califórnia após morte do Cristiano Rodrigues de Jesus
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quarta-feira, 14 de abril de 2021
Onda de protesto foi desencadeada no Jardim Califórnia após morte do Cristiano Rodrigues de Jesus
Guilherme Marconi - Grupo Folha
Representantes do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, do Movimento Negro, do Conselho Municipal de Transparência e parentes do jovem Cristiano Rodrigues de Jesus procuraram o Gaeco (Grupo Especial de Combate ao Crime Organizado), órgão ligado ao Ministério Público, na tarde desta quarta-feira (14), para denunciar suposta força excessiva de policiais militares contra moradores do Jardim Califórnia (zona leste). A denúncia foi feita após uma onda de protestos desencadeada em razão da morte do rapaz de 20 anos no último domingo (11 e também por conta de uma abordagem policial feita no dia seguinte, que acabou com moradores feridos com disparos de bala de borracha.
A morte do jovem está sendo investigada pela Policia Civil, com inquérito conduzido na Delegacia de Homicídios. A Policia Militar alega que Cristiano estava armado e foi morto após reagir a abordagem no domingo. Entretanto, os moradores do bairro têm organizado ao longo da semana protestos negando a versão policial e afirmam que o rapaz foi executado, sem chances de defesa. Cristiano de Jesus, que usava tornozeleira eletrônica, respondia em liberdade por participação em um assalto ocorrido em 2019.
Na segunda-feira, logo após o enterro de Cristiano de Jesus, a PM voltou ao bairro em abordagem filmada por alguns moradores e que circula nas redes sociais. Segundo moradores, houve bate-boca e duas pessoas foram presas. Segundo o coordenador estadual do Movimento Nacional dos Direitos Humanos, Carlos Henrique Santana, que estava no bairro, os PMs estavam sem máscara e abordaram adolescentes, exigiram que eles desbloqueassem os celulares e retirassem galhos da rua. Uma mãe e outro morador bateram boca com os policiais quando um deles reagiu com balas de borracha. "Houve uma morte neste bairro, depois uma incerta da PM e a população se inflou e ao invés deles bateram em retirada, foram para cima", relatou.
Um dos atingidos com três balas de borracha foi Fernando Alfradique Scanferla, autônomo e que faz trabalhos sociais na comunidade. Em depoimento ao delegado do Gaeco, Ricardo Jorge Pereira Filho, Scanferla mostrou os ferimentos, contou sua versão dos fatos e foi orientado a fazer exame de corpo delito no IML (Instituto Médico Legal). "Estou com medo de ser retaliado, me sinto ameaçado por essa corporação que anda armada. Meu trabalho ali foi ajudar a comunidade que quer ser ouvida. A gente se mobiliza em várias causas na cidade. Sou trabalhador, estudante universitário, não agrido ninguém. O que ocorreu com o Cristiano me chocou. Ele cometeu alguns erros no passado, estava trabalhando e eu acho todo mundo merece uma segunda oportunidade, mas ele não teve."
Segundo o representante do MNDH, só em 2019 foram 36 mortes de jovens em confrontos com Polícia Militar. "A maioria era de negros, moradores de periferia e citado como marginais. Estamos aqui para que autoridades investiguem. Estamos aqui porque acreditamos na Justiça e acredito que ela seja feita. Queremos paz, estamos falando de seres humanos. Isso tem que mudar. Essas abordagens policiais precisam ser filmadas, um promotor precisa acompanhar o inquérito" cobrou Santana.
O pai do rapaz, o motoboy Adenilson Rodrigues de Jesus, já foi ouvido pela Polícia Civil. Em entrevista à FOLHA, disse que o filho é inocente e que foi alvo de uma execução. "Foram ouvidos cinco disparos, três deles em órgãos vitais. Ele foi executado porque tiro no tórax e abdômen não é para conter reação de quem estivesse correndo. Ele foi tirado da gente de forma brutal e só depois de horas eles [policiais militares] levaram a suposta arma do crime. Peço uma perícia neste revolver que não pertence ao meu filho."
Para Robsmar da Silva, membro do Conselho Municipal da Igualdade Racial, a morte do jovem após abordagem rotineira foi fruto de uma ação com força desproporcional. "A gente entende isso como uma situação que já transgrediu a questão do racismo. Além disso, as pessoas têm o direito de protestar.A gente enxerga que essa situação precisa ser levada à Secretaria Estadual de Segurança Pública."
O delegado do Gaeco informou que a denúncia de lesão corporal ocorrida no confronto será encaminhada para apuração do Ministério Público. "Ouvimos uma testemunha, juntamos as imagens e fotografias da lesão. As providências devem ser tomadas pela Corregedoria da Polícia Militar investigar administrativamente e para Vara da Justiça Militar para apurar a questão criminal", disse Pereira Filho.
Procurado pela FOLHA, o comandante do 5º Batalhão da PM, tenente-coronel Nelson Villa, disse que os conselhos e os moradores estão no direito em buscar o Gaeco. "Nós confiamos no Ministério Público e de que as medidas apropriadas serão tomadas. A Policia Militar tem agido com toda transparência e apurações dos fatos serão feitas de acordo com o código de processo penal e no âmbito do direito disciplinar."