BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - Após dois dias seguidos com recorde de mortes e divulgação tardia dos números, o governo do presidente Jair Bolsonaro justificou a mudança na metodologia de divulgação sobre vítimas da Covid-19 que pode significar, na prática, a divulgação de números de mortes menores.

.
. | Foto: Geraldo Bubniak/AEN

Em uma nota postada por Bolsonaro nas redes sociais, o Ministério da Saúde afirma que o formato usado desde o início da pandemia não oferece uma representação do "momento do país".

Questionado sobre a mudança da metodologia na manhã deste sábado (6), durante uma visita que fez a Formosa (GO), Bolsonaro não quis responder.

O novo modelo já começou a ser usado no boletim da noite desta sexta-feira (5), quando foi divulgado que o país registrou 1.005 óbitos nas últimas 24 horas. O boletim do Ministério da Saúde não informou o total de mortes e nem o total de casos confirmados da Covid desde o início da pandemia.

A pasta também deixou de divulgar o total de casos em investigação para a doença, que até quinta-feira (4) era de 4.159. O portal do Ministério da Saúde com as informações consolidadas saiu do ar.

As mudanças acontecem depois do país registrar dois dias seguidos com recorde de mortes em um intervalo de 24 horas. Na quarta-feira, foram 1.349 óbitos.

No dia seguinte, quando o Brasil teve um novo recorde de mortes (1.473), atingindo a marca de um morto por minuto em decorrência da Covid-19.

A nota do Ministério da Saúde indica que a pasta vai passar a divulgar apenas os números de mortes e casos de infecção pelo coronavírus registrados nas últimas 24 horas, o que resultaria em números muito inferiores aos atuais.

Desde o início da pandemia, o Ministério vem divulgando com destaque os números de mortes e casos que foram confirmados para a Covid-19 nas últimas 24 horas, incluindo casos de mortes ocorridas em outras datas, mas cuja confirmação para o coronavírus tenha ocorrido no último dia.

O modelo que será abandonado também é usado na divulgação dos dados por praticamente todos os países do mundo.

O texto da nota argumenta que a divulgação dos dados de 24 horas permite acompanhar a realidade do país neste momento e definir as melhores estratégias para o atendimento da população.

"A curva de casos mostra as situações como os cenários mais críticos, as reversões de quadros e a necessidade de preparação", informou o texto, que em seguida critica o modelo anterior de divulgação dos dados.

"Ao acumular dados, além de não indicar que a maior parcela já não está com a doença, não retratam o momento do país. Outras ações estão em curso para melhorar a notificação dos casos e confirmação diagnóstica", afirma o texto da nota.

O Ministério também defendeu a divulgação dos dados tarde da noite, após as 22h. Na nota postada por Bolsonaro, a pasta argumenta que havia o risco de subnotificação quando os boletins do coronavírus eram tornados públicos às 17h (durante a gestão do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta) e às 19h (gestão de Nelson Teich).

Na primeira vez em que houve atraso na divulgação dos dados, na quarta-feira (3), o Ministério da Saúde havia informado que excepcionalmente os números seriam informados às 22h, devido a "problemas técnicos". Naquele dia, o país registrou um recorde de 1.349 mortes em 24 horas.

No dia seguinte, quando o Brasil teve um novo recorde de mortes (1.473), atingindo a marca de um morto por minuto em decorrência da Covid-19, a pasta novamente divulgou o boletim após às 22h.

O horário de divulgação, portanto, se dá após a conclusão dos principais jornais diários e também após a transmissão dos telejornais do período da noite.

Ao comentar a questão, na sexta-feira (5), o presidente não confirmou ter dado a ordem para a mudança de horário e alegou que os números sairiam mais "consolidados" às 22h. Por outro lado, comentou que "acabou matéria no Jornal Nacional", em referência ao telejornal da Rede Globo.

"Não interessa de quem partiu [a ordem para modificar o horário], é justo sair às 22h, é o dado completamente consolidado. Muito pelo contrário, não tem que correr para atender a Globo", disse.

A nota postada por Bolsonaro também afirma que está havendo adequamento de rotinas e fluxos para melhorar extrair os dados diários, o que necessitaria, afirma o texto, aguardar os relatórios vindos das secretarias de saúde dos estados e chegarem os dados.

"Para evitar subnotificação e inconsistências, o Ministério da Saúde optou pela divulgação às 22h, o que permite passar por esse processo completo. A divulgação entre 17h e 19h, ainda havia risco de subnotificação", afirma o texto.

A mudança no horário de divulgação não foi a única mudança registrada após as sucessivas trocas de ministros da Saúde. Após a saída de Luiz Henrique Mandetta, por exemplo, as entrevistas coletivas para explicar os números e apresentar as medidas de combate à pandemia deixaram de serem diárias.

O fluxo de entrevistas diminuiu ainda mais após a saída de Nelson Teich, que permaneceu menos de um mês no cargo. Teich deixou a pasta por divergência com o presidente a respeito do protocolo para a administração da cloroquina e hidroxicloroquina para pacientes que não estejam em estágio grave da Covid.

Com o atual ministro interino, o general Eduardo Pazuello, as entrevistas coletivas passaram a contar apenas com técnicos da pasta de segundo escalão, como secretários substitutos. O formato também mudou. Os presentes deixaram de responder questões sobre a previsão de pico da pandemia no Brasil.

O secretário substituto de vigilância em saúde, Eduardo Macário, também já havia criticado as perguntas sobre o atual estágio da pandemia no Brasil e criticou a imprensa por usar as expressões "recorde de mortes".